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Tártaro indica alimentação de indígenas há 4 mil anos

OESP, Vida, p. A31
03 de Jun de 2007

Tártaro indica alimentação de indígenas há 4 mil anos
Técnica desenvolvida por pesquisadora do Rio ajuda a lançar luz sobre hábitos de populações pré-históricas

Clarissa Thomé

Estudo da antropóloga Verônica Wesolowski, pesquisadora da Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz, conseguiu comprovar a base da alimentação de um grupo de índios que viveu há 4 mil anos em Santa Catarina. E ainda contradisse a teoria arqueológica tradicional, segundo a qual índios de sambaqui (monumentos pré-históricos compostos de depósitos humanos feitos com conchas no litoral Sul) eram apenas pescadores e coletores, ou seja, não plantavam.

Verônica desenvolveu técnica para dissolver o tártaro do dentes dos esqueletos. Conseguiu identificar vestígios de batata-doce e cará nos índios que viveram no sítio arqueológico Morro do Ouro, na área urbana de Joinville. "A variedade menor de alimentos está relacionada ao plantio", diz.

Havia dois cemitérios em Morro do Ouro. Um mais recente, ainda não datado, e outro de 4 mil anos. Verônica descobriu que metade dos indivíduos estudados tinha cáries. "É muito para um grupo pescador/coletor, e semelhante ao encontrado em um grupo horticultor."

Os dentes foram, então, submetidos a um processo químico para que pudessem ser revelados microvestígios de vegetais presos ao tártaro. O que resta são grânulos de amido, os sitólitos. Pela forma deles é possível se chegar aos vegetais de origem. "A dieta tem parcela bastante importante composta por peixes e moluscos. Mas a porção vegetal da alimentação, embora todos saibam que exista, é pouco investigada. Esse tipo de vestígio não se preserva nos sítios arqueológicos por causa do solo e do clima", diz ela.

Ao todo, a antropóloga estudou esqueletos de 89 indivíduos de três grupos que viveram entre 500 e 4.000 anos atrás. Nos grupos mais recentes, Verônica encontrou sitólitos de palmeiras. "Isso indica que se alimentavam do tronco, fermentado até gerar goma de amido, ou usavam os dentes para desfibrar as folhas." Também havia marantácea, planta de folhagem larga, gramíneas e amido sugestivo de pinhão.

Verônica acredita que o grupo mais antigo tenha encontrado condições favoráveis para se tornar sedentário e acabou desenvolvendo a horticultura. Os mais recentes, entre 1.000 e 500 anos, tinham de lidar com novos grupos que chegavam ao litoral.

Para chegar à técnica que permitiria a dissolução do tártaro, Verônica partiu de protocolos desenvolvidos em 1994 pelos pesquisadores Carl Reinhart, da Universidade de Nebraska, e Sheila Mendonça, da Fiocruz, que foi orientadora da tese de doutorado da antropóloga. O protocolo básico só permitia o estudo de cálculos grandes, com 1 grama. A técnica de Verônica permitiu analisar grânulos com 0,0009 grama.

OESP, 03/06/2007, Vida, p. A31

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