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Tambores de guerra

O Estado de S.Paulo-SP
04 de Nov de 2001

Cresce e recrudesce, em variados pontos do território nacional, uma onda de ações violentas organizadas por grupos indígenas que reivindicam terras ocupadas pela atividade produtiva. Apoiados por um conjunto heterogêneo de ONGs, facções políticas e universitárias, pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi), braço da CNBB, e também pela Fundação Nacional do Índio (Funai), esses grupos vêm sobressaltando pequenos, médios e grandes produtores rurais com ataques, invasões, depredações, seqüestros, incêndios e matança de animais. Se, por enquanto, o sul da Bahia, Rondônia e Mato Grosso do Sul são as áreas que mais evidenciam tais manifestações, pode-se, em virtude dos fundamentos que as motivam, esperar o seu rápido alastramento. Mato Grosso do Sul é o atual campeão dos conflitos rurais, com 54 casos registrados pelo Cimi e confirmados pelo presidente da Funai. Em todos eles, está em jogo, nada mais nada menos, a interpretação de uma palavra, um advérbio, em torno do qual fervilham debates, erguem-se teses e acirram-se os ânimos. O advérbio está no parágrafo 11 do artigo 20 da Constituição Federal, declarando que são bens da União "as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios". Está, também, no parágrafo 1.o (São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, etc.) e no parágrafo 2.o (As terras tradicionalmente ocupadas pelos índios destinam-se a sua posse permanente) do artigo 231. O sentido jurídico da palavra em foco é concreto. Tradicionalmente quer dizer de modo contínuo e permanente. Porém, os antropólogos e indigenistas, a Cimi e a Funai, apóiam-se no conceito da tradição oral, baseando-se naquilo que os índios afirmam, alegando que essa é a maneira que eles têm de registrar seu passado. A Funai, quando quer fazer reverter terras particulares para a sua administração e domínio da União, tem usado como argumento o fato de que as áreas reclamadas foram, ainda que em passado longínquo, habitadas por silvícolas. Sem dúvida, todas as terras do Brasil foram habitadas por silvícolas antes da descoberta e da conquista portuguesa que, a partir de Porto Seguro, se estendeu do Oiapoque ao Chuí, no sentido norte-sul, e do litoral aos contrafortes dos Andes, no sentido leste-oeste. Esses foram os alicerces territoriais sobre os quais se construiu a nação brasileira - e, depois da independência, a sua ordenação jurídica que resultou no Estado Nacional Brasileiro - que o Cimi, as ONGs e seus seguidores consideram produto do esbulho das tribos de índios que aqui já estavam quando Cabral avistou o Monte Pascoal. Para essas entidades, quaisquer sinais de passagem ou de presença indígena encontrados ou apenas referenciados provam e justificam a posse imemorial e, conseqüentemente, incontestável, desse ou daquele grupo indígena sobre o lugar. Sempre se haverá de encontrar sinais da presença indígena em qualquer parte do Brasil. A cidade de São Paulo, por se chamar Piratininga, o Rio Tietê, por se chamar Anhembi, Porto Seguro, porque Pero Vaz de Caminha menciona índios em sua carta, e todos os quintais, praias, montes e vales, em que for descoberta uma ponta de flecha ou um sambaqui, estarão sujeitos, caso prevaleça a lógica atual da Funai, a se tornarem alvos de ações de reintegração de posse em favor de silvícolas aculturados. Também passarão a ser consideradas "uma forma de pressão válida" atrocidades como as ocorridas na Fazenda Brasília do Sul, perto de Dourado (MS), relatadas em reportagem que este jornal publicou na última quinta-feira de outubro. Um paraguaio casado com brasileira proclamou-se cacique de um grupo caiová-guarani e, com seus filhos e outros sequazes, invadiu a fazenda, ocupando-a por dois anos e meio, incendiou pastos e matas, matou 120 animais, expulsou empregados, depredou a sede e 23 casas de funcionários, torturou o gerente e declarou-se vítima de violência policial ao ser retirado por ordem judicial. O chefe da Funai em Dourados negou essa realidade brutal, amplamente documentada: "Não considero que os índios foram violentos; apenas fizeram uma cena muito grande", declarou impávido. O incitamento dos guaranis e terenas - numa região que tem 700 km de fronteira seca com o Paraguai - à reconquista de 81 aldeias ou "tekohás" mapeadas pela "tradição oral" e à expulsão de fazendeiros e colonos que, embora solidamente titulados, os índios consideram "seus contrários", mostra que essa "cena" pode ser seguida de outras "cenas" - de sangue.

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