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Suspensa parte de demarcação de reserva (PA)

O Liberal-Belém-PA
26 de Set de 2003

O juiz federal Nelson Loureiro dos Santos, da Subseção de Santarém, deferiu nesta quinta-feira, 25, medida liminar que determina a suspensão dos trabalhos demarcatórios que estão sendo feitos na parte oeste da Reserva Indígena Baú, habitada por índios kayapós e situada no município de Novo Progresso. A decisão judicial garante, todavia, o prosseguimento normal dos trabalhos de demarcação em outras laterais da terra indígena. A liminar foi deferida em ação civil pública proposta contra a União Federal pelo município de Novo Progresso e pelos sindicatos dos Produtores Rurais e dos Trabalhadores Rurais desse município.

Segundo os autores, o processo demarcatório da área indígena Baú remonta a 1991, com a edição da Portaria 645 do Ministério da Justiça, que declarou a ocupação tradicional da área de 1,85 milhão de hectares pelos índios kayapós. Mencionam que, para adaptar os procedimentos de demarcação ao contido no Decreto no 1.775, de 1996, o processo demarcatório foi paralisado nesse mesmo ano. Em 1998, uma portaria declarou de posse permanente dos índios a área Baú, que teve seus limites especificados para o processo demarcatório.

O município de Novo Progresso e os dois sindicatos argumentam que o problema central reside no limite oeste da referida área, na fronteira à margem esquerda do rio Curuá, uma vez que o ato demarcatório afeta diretamente cerca de 3.500 famílias que lá habitam e produzem alimentos. Além disso, os limites atingem diretamente área do município, afetando a economia local. Em decorrência disso, segundo os autores da ação, o clima de tensão impera no município, a tal ponto que é iminente um conflito envolvendo a comunidade indígena e habitantes da região.

Após colher a manifestação da União e do Ministério Público, o juiz federal Nelson Loureiro dos Santos ressalta que esse caso é daqueles nos quais a ocorrência de diversos fatores acabam por levar questões políticas para o âmbito do Poder Judiciário. O magistrado observa que, conforme os fundamentos expostos pelos autores da ação civil pública e pelos documentos anexados à petição inicial, "pequena dose de boa vontade e lucidez política do poder público envolvido poderiam evitar o desgaste e confronto das populações ameaçadas."

O magistrado se disse convencido de que a liminar que determina a suspensão dos trabalhos demarcatórios numa parte da reserva Baú é necessária para evitar o chamado periculum in mora, ou seja, o perigo na demora em esperar o pronunciamento final da Justiça. Simples consulta ao conteúdo de diversas reportagens jornalísticas juntadas aos autos bem demonstra, segundo o magistrado, a situação de beligerância na área. "Ademais, a própria rodovia federal que interliga o município de Novo Progresso ao restante do Brasil tem o fluxo interrompido por populares, justamente em razão dos distúrbios sociais instaurados na região", ressalta Nelson dos Santos. Ele se refere ainda a informações remetidas ao Ministério Público Federal pelo juiz estadual e pela promotora de justiça da comarca de Novo Progresso, relatando a "calamitosa situação de insegurança pública verificada."

Quanto ao chamado fumus boni juris (a fumaça do bom direito), outro requisito para a concessão da liminar, o magistrado enfatiza não haver dúvida de que as terras tradicionalmente ocupadas pelas comunidades indígenas devem ser mantidas e protegidas, sendo inalienáveis e indisponíveis e os direitos sobre elas imprescritíveis, segundo termos da Constituição Federal. "Agora, para garantir esse direito ao povo indígena não se pode, em absoluto, de modo aleatório e sem garantia de total segurança nos procedimentos administrativos encetados, violar outros direitos em jogo", afirma o juiz, especialmente quando esses direitos também são constitucionalmente protegidos.

O magistrado acrescenta que laudo que embasou a decisão administrativa de demarcar a reserva indígena "não possui precisão objetiva, especialmente em razão da enorme proporção da área tratada", o que permite concluir-se que a área tradicionalmente ocupada pelos índios kayapós "pode ou não abranger as terras situadas na margem esquerda do rio Curuá, no momento ocupadas e exploradas por centenas de famílias de produtores rurais assentadas na área pelo próprio Governo Federal". Com isso, finalizou Nelson Loureiro dos Santos, "de fato não podem prosseguir os trabalhos demarcatórios da Reserva Indígena Baú, no lado oeste, enquanto não se procederem a novos levantamentos antropológicos de modo objetivo, observadas as formalidades legais aplicáveis."

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