OESP, Vida, p. A16
25 de Out de 2005
Superdesmatador do Pará é solto
Desembargadores suspendem prisão preventiva de José Dias Pereira, que derrubou 2 milhões de árvores em dois anos
Carlos Mendes
Colaborou: Cristina Amorim
Acusado de derrubar 2 milhões de árvores na Terra do Meio, sudoeste do Pará, o fazendeiro José Dias Pereira foi solto por decisão unânime dos desembargadores da 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), em Brasília, na semana passada. Eles entendem que não há comprovação de que ele desmatou terras da União e, portanto, a Justiça Federal é incompetente para processá-lo.
O desembargador federal Cândido Ribeiro, relator do pedido de habeas-corpus impetrado por advogados do fazendeiro, conseguiu convencer seus colegas de que Pereira deveria ser solto por não haver provas.
Eles acreditam que a apresentação de mapas baseados em imagens de satélite guarda dúvidas técnicas e, portanto, não são suficientes para provar que o acusado desmatou 1.900 hectares da Estação Ecológica Terra do Meio, unidade de conservação federal lançada pela ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, em fevereiro, logo depois do assassinato da missionária americana Dorothy Stang, em Anapu (PA).
Os desembargadores decidiram, assim, que as terras são do governo do Pará e, com isso, o caso passa para a Justiça Estadual.
Pereira, conhecido por Zezinho, ficou 52 dias na penitenciária de Cucurunã, em Santarém, por ordem do juiz federal substituto Fabiano Verli - que manteve a prisão preventiva num segundo momento por entender que, uma vez livre, o fazendeiro poderia voltar a desmatar. Seu filho, Joel, também foi citado no processo, mas respondia em liberdade.
Com a mudança do foro, a ação penal contra o fazendeiro terá de ser realocada para a Vara Agrária de Altamira. O processo, então, recomeça do zero e tudo terá de ser refeito. Ainda cabe recurso, mas isso só poderá ser feito pelo procurador regional da República que atua em Brasília.
"PERIGOSO PRECEDENTE"
O procurador da República em Santarém, Renato Rezende Gomes, que pediu a prisão preventiva, criticou a decisão do TRF-1, dizendo que a Justiça Federal de primeira instância fez sua parte no caso, determinando a detenção do fazendeiro.
Para ele, o tribunal foi "desigual" e não deu valor ao crime. "Se fosse um homicídio ou um estupro, ele não teria sido posto em liberdade, mas, como se trata de crime ambiental e não se tem uma cultura (no Brasil) de que é um crime lesivo, o fazendeiro foi solto", afirmou Gomes. Mesmo que aceitasse a tese de que a competência não é da Justiça Federal, como decidiu o tribunal, o procurador não concorda com a soltura. "Este cidadão deveria continuar na cadeia até que a Justiça Estadual se manifestasse sobre o caso."
Tanto a Procuradoria-Geral da República quanto o Ibama desejavam transformar o caso de Zezinho em um exemplo na luta contra o desmatamento na Amazônia. Nunca, na história da legislação ambiental, um desmatador foi preso: normalmente, a pena varia em serviços à comunidade ou multa, nem sempre paga para a União.
O procurador teme que a decisão abra um "perigoso precedente" para outros crimes ambientais que envolvem grandes desmatamentos e queimadas.
Nos últimos três meses, os fiscais do Ibama aplicaram mais de 90 autos de infração, chegando a R$ 100 milhões em multa, na região da Terra do Meio e em Cumaru do Norte, no sul do Pará.
Pereira desmatou 9 mil hectares de floresta amazônica
HISTÓRICO:
No dia 31 de agosto, agentes da Polícia Federal, cumprindo decreto de prisão preventiva assinado pelo juiz Fabiano Verli, prenderam o fazendeiro José Dias Pereira, o Zezinho, em Ourilândia do Norte (PA), onde mora.
Pereira é processado por crimes contra o ambiente. Seus homens foram flagrados por fiscais do Ibama, no dia 25 de julho, durante sobrevôo de helicóptero na fazenda JD e LA, em Altamira. O solo foi limpo com queimada após a derrubada de 6.852 hectares de floresta. A ordem do fazendeiro era plantar capim para o gado. O Ibama aplicou multa de R$ 10 milhões.
Não foi a primeira vez que o acusado praticou o crime. Em 2004, Zezinho já havia sido multado em R$ 3 milhões por derrubar 2.053 hectares de mata nativa.
OESP, 25/10/2005, Vida, p. A16
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