VOLTAR

Soja não é ameaça para a floresta amazônica

Estado de S. Paulo-SP
Autor: HERTON ESCOBAR
31 de Mar de 2002

Apenas áreas de cerrado e terrenos já desmatados compensam altos custos da cultura

A soja é freqüentemente apontada como a grande vilã do avanço da fronteira agrícola na Amazônia. A cultura, que é um dos principais produtos de exportação do País, entretanto, é injustiçada pelo radicalismo ambiental, dizem especialistas. "A soja, por si só, não é uma ameaça à floresta, não vai desmatar a Amazônia", garante o engenheiro agrônomo Fabiano Guimarães Costa, que concluiu tese de mestrado sobre o assunto na Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq-USP). A razão é simples: a soja, leguminosa de origem chinesa, é tão adaptável à floresta tropical quanto um panda às savanas africanas.
Um dos maiores erros é pensar na Amazônia apenas como uma grande floresta, diz o também engenheiro agrônomo Vicente Godinho, da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) em Rondônia. Primeiro, é preciso diferenciar a floresta da chamada Amazônia Legal, uma região gigantesca, composta por oito Estados mais metade do Maranhão e que abrange uma enorme variedade de ecossistemas. Do total de 514 milhões de hectares, 87 milhões (17%) são de cerrado e 35 milhões (7%) de campos, segundo números da Embrapa. O resto, sim, é floresta. "A agricultura hoje só ataca regiões de cerrado na Amazônia", diz Godinho. "Fora do cerrado, a agricultura dificilmente ocuparia mais de 10% de área. Isso sendo otimista."
"Não precisamos abrir mais nem um hectare na Amazônia para a agricultura", afirma o diretor-executivo da Embrapa, José Roberto Rodrigues Peres. "Abrir a floresta para plantar soja seria uma catástrofe. Tanto para o meio ambiente quanto para o produtor", diz Peres.
Desmatar uma floresta do porte da amazônica para a agricultura é extremamente caro e o solo, mesmo depois de limpo, é pobre e difícil de fertilizar. "É um solo muito arenoso, que não segura os nutrientes por muito tempo", explica o engenheiro Costa. Além disso, o clima úmido e chuvoso favorece o crescimento de fungos, tornando praticamente inviável a produção.
Não há semente que agüente. "Não existe tecnologia para a soja na Amazônia", resume Costa.
Mato Grosso, o Estado com maior produtividade de soja no mundo, tem 40 milhões de hectares de cerrado, mas apenas 2,7 milhões de hectares de soja, segundo o pesquisador Godinho. "Cabem dois Estados Unidos de soja ali dentro", compara. Em 2001, havia 3,2 milhões de hectares de soja plantada na Amazônia Legal, segundo dados da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). É apenas 10% de toda a área com potencial para a atividade na região (30 milhões de hectares), de acordo com o estudo de Costa.
Alternativas - A idéia, portanto, é expandir a fronteira agrícola fora da floresta, aproveitando-se áreas previamente desmatadas por outras atividades. Só em Rondônia, há 1 milhão de hectares de terras abandonadas pelas indústrias do café e cacau que serviriam para a cultura de soja, segundo o diretor do complexo de soja da Cargill, José Luiz Glaser. "Santarém, no Pará, tem 300 mil hectares de terra igual à de Mato Grosso, aberta pelo ciclo da borracha há 70 anos. Tem muita coisa que pode ser feita para essas áreas já abertas, sem invadir a floresta", completa Glaser.
Para Costa, a soja ameaça a Amazônia apenas de maneira indireta, pela ocupação de áreas de pasto. "A pecuária avança e a soja vai atrás, empurrando o gado para cima da floresta", diz. Godinho lembra, entretanto, que o grão só vai substituir o boi onde as condições climáticas permitirem.
E o custo para reverter uma pastagem para a agricultura ainda é extremamente alto. "O custo de mecanização na floresta é um décimo do no cerrado", compara. "No Paraná você tira pastagem e bota soja no dia seguinte, mas aqui não." Só para arrancar as raízes do solo são necessários maquinário pesado e meses de trabalho. Com a floresta em pé, compara Godinho, o custo para abrir uma área de plantio é de 60 a 70 sacas por hectare, ante 14 a 15 sacas por hectare no cerrado.
"A floresta amazônica não tende a ser desmatada pela soja porque o custo é muito alto e a rentabilidade da soja não paga esse investimento", resume Costa. O melhor caminho, diz, é seguir o rumo do Zoneamento Ecológico Econômico, que determina a melhor atividade para cada tipo de solo e região.
"A Amazônia Legal é 50% do território brasileiro. Cabe tudo lá dentro."

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.