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Seminário aborda acesso a serviços pelos indígenas

Agência Câmara-Brasília-DF
Autor: Mauren Rojahn; Edição - Maristela Sant'Ana
17 de Set de 2003

A garantia de acesso das populações indígenas aos serviços básicos de saúde, educação e saneamento foi defendida pelo presidente da Comissão da Amazônia, deputado Átila Lins (PPS-AM). Ele coordenou o seminário "Ações Governamentais para os Povos Indígenas da Amazônia", realizado hoje na Câmara e que terá continuidade amanhã. Para o parlamentar, é necessário repensar as políticas públicas voltadas para as comunidades indígenas e encontrar soluções efetivas capazes de incentivar a vocação natural e de reverter o quadro de miséria em que se encontram muitas etnias na Amazônia. O presidente da Comissão acrescentou que é preciso criar incentivos à produção, à manutenção dos costumes, da língua e da identidade das diversas etnias, procurando alternativas de desenvolvimento econômico e social sustentado que possam garantir o futuro delas.

Independência econômica

A presidente da Subcomissão Permanente de Assuntos Indígenas, deputada Perpétua Almeida (PCdoB-AC), destacou que é preciso garantir a independência econômica dos povos indígenas, com base no desenvolvimento sustentável, e promover a harmonia entre as diversas etnias que coabitam na Amazônia inclusive com os que não são índios.

O presidente da Funai, Mércio Pereira Gomes, informou que está havendo um crescimento demográfico das populações indígenas do País, causando surpresa aos especialistas. De acordo com Mércio Gomes, nos anos de 1950 e 1960, a população indígena no País era de 120 mil habitantes e hoje atinge 400 mil.

Prioridades

O presidente da Funai defendeu que a política indígena do Governo esteja pautada em cinco pontos: saúde, com controle das doenças e melhoria nos serviços; educação, com a garantia do ensino tanto da língua portuguesa quanto da linguagem nativa; criação de mecanismos para que os povos indígenas possam produzir em escala industrial, com ênfase no desenvolvimento sustentável; defesa das demarcações das terras indígenas; e ampliação da participação política, social e cultural dos povos indígenas, para acabar com os preconceitos e se criar uma harmonia nacional.

Educação

O coordenador-geral de Apoio às Escolas Indígenas do Ministério da Educação, Kleber Jesteira, disse que atualmente as escolas para índios não têm a preocupação de preservar a cultura de suas nações. De acordo com o coordenador, o ensino da língua portuguesa tem sido prioritário, o que prejudica a preservação natural da língua nativa. Jesteira afirmou que o MEC está desenvolvendo um plano de ações para fortalecer o ensino médio entre os índios. Nesse plano, serão traçados programas para elevar o nível de escolaridade dos indígenas. "O MEC mantém um diálogo franco com todas as organizações para que seja possível a implementação dos programas educacionais".

Na avaliação do índio Carlos Francisco Brandão, coordenador da União das Nações Indígenas do Acre e do sul do Amazonas, os recursos orçamentários para políticas indígenas são muito escassos principalmente para educação e saúde. Segundo informou, existem vários índios que já concluíram o ensino médio, desejam ingressar na faculdade, mas não conseguem acesso ao ensino superior. Ele pediu apoio das autoridades para que os indígenas possam ter esse direito e criticou o fato de o estatuto do índio não ter sido aprovado ainda pelo Congresso Nacional.

Defesa nacional

O diretor do Departamento de Políticas Estratégicas do Ministério da Defesa, vice-almirante Murillo de Moraes Rego Correa Barbosa, afirmou que os programas para os povos indígenas no âmbito do Ministério fazem parte da política de defesa nacional. Ele informou que as Forças Armadas desenvolvem várias atividades "subsidiárias" que beneficiam direta e indiretamente as nações indígenas. Entre essas atividades, ele citou os serviços de busca e salvamento, principalmente nas áreas de fronteira; o transportes aéreo de doentes; o atendimento médico de indígenas que procuram hospitais militares; a atuação dos navios-hospitais da Marinha junto à população ribeirinha da Amazônia; os trabalhos de engenharia cartográfica no apoio às demarcações de terras indígenas; a construção de infra-estrutura básica e viária feita pelos batalhões de construção do Exército; e a distribuição de alimentos.

O vice-almirante lembrou que 70% dos índios estão localizados na Amazônia e no Centro-Oeste e que as comunidades localizadas na faixa até 150 quilômetros da fronteira merecem atenção especial do Ministério da Defesa.

Cacique critica Cimi

O cacique José Índio, da tribo Pankararu, de Pernambuco, criticou o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), que no ano 2000 promoveu a campanha "Terra Sem Males". "Eles tinham o argumento de arrecadar recursos para os povos indígenas, mas, no entanto, não repassaram nada para as nações indígenas". O cacique criticou também o Ministério Público, que, segundo ele, vem perseguindo lideranças indígenas em Pernambuco. "O Ministério Público deveria investigar para onde foram os recursos arrecadados pela campanha da CNBB. No entanto, se disse inapto para promover a investigação e vem ameaçando nossas lideranças", afirmou.

Fortalecimento da Funai

O assessor jurídico do Conselho Indigenista Missinário (Cimi), Paulo Machado, criticou o esvaziamento da Funai que, segundo ele, ocorreu no Governo Collor. Em sua avaliação, o modelo atual - em que vários ministérios são responsáveis por demandas de acordo com seu foco de atenção - não está dando certo. Ele defende a criação de um órgão único, com a participação de entidades de defesa dos índios para tratar de ações específicas para cada etnia, e não por região geográfica.

A defesa da centralização da área também foi feita por Márcio Santilli, coordenador do Instituto Sócio Ambiental (ISA). Para ele, se por um lado esse modelo descentralizado atende às demandas dos índios, por outro cria certa confusão entre eles, que não se dirigem a um órgão só. Sua opinião é que devem ser criados também programas regionais que reúnam todas as iniciativas dos ministérios.

O coordenador da Frente Parlamentar de Defesa dos Povos Indígenas, o deputado Eduardo Valverde (PT-RO), defendeu que os ministérios mantenham suas funções específicas, promovendo a articulação de suas políticas. Em sua opinião, o maior desafio da Frente se dará na discussão do Orçamento, oportunidade em que os parlamentares deverão lutar pela ampliação dos recursos para programas voltados aos povos indígenas.

Demarcações pendentes

O diretor administrativo do Instituto Warâ, Escrawen Sompre, criticou os recursos orçamentários previstos no Orçamento 2004 para a proteção e demarcação do território indígena. Em sua avaliação, os números apresentados pelo secretário-executivo do Instituto de Estudos Sócio Econômicos (INESC), Ricardo Verdum, mostram que as demarcações de terras indígenas não serão concluídas no Governo do Lula. Verdum aconselhou as entidades representativas dos povos indígenas a participarem das revisões anuais do Orçamento.

Para Sompre, no que diz respeito ao meio ambiente, o Governo só tem criado unidades de conservação sem qualquer compensação aos povos indígenas. Segundo ele, tais unidades impedem que os índios tirem proveito da terra. "Estão tomando nossas terras de forma legal", afirmou. Ele defende como política ideal a adoção de tratamento diferenciado para os 120 povos existentes no País em contraposição ao tratamento homogêneo existente hoje, que desconsidera as diferenças étnicas.

Quanto à centralização das ações governamentais voltadas para os povos indígenas - proposta apresentada por outros participantes do Seminário -, apesar de defender o fortalecimento da Funai, Sompre acredita que acarretaria resistência por parte dos ministérios quanto ao repasse de verbas.

O índio Jonilson Raposo Batista - secretário-executivo do CIMI/RR - reclamou da não-conclusão das demarcações, da escassez de recursos para saúde e para produção agrícola.

Projetos

Durante os debates, a representante da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB), Léa Vale, apelou às lideranças partidárias para que trabalhem com vistas a dar celeridade aos projetos de lei que tratam das questões indígenas. Ela também solicitou às autoridades que sejam mais sensíveis aos problemas dos povos indígenas. A representante da Ong defendeu ainda ações imediatas para a conclusão das demarcações e ressaltou que hoje muitos líderes indígenas estão morrendo em conflitos com posseiros.

A representante indígena do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher, Dirce Kaiua, afirmou que o presidente Lula, durante sua campanha, visitou varias aldeias indígenas, razão pela qual, acredita, ele conhece bem os problemas indígenas e sabe como deve ser elaborada a política ideal para esses povos.

Amanhã

O Seminário terá continuidade amanhã a partir das 9 horas. O tema do painel da manhã será "Proposições Legislativas referentes aos povos indígenas em tramitação na Câmara" e terá como expositores técnicos da Consultoria Legislativa da Casa. A parte da tarde será dedicada a debates e à elaboração de propostas, além da apresentação de documento síntese dos trabalhos.

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