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Sebastião Salgado defende mobilização nacional pela ampliação do Parque do Xingu

Terra-São Paulo-SP
29 de Ago de 2005

O fotógrafo brasileiro Sebastião Salgado foi presença ilustre no Kuarup
que aconteceu esta semana na aldeia Ipatse, dos Kuikuro, no Alto Xingu.
Mundialmente conhecido por imagens que divulgam lutas sociais e
denunciam mazelas nos países em desenvolvimento, Salgado defende a
criação de um movimento nacional em defesa do parque. Ele considera o
Xingu uma referência cultural para o Brasil e a humanidade. "Eu espero
que haja uma ação nacional contra essa corrida ao lucro, essa ganância
do mundo da soja. É preciso tomar cuidado para não destruir essa
referencia nacional", diz.

O fotógrafo conta que está no Xingu colhendo imagens para seu novo
projeto, intitulado Gênesis. "Estou procurando referências do início da
humanidade, culturas que representem o início do gênero humano como um
todo. Com muito prazer, é o que acabei de encontrar aqui no alto Xingu",
disse ele, em entrevista exclusiva à Agência Brasil .

O Gênesis foi lançado em 2003, tem duração prevista de oito anos e conta
com apoio da Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a
Ciência e a Cultura). No Alto Xingu há 40 dias, Salgado documenta não só
o Kuarup, mas vários outros rituais dos xinguanos. Antes, o fotógrafo
conta que esteve nas ilhas Galápagos, no oceano Pacífico, e também na
Antártida. Do Xingu, irá para a Namíbia, na África, onde fotografará
povos do deserto, como os Bushmen. Depois, passará pela Etiópia e o Sudão.

Economista, Salgado iniciou a carreira na Organização Internacional do
Café, nos anos 70, na Europa. A partir desse trabalho, visitou países
africanos e asiáticos em missões ligadas ao Banco Mundial e, ali, passou
a fotografar o mundo em desenvolvimento. Hoje, é embaixador especial da
Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância) e membro honorário da
Academia de Artes dos Estados Unidos. Leia a seguir os principais
trechos da entrevista.

Agência Brasil - Qual é a importância do Xingu para o Brasil?

Sebastião Salgado - O Xingu, principalmente para as pessoas da minha
geração, que estão hoje no comando do país, em função da idade, foi
muito importante. Quando éramos jovens, os primeiros contatos feitos
aqui, na época do Getulio Vargas, as primeiras apresentações do Kuarup,
tudo isso teve um simbolismo muito grande.

Aos poucos, isso aqui passou a ser uma referência nacional da tradição
indígena, e hoje é essencial a preservação desses rituais e das culturas
aqui do Alto Xingu. Tudo isso está muito ameaçado. A fronteira do parque
hoje termina dentro de uma quantidade imensa de fazendas de soja. Hoje,
as fontes do rio Culuene, que na realidade é a base do rio Xingu, estão
ameaçadas pela construção de barragens. Uma barragem já começou e houve
uma liminar, graças à ação dos indígenas aqui do Alto Xingu. A
construção foi paralisada temporariamente.

Eu espero que haja uma ação nacional contra essa corrida ao lucro, essa
ganância do mundo da soja. É preciso tomar cuidado para não destruir
essa referência nacional. Há muito risco. É uma cultura aquática, eles
não comem outra carne senão a do peixe, então eles dependem das águas
dos rios, e tudo isso está realmente ameaçado.

A minha proposta seria a de se começar uma luta nacional para
transformar toda essa região, incluindo todas as fontes do rio Xingu, em
parte da extensão do parque. O governo poderia fazer uma indenização
dessas fazendas de soja e replantar as matas na região.

ABr - Como o mundo enxerga hoje o Xingu?

Salgado - A história das tribos do Xingu é muito anterior à história do
Brasil moderno. Existem escavações aqui na região em que se encontraram
aldeias antiqüíssimas, com populações imensas, com uma verdadeira
cultura. Isso deveria ser divulgado no Brasil, para a gente ter a honra
de ter as nossas origens a partir um pouco dessa região. É uma região
importante e poderosa dentro da cultura brasileira. Não pode só haver
lucro e ganância, a cultura tem que ser preservada.

ABr - Qual o sr. pensa que deveria ser a atitude da população amazônica
em relação a esse tipo de ameaça?

Salgado - A população realmente amazônica tem que ficar atenta à
destruição da região. A região amazônica é forte, é potente, em função
das águas, pela floresta que tem, pelas reservas indígenas. Essa
penetração na região para a retirada da madeira, para o lucro rápido,
não serve à população real da Amazônia, serve apenas às empresas que
estão à cata do lucro. A ganância não serve à população real da região.

A verdadeira população da Amazônia tinha que lutar pela preservação,
porque essas é que são suas riquezas reais. Se essas riquezas se forem,
isso aqui passará a ser uma região devastada e pobre. Temos a maior
reserva de água doce do planeta, a maior reserva de floresta tropical:
essa possivelmente deve ser a maior riqueza do Brasil hoje.

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