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Sabesp e PCJ querem captação 12,6% maior que entrada de água em 10 anos

OESP, Metrópole, p. A10
13 de Jul de 2015

Sabesp e PCJ querem captação 12,6% maior que entrada de água em 10 anos
Relatório mostra que sistema recebeu 36,4 mil litros por segundo entre 2004 e 2014, 18,7% a menos que a média entre 1930 e 2003

Fabio Leite - O Estado de S. Paulo

SÃO PAULO - Mesmo diante da pior seca da história do Sistema Cantareira, a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) e as cidades da região de Campinas, no interior paulista, querem captar nos próximos dez anos até 12,6% mais água do que entrou no manancial na última década, que foi marcada por duas estiagens e uma cheia.
Dados atualizados pela Agência Nacional de Águas (ANA) e pelo Departamento de Águas e Energia Elétrica de São Paulo (DAEE), órgãos reguladores do sistema, mostram que, entre 2004 e 2014, o Cantareira recebeu, em média, apenas 36,4 mil litros por segundo de água, volume 18,7% menor do que o registrado na série histórica de 1930 a 2003: 44,8 mil l/s.
A queda foi sensivelmente agravada pela seca de 2014, a mais severa em 84 anos. Mas os dados apontam que a estiagem predominou nos rios que alimentam o Cantareira na última década, apesar das enchentes que ocorreram em 2010, como em Franco da Rocha, após a Sabesp abrir as comportas da barragem Paiva Castro para evitar transbordamento.
As informações atualizadas com as vazões dos rios observadas na crise servem de referência para a discussão da renovação da outorga do Cantareira, que deveria ocorrido em 2014, mas foi adiada para outubro deste ano por causa da estiagem. A outorga vigente foi assinada em 2004, com prazo de dez anos. As propostas oficiais para a exploração do manancial devem ser apresentadas no mês que vem.
Apesar do cenário crítico, a Sabesp já anunciou que pretende manter a retirada máxima de 33 mil litros por segundo, concedida na regra de 2004, enquanto que o Comitê das Bacias dos Rios Piracicaba, Capivari, Jundiaí (PCJ), que representa as cidades da região de Campinas, quer ampliá-la dos atuais 5 mil l/s para 8 mil l/s. O motivo alegado é o crescimento da demanda por água na região, estimado em 22% entre 2008 e 2018.
A diferença entre os 41 mil l/s do volume pleiteado pelos dois lados e os 36,4 mil l/s de água que entraram no sistema nos últimos dez anos equivale a praticamente toda a produção prevista para o futuro Sistema São Lourenço (4,7 mil l/s), que está em construção na região de Ibiúna por meio de uma Parceria Público-Privada (PPP) feita pela Sabesp e deve ser concluído em outubro de 2017. O volume é suficiente para atender cerca de 1,5 milhão de pessoas.
O balanço mostra que a quantidade média de água que chegou às represas nos últimos dez anos já seria insuficiente para atender até a captação máxima prevista em 2004, de 38 mil l/s. Mesmo se a retirada média na última década for mantida - 30,2 mil l/s para a Grande São Paulo e 4 mil l/s para o PCJ -, haveria água garantida apenas para atender a demanda durante 50% do tempo, segundo o relatório da ANA e DAEE.
Impasse. O déficit entre a oferta de água disponível no Cantareira e a demanda pretendida pelas duas regiões é o principal entrave para a renovação da outorga, que deverá ter novas regras de operação, uma vez que as normas de 2004 não evitaram o colapso do sistema. O presidente da ANA, Vicente Andreu, disse que a complexidade da negociação pode adiar a renovação novamente, para o ano que vem, desejo predominante dentro da Sabesp e do governo Geraldo Alckmin (PSDB).
Entre 2004 e 2014, o volume de água que chega às barragens pelos rios só cresceu em uma das quatro represas que formam o Cantareira, na comparação com a média histórica do período anterior, de 1930 a 2003. Foi no reservatório Paiva Castro, o menor do sistema (menos de 1% da capacidade total), que fica entre as cidades de Franco da Rocha e Mairiporã, na Grande São Paulo. O acréscimo foi de 11%.
Fontes do setor atribuem a alta ao fenômeno conhecido como ilhas de calor, que provoca tempestades nas regiões densamente urbanizadas, como as que aconteceram na cidade de São Paulo nos últimos verões, refletindo no aumento da capacidade de armazenamento das represas Guarapiranga, na zona sul paulistana, e Billings, na região do ABC.
Já nos reservatórios Jaguari-Jacareí, que ficam na região de Bragança Paulista e representam 82% do sistema, a vazão afluente caiu 17,2% no período. Na represa Atibainha, em Nazaré Paulista, a queda foi de 21,3%, e no reservatório Cachoeirinha, em Piracaia, 35,6%. Em todas, a seca considerada anormal acontece desde 2012. Segundo a Fundação SOS Mata Atlântica, a região sofre com o desmatamento e tem só 21,5% da cobertura vegetal nativa.

Para manter retirada de água, Sabesp tenta mudar regra

Fabio Leite - O Estado de S. Paulo

A Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) afirma que é possível manter a retirada máxima de água do Sistema Cantareira em 33 mil litros por segundo para atender a região metropolitana sem colocar o manancial em risco. Para isso, a estatal defende a mudança nas regras de operação dos reservatórios.
Em documento enviado em maio ao Departamento de Águas e Energia Elétrica de São Paulo (DAEE), para a renovação da outorga do Cantareira, a Sabesp sugere um modelo de operação que "antecipa reduções gradativas de retirada de água com base em um indicador do estado do sistema". Ou seja, se a entrada de água nas represas cai, a retirada para o abastecimento da capital e do interior também é reduzida.
Segundo a Sabesp, se a regra tivesse sido aplicada a partir de 2012, quando a entrada de água no Cantareira começou a ficar abaixo da média histórica, não teria sido necessário retirar água do volume morto, que passou a ser explorado em maio de 2014.
Na prática, porém, as reduções na captação só começaram a ser feitas em março do ano passado, quando o manancial já havia atingido nível crítico: 16%.

Ciclos climáticos explicam seca, dizem especialistas
Para professores da USP e Unicamp, estiagem na região do Cantareira era previsível e deve durar ao menos mais dez anos

Fabio Leite - O Estado de S. Paulo

SÃO PAULO - Duas diferentes teorias sobre fenômenos climáticos longos e cíclicos têm sido usadas por pesquisadores para explicar a queda significativa no volume de água que entrou no Sistema Cantareira na última década. Tanto a tese que considera a temperatura do Oceano Pacífico quanto a dos ciclos solares concluem que a região do manancial atravessa um período de estiagem previsível, que deve durar ao menos mais dez anos.
"Esta última década está inserida na fase fria da oscilação decadal do Pacífico, que começou em 1999 e tem o efeito de um El Niño ou La Niña de longa duração, até 30 anos. Ela é marcada por uma redução das precipitações, como se tivéssemos um mês chuvoso a menos do que na fase quente", explica o professor da Universidade de São Paulo (USP) e coordenador da Rede Internacional de Estudos Sobre Meio Ambiente e Sustentabilidade, Pedro Luiz Côrtes.
Segundo ele, essa fase seca deve durar pelo menos até 2025, o que dificultará a recuperação do Cantareira. Um estudo feito por Côrtes projeta que o manancial só deve atingir um nível de segurança, de 38% da capacidade sem incluir o volume morto, em oito anos. "As fases frias e quentes do Pacífico têm impacto direto nas vazões dos rios. Por isso chamo atenção para que esse prognóstico climático de médio e longo prazo seja incluído na nova forma de operação do sistema", diz.
O diretor do Departamento de Recursos Hídricos da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Antonio Carlos Zuffo, vê nos ciclos solares, que influenciam a circulação atmosférica e a temperatura oceânica, a explicação para eventos climáticos extremos no mundo, como a seca do Cantareira.
Segundo ele, a temperatura máxima média da Terra apresenta tendência de queda desde 1998 - embora 2014 tenha sido o ano mais quente da história, segundo a Organização das Nações Unidas (ONU) -, semelhante à observada entre 1930 e 1970, que coincide com o período mais seco da região do Cantareira até a atual crise de estiagem.
Zuffo diz que o sistema foi concluído em 1974 e suas dimensões definidas com base em um período seco, de baixas precipitações, enquanto que sua operação pelos 30 anos seguintes ocorreram em período predominantemente chuvoso, aumentando os riscos de enchentes. Ele alerta que cenário inverso ocorre desde a outorga de 2004.
"O comportamento se repete. De 1930 a 1970, as precipitações caíram; de 70 até 2003, aumentaram. E, agora, de 2004 para cá, têm caído novamente. Então, temos ainda mais três décadas em que as chuvas devem diminuir e ficar abaixo da média." Segundo a Sabesp, a chance de uma seca como a de 2014 ocorrer era de 0,004.

Após seis décadas, eventos extremos se repetem no mundo

Não foi só o Sistema Cantareira que reviveu em 2014 uma severa crise de estiagem como a de 1953. Estudo feito pelo diretor do Departamento de Recursos Hídricos da Unicamp, Antonio Carlos Zuffo, aponta que os mesmos eventos climáticos extremos observados naquele ano se repetiram nos mesmos locais do mundo em 2014.
"Em 1953 também tivemos seca no Nordeste, na costa oeste dos EUA e na China, enquanto ocorrem enchentes na Amazônia, na Europa e no Japão, exatamente como foi no ano passado." Para Zuffo, não se trata de uma coincidência, mas do impacto dos ciclos solares no clima.

OESP, 13/07/2015, Metrópole, p. A10

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