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Ruralistas reagem à pressão indígena por terras

OESP, Nacional, p. A15
04 de Dez de 2011

Ruralistas reagem à pressão indígena por terras
Em Mato Grosso, levamento mostra que agricultores podem perder cerca de 1,1 milhão de hectares caso governo atenda a todas as reivindicações

Roldão Arruda

A Federação da Agricultura e Pecuária de Mato Grosso divulgou um novo levantamento sobre as disputas de terras indígenas no Estado. Elaborado pelo Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária, ele mostra que, caso o governo atenda a todas as reivindicações de grupos indígenas de ampliação de suas terras, 1,1 milhão de hectares de áreas já consolidadas pela agropecuária terão de mudar de mãos nos próximos anos.
O levantamento foi encaminhado ao governo de Mato Grosso e à Assembleia Legislativa, como sinal de alerta e acompanhado de pedidos de intervenção política. Estudos semelhantes têm sido realizados em outros Estados, com o estímulo de entidades de representação dos ruralistas, inquietas com as pressões dos índios.
Em Brasília, a senadora Kátia Abreu (PSD-TO), reeleita há pouco tempo para a presidência da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), e representantes da bancada ruralista no Congresso recolhem e utilizam esses estudos nos encontros que têm mantido periodicamente com agentes do governo federal para debater o tema.
Diálogo. Com o objetivo de reduzir as tensões, técnicos da Advocacia-Geral da União (AGU) e do Ministério da Justiça dialogam e analisam toda a legislação que envolve o assunto. Na semana passado um grupo de dez senadores da bancada ruralista esteve no ministério.
Um dos pontos centrais das análises é a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) no caso da demarcação da Terra Raposa Serra do Sol, em 2009. Os ministros reconheceram, na ocasião, os direitos dos índios de Roraima, mas impuseram limitações para a ampliação de outras áreas já existentes.
Em Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, onde os índios guaranis lutam por mais terras, a decisão acirrou os conflitos. Segundo o ruralista Rui Prado, presidente da Federação da Agricultura e Pecuária de Mato Grosso, o Estado tem 57 terras indígenas regularizadas e 11 em fase de estudos para serem demarcadas. Além disso, outras 14 áreas estariam sendo reivindicadas.
Na avaliação de Prado, o assunto deveria sair da competência do governo federal e passar para o Congresso e para os governos estaduais.
De acordo com a senadora Kátia Abreu, o que deve vigorar é a decisão do Supremo, que estabeleceu como marco de demarcação a área que os índios ocupavam em 1988, quando foi promulgada a Constituição.
"Se o governo quiser ir além disso, tem de pagar pela terra e pelas benfeitorias", afirma ela. "Não pode continuar expropriando proprietários rurais que possuem títulos legais e há décadas cultivam a terra."

Tramitam no STF 150 ações sobre o tema

SÃO PAULO

A reação dos ruralistas ao avanço das terras indígenas ocorre em três frentes. A primeira delas é na área da Justiça; a segunda, no Congresso; e a última, no Executivo, com pressões da bancada ruralista sobre o governo.
De acordo com levantamento realizado pela advogada Erika Yamada, do Instituto Socioambiental, em todo o País existem centenas de processos judiciais contestando os procedimentos de demarcação. Só no Supremo Tribunal Federal (STF) tramitam mais de 150 ações sobre o tema. Em 2010 os ministros concederam dez medidas liminares desfavoráveis às demarcações.
Na Justiça Federal do Mato Grosso do Sul, na Seção de Cuiabá, a advogada localizou um total de quase 120 processos judiciais em curso. Foram propostos por cooperativas rurais, colônias agrícolas, sindicatos, fazendeiros, contra associações indígenas, Fundação Nacional do Índio (Funai) e União Federal. Alguns tramitam desde a década de 1980. Em segunda instância ela encontrou 100 recursos.
Do conjunto de processos que a advogada analisou em Cuiabá na primeira instância, apenas 10% foram sentenciados. Em todos os casos, as sentenças foram favoráveis aos índios.
Outro estudo. No Congresso, de acordo com outro levantamento, realizado por Ana Paula Souto Maior, que também é advogada e vinculada à mesma organização não governamental, tramitam atualmente cerca de 100 proposições sobre direitos indígenas. "A maioria delas visa restringir os direitos garantidos na Constituição de 1988, principalmente o direito à terra e ao usufruto exclusivo de seus recursos naturais", escreveu ela em artigo sobre o assunto, publicado no relatório Povos Indígenas no Brasil 2006-2010, lançada no mês passado.
Ela constatou ainda que cerca de 60% das proposições são apresentadas na Câmara e se destinam basicamente a alterar o processo de demarcação. A maior parte sai dos gabinetes de parlamentares de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Santa Catarina.
Frequentemente eles visam transferir para o Congresso a tarefa de definir novas áreas indígenas ou ampliar as já existentes. Hoje a missão é do Executivo.
Segundo a advogada Ana Paula, a possibilidade desses projetos de lei seguirem adiante são praticamente nulas, uma vez que contrariam a Constituição de 1988. Em 2009, no caso do julgamento do caso da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, o STF reiterou os princípios constitucionais, enfatizando que a tarefa cabe ao Executivo.
"Somente à União, por atos situados na esfera de atuação do Poder Executivo, compete instaurar, sequenciar e concluir formalmente o processo demarcatório das terras indígenas, tanto quanto efetivá-lo materialmente...", diz o trecho da decisão que aborda o tema.
Em outras palavras, para atender às pressões da bancada ruralista, seria necessário antes modificar a Constituição. / R.A.

OESP, 04/12/2011, Nacional, p. A15

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