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Rock in Rio na floresta

O Globo, Segundo Caderno, p. 6
29 de Ago de 2016

Rock in Rio na floresta
Festival de música lança ação ambiental com show que juntou Ivete Sangalo e Plácido Domingo em palco sobre o Rio Negro

EDUARDO FRADKIN
Enviado a Manaus (AM)
fradkin@oglobo.com.br
Eduardo Fradkin viajou a convite da produção do Rock in Rio

RIO - Nesta segunda-feira à tarde o governo brasileiro ratifica o Acordo de Paris, firmado no fim do ano passado, pelo qual se comprometeu a recuperar 12 milhões de hectares de floresta até 2030. Com isso, a promessa ganha força de lei internacional. Esse longo trabalho de replantio já tem três milhões de árvores empenhadas (o equivalente a 1.500 hectares) graças, quem diria, ao mundo da música. A ação Amazônia Live, do festival Rock in Rio, foi lançada anteontem com um show em Manaus, no meio da floresta, reunindo num palco flutuante em forma de folha de árvore, sobre o Rio Negro, o tenor espanhol Plácido Domingo, seu filho e discípulo Plácido Domingo Jr., a cantora Ivete Sangalo, o guitarrista do Sepultura, Andreas Kisser, a orquestra Amazonas Filarmônica e outros músicos. E se o evento começou com um tropeço (literal) de Domingo, que caiu de joelhos vindo de uma ponte móvel de ligação entre a plateia e o palco-folha, as coisas logo se acertaram. Ivete brincou que o tenor estava ansioso por se juntar a ela, Domingo tranquilizou a todos dizendo que estava bem, e o espetáculo deslanchou.
Na ocasião, foi anunciada a primeira atração do Rock in Rio de 2017, a banda americana Maroon 5. Enquanto isso, nos bastidores, o empresário Roberto Medina, idealizador da ação ecológica e do festival, negociava para realizar um velho desejo:
- Sempre imaginei uma abertura do Rock in Rio com Plácido Domingo e a Orquestra Sinfônica Brasileira. Quero aproveitar essa vinda dele a Manaus para tratar disso - disse Medina, antes do evento, que marcou o início de uma campanha voltada para o público, em que cada doação de R$ 4,5 garantirá o plantio de uma árvore. - Essa ação será promovida em todas as edições do festival até 2019. A meta é de quatro milhões de árvores. Já temos um milhão doado pelo festival, outro milhão pelo Banco Mundial, 800 mil pela Conservação Internacional, 100 mil pela Universidade Estácio de Sá e 40 mil financiadas por um leilão de guitarras feito na última edição do Rock in Rio Lisboa. Conto com o público para o milhão que falta.
De saída ao fim do show visto in loco por apenas 200 convidados, Domingo falou rapidamente com O GLOBO. Elogiou a iniciativa ecológica e seus parceiros de palco, chamou Ivete de "uma linda mulher", lembrou que já havia cantado em outros lugares inusitados, citando as pirâmides do Egito, e contou que foi "uma emoção" dividir o palco com seu filho na canção "Perhaps love", de John Denver.
- Este lugar aqui é lindo, mas o mais importante é a mensagem que passamos, e eu espero que ela entre no coração das pessoas - disse o espanhol, que comentou a possibilidade de participar do festival Rock in Rio. - Eu adoraria. O meu maior problema é de agenda, devido a meus compromissos como diretor da Ópera de Los Angeles. Havendo como conciliar as duas coisas, eu aceitarei o convite.
Plantio no Mato Grosso
Veterana em edições brasileiras e internacionais do festival, Ivete viveu uma experiência inédita no show de sábado à noite. Foi a primeira vez que se apresentou com um cantor lírico. No palco, ela anunciou que seria uma grande honra receber o "fofo" Plácido Domingo, que "já virou amiguinho". Fora de cena, fez comentários sobre o dueto com o tenor em "Aquarela do Brasil", logo depois de ela ter cantado, solo, a música "Circle of life", do musical "O rei leão" (afinada e em inglês seguro, ainda que num tom ligeiramente abaixo ao da orquestra).
- Esse contraste de vozes é que dá um sabor interessante ao encontro. O vibrato dele é diferente do meu, é diferente do que se usa na música popular. Eu nunca tinha feito algo assim. Só cantei com tenor lírico acompanhando a gravação em disco em casa - disse ela, que correu dali para outro show, na praia manauense de Ponta Negra, onde cantou para uma multidão de mais de 70 mil, também como parte da ação Amazônia Live.
Apesar desse show - gratuito - de Ivete ligado ao projeto, Medina não conseguiu aprovação da Lei Rouanet para captar patrocínios, fato que ele minimizou:
- Se eu tivesse a Lei Rouanet, teria feito algo maior ainda. Mas essa não era uma condição para realizar esse evento. Esse é um investimento meu. É um investimento na marca Rock in Rio. É miopia do capital achar que causas sociais e ambientais não estão ligadas ao consumo. Quando você cria uma história de amor entre o público e a sua marca, e defender uma causa entra nessa receita, você gera um ativo. É o chamado storytelling. Não é uma ação barata de marketing.
O local escolhido para o show de 200 convidados (que foi transmitido pelo canal Multishow) - colado ao isolado hotel Amazonia Jungle Palace e se valendo de parte da estrutura dele - não é o mesmo onde será feito o plantio, que começará em outubro, em região desmatada do Xingu no estado do Mato Grosso. Ali, um dos parceiros do Rock in Rio nessa iniciativa, o Instituto Socioambiental, já desenvolve um trabalho que envolve fazendeiros e as populações ribeirinha e indígena (estas, remuneradas por coleta de sementes). Aproveitando o simbolismo do show de lançamento do Amazônia Live, com seu palco-folha emoldurado pela selva amazônica, a única oportunidade perdida foi a soprano convidada Ana Maria Martínez - que cantou as "Bachianas brasileiras no 5", de Villa-Lobos - não ter preferido justamente uma canção do seu poema sinfônico... "A floresta do Amazonas".

O Globo, 29/08/2016, Segundo Caderno, p. 6

http://oglobo.globo.com/cultura/musica/rock-in-rio-lanca-acao-ambiental…

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