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Risco cada vez maior

CB, Mundo, p.12
17 de Out de 2005

Risco cada vez maior
Especialistas prevêem que número de tragédias nesta década deve bater recorde histórico. ONU adverte que concentração de habitantes em áreas urbanas e degradação do meio ambiente agravam a situação

Mariana Mainenti
Da equipe do Correio

O terremoto que há nove dias devastou o norte do Paquistão não pode ser considerado uma exceção. Tragédias como a causada por esse forte tremor, pelo furacão Katrina nos Estados Unidos ou pelo tsunami no sudeste asiático, em 2004, são cada vez mais comuns. Um levantamento desde o começo do século passado feito pela Estratégia Internacional para Redução de Desastres (UNISRD), órgão das Nações Unidas, mostra que, enquanto em toda a década de 80 houve 1.976 desastres naturais, apenas de 2000 a 2003 o número chegou a 1.893.
"As catástrofes estão aumentando, principalmente, pelo aumento da vulnerabilidade social e econômica. A concentração da população em zonas urbanas é o que está criando as maiores áreas de risco", disse ao Correio Braziliense o diretor do UNISDR, Salvador Briceño, em Genebra. Para ele, o problema da densidade urbana soma-se o da pobreza. "São, geralmente, as pessoas pobres que se instalam em áreas de risco", aponta.
Briceño explica que a degradação ambiental é fator fundamental na ocorrência de catástrofes. "O fato de os ecossistemas, que servem de freio a alguns fenômenos naturais, estarem sendo destruídos, cria um risco maior. Outra questão muito importante é o aquecimento da Terra, que provoca o aumento do nível do mar e, conseqüentemente, a intensidade e a freqüência de algumas tragédias", afirmou Briceño.
Os desastres que mais se multiplicaram foram os chamados hidrometeorológicos, categoria que inclui inundações, maremotos, tempestades e deslizamentos de terra. Na década de 1900 a 1909 ocorreram 28 fenômenos desse tipo. De 2000 a 2003, houve 1.444. Já os desastres geológicos, como terremotos e tsunamis, passaram de 36 a 152 no mesmo período. Os fenômenos biológicos, que incluem epidemias e infestações de insetos, passaram de cinco a 297.
Alarmada, a ONU desenvolveu no ano 2000 uma estratégia internacional para redução de desastres, que prevê ações de educação e conscientização do público, reorganização do território, preservação ambiental e desenvolvimento de sistemas interligados de alerta para situações de emergência. "Nos EUA, vimos com o Katrina que não foi feito o suficiente em Lousiana e no Mississipi", afirmou o diretor do UNISDR.
Briceño enfatizou a importância de que as autoridades levem informação à população como medida para evitar catástrofes. "Muitas vezes é a ignorância que mata. No tsunami vimos que as pessoas morreram por ignorância, porque não sabiam que tinham de correr", lembrou.
Impacto econômico
Como a pobreza está no centro do problema, a ONU está incentivando o microcrédito como maneira de dar meios de sobrevivência às populações de baixa renda e de evitar números elevados de mortes por desastres, além do seguro contra catástrofes naturais, para famílias atingidas. Os principais microfinanciadores são o Banco Mundial e o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).
As políticas de microfinanciamento levam em conta também o impacto negativo que muitas dessas tragédias têm sobre a economia mundial. Na lista das catástrofes que mais derrubaram o Produto Interno Bruto (PIB) nos países onde ocorreram, aparece uma enchente no Brasil, que segundo dados do BID reduziu em 1% o PIB brasileiro em 1984. "O PIB tende a cair cerca de 2% em média no ano do desastre e cresce cerca de 3% nos dois anos seguintes", calcula o diretor do Departamento de Desenvolvimento Sustentável do BID em Washington, Kari Keipi.
O aumento do PIB verificado nos anos subseqüentes ao desastre ocorre devido aos esforços de reconstrução das áreas atingidas. Mas esse mecanismo de "compensação" tende a acabar, segundo o professor da Copenhagen Business School (Dinamarca) Torben Andersen. "A reconstrução nos países em desenvolvimento só tem sido possível graças à ajuda multilateral. Mas enquanto as perdas associadas às catástrofes naturais crescem rapidamente, as doações internacionais estão estagnadas", prevê Andersen. Segundo Kari Keipi, na América Latina e no Caribe há cerca de 40 desastres graves por ano, com 4 milhões de pessoas atingidas e cerca de 5 mil mortos. Os prejuízos diretos somam US$ 3,2 bilhões.

Brasil precisa se prevenir

Embora terremotos e furacões não façam parte da memória da população, o Brasil ocupa o 12o lugar no ranking da Organização das Nações Unidas (ONU) dos países com maior número de vítimas de desastres naturais. O principal motivo são enchentes e deslizamentos de terra causados por chuvas fortes, além das estiagens - fenômenos que vêm ocorrendo com mais freqüência por causa do aquecimento global. A concentração de pessoas em áreas urbanas deixa a população ainda mais vulnerável, e o país apresenta deficiências em matéria de defesa civil.
"As zonas urbanas no Brasil, como São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte, têm riscos. São comuns as inundações e os deslizamentos de terra causados pela construção de habitações nas encostas dos morros. Além disso, há regiões do país que sofrem muito com a seca", disse Salvador Briceño, diretor do UNISDR, agência responsável pela estratégia internacional da ONU para redução de desastres.
Terremoto
"O Brasil tem, sim, risco de terremoto. Por isso, alguns municípios onde já ocorreram tremores de terra nos pediram treinamento para defesa civil. Há 50 anos, tivemos um terremoto no Mato Grosso que alcançou 6,6 graus na escala Richter. Naquela época, a área não era ocupada. Em março do ano passado, tivemos o furacão Catarina, na região Sul", disse ao Correio o diretor do Departamento de Minimização de Desastres do Ministério da Integração Nacional, Sérgio José Bezerra.
O professor Torben Juul Andersen, da Copenhagen Business School, alerta para outro fator de risco: "O número de catástrofes, assim como as perdas econômicas associadas a esses eventos, têm aumentado dramaticamente na década passada e, particularmente, em países em desenvolvimento. Há poucas dúvidas de que as catástrofes naturais estão se tornando rapidamente a maior preocupação econômica em países em desenvolvimento."
Por essa razão, Andersen recomenda que países como o Brasil passem a investir mais em prevenção de desastres. Mas, no caso brasileiro, essas medidas estão em ritmo mais lento que o necessário. "O país ainda precisa avançar em defesa civil", admitiu Bezerra. "Dos 5.671 municípios, apenas 3.800 têm coordenadoria de defesa civil." (MM)

CB, 17/10/2005, Mundo, p. 12

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