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Rio Amazonas sofre desequilíbrio ambiental

O Globo, Ciência e Vida, p. 33
30 de Jul de 2004

Rio Amazonas sofre desequilíbrio ambiental

A substituição da Floresta Amazônica por cultivos agrícolas e pastagens está afetando um de seus mais preciosos bens: o Rio Amazonas. A bacia hidrográfica que representa uma das maiores reservas de água doce do planeta já apresenta em alguns pontos níveis alterados de substâncias como nitrogênio, fósforo, cálcio, magnésio e potássio.

Estudo apresentado ontem no último dia da III Conferência Científica do LBA - o Experimento em Grande Escala da Biosfera-Atmosfera da Amazônia - revela que a destruição da floresta afeta a composição biogeoquímica do Rio Amazonas, ao menos em sua parte central, o que pode provocar alterações sérias em sua biodiversidade.

- Um dos primeiros resultados surpreendentes de nosso estudo é que existe uma interação muito grande entre o rio e o uso do solo - explicou o principal autor do estudo, Reynaldo Victoria, da Universidade de São Paulo (USP).

Mata já perdeu parte de sua riqueza

Em muitos lugares, regiões que contavam com até 506 diferentes espécies vegetais, ficam com menos de 40 depois das queimadas. Além disso, a maior parte do rio corre na sombra da mata. A retirada das matas das margens do rio faz cair drasticamente os níveis de nitrogênio das águas porque a vegetação é um dos maiores reservatórios deste elemento. Em contrapartida, faz aumentar as concentrações de fósforo, cálcio, magnésio e potássio nas águas.

- Isso altera as espécies que vivem no rio, sua biodiversidade, e o próprio metabolismo do rio - sustenta Reynaldo Victória.

Árvores das margens precisam de proteção

Outro problema, segundo o pesquisador, também está relacionado ao fato de, em condições normais, a maior parte do rio correr na sombra da mata. A retirada da floresta altera os níveis de luz solar recebidos, o que tem uma influência direta sobre as formas de vida aquáticas.

- Acho importante tentarmos controlar esse processo antes de chegarmos aos níveis do Rio Tietê, em São Paulo, em termos de biodiversidade e poluição - alertou Victória. - Se os fazendeiros ao menos seguissem a lei e mantivessem as matas ciliares (nas margens dos rios), isso já ajudaria a resolver 90% do problema.

A preservação das águas do Amazonas é fundamental para o país, de acordo com especialistas. Se o Brasil tem cerca de 20% das reservas de água doce do mundo - o que o coloca numa posição extremamente privilegiada no mundo - isso se deve em grande parte ao Amazonas e seus afluentes.

O estudo revelou ainda que as águas do Amazonas estão saturadas de dióxido de carbono (CO2), sobretudo devido à decomposição de matéria orgânica.

- O rio respira - sustentou o pesquisador.

De acordo com ele, enquanto a floresta absorve cerca de uma tonelada de carbono por hectare ao ano - um verdadeiro serviço de faxina - aproximadamente o mesmo volume é lançado de volta na atmosfera pelo rio.

Agricultura e indústrias na mata

Cientistas propõem novas formas para desenvolver a Amazônia
Brasília. A única forma possível de preservar a Floresta Amazônica na avaliação de especialistas reunidos em Brasília para a III Conferência Científica do LBA, que terminou ontem, é a ocupação sustentável da mata. Os cientistas acreditam que a agricultura, a exploração de madeira e até a industrialização podem ser benéficas à floresta, desde que bem gerenciadas.
- É possível conciliar produção agrícola e floresta - afirmou Daniel Nepstad, do Woods Hole Research Center, nos Estados Unidos. - O grande desafio é identificar as áreas que devem ser excluídas da expansão agrícola seja pela alta biodiversidade, por conter,terras indígenas ou pela fragilidade dos solos.
Para Michael Keller, da Forest Service University, nos EUA, a Amazônia representa o futuro da agricultura mundial e, por isso mesmo, a prática deveria ser gerenciada de maneira intensiva e sustentável.
- A população mundial vai crescer e precisamos ter mais comida - lembrou Keller. - Uma parte desses alimentos pode ser produzida na Amazônia.
Para Carlos Nobre, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), a saída pode ser a ocupação intensiva das áreas desmatadas, que somam 615 mil quilômetros quadrados.
- A área aberta é maior do que a França, pode ter uma produtividade absurdamente alta firmou. - Do ponto de vista da tecnologia moderna é possível. Só não podemos é cair mais uma vez na armadilha da monocultura (no caso, a soja), como já fizemos tantas vezes.
Keller lembra que até a extração de madeira pode ser feita de forma sustentável.
- Há formas de exploração de madeira de impacto reduzido que geram o mesmo lucro e causam metade dos danos - lembrou o americano.
Já Antônio Nobre, do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), acredita que a saída possa estar na industrialização.
- O desenvolvimento da Amazônia é a única saída. Mas não o desenvolvimento com gado, madeira e soja, e sim o industrial - disse. (R.J.)

Saiba mais sobre o rio

Tamanho: Com aproximadamente 6.280 quilômetros de extensão, o Amazonas é o segundo maior rio do mundo. É menor apenas do que o Rio Nilo, na África.
Volume: O Amazonas é o principal rio do mundo em volume d'água. Diariamente, ele despeja 1,5 trilhão de litros de água no Oceano Atlântico. Com mais de mil tributários, ele responde por pouco menos de 20% de toda a água doce do planeta.
Afluentes: Dezessete tributários do Amazonas possuem mais de 1.600 quilômetros de extensão.
Origem: O rio nasce em território peruano, nas geleiras dos Andes, cinco mil metros acima do nível do mar, e deságua no Oceano Atlântico, num imenso estuário.
Navios: O Amazonas tem um estuário tão largo e profundo que permite a navegação de navios de grande porte.
Importância: Durante a estação chuvosa, a área coberta pelo Amazonas e seus tributários chega a triplicar, alcançando 350 mil quilômetros quadrados. A Bacia Amazônica drena 40% da América do Sul

O Globo, 30/07/2004, Ciência e Vida, p.33

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