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Reunião sobre clima termina com racha

FSP, Ciência, p. A18
10 de Out de 2009

Reunião sobre clima termina com racha
Europa quer fim do Protocolo de Kyoto, enquanto Terceiro Mundo se entrincheira contra mudança em "regra do jogo"
Tentativa de unificar bases das negociações conduz a impasse; nova rodada se dá em Barcelona antes de encontro final na Dinamarca

Claudio Angelo
Enviado especial a Bancoc

A penúltima reunião de negociação antes da conferência do clima de Copenhague terminou ontem em Bancoc, Tailândia, com duas promessas: uma dos países desenvolvidos, de que vão acabar com o Protocolo de Kyoto em favor de um acordo do clima único para ricos e pobres. A outra, dos países em desenvolvimento, de que não deixarão isso acontecer.
"O Grupo da África se opõe à substituição do Protocolo de Kyoto por quaisquer outros acordos. Vou repetir: o Grupo da África se opõe à substituição do Protocolo de Kyoto por quaisquer outros acordos", declarou o representante da Argélia numa das plenárias finais do encontro, ontem de manhã. Foi apoiado por todo o G77, o grupo dos países em desenvolvimento, que o Brasil integra.
"O Protocolo de Kyoto não basta mais; o melhor caminho é integrar tudo num acordo único", declarou em seguida o sueco Anders Turesson, falando em nome da União Europeia.
Em outras áreas, como adaptação, transferência de tecnologia e florestas, houve avanços em Bancoc, com a redução do texto de negociação de 181 páginas -mas os diplomatas não sabiam ainda em quanto ontem- e o acerto de minúcias.
A negociação sobre o clima hoje está dividida em dois pedaços, ou "trilhos": de um lado estão os países industrializados que ratificaram o Protocolo de Kyoto e hoje negociam metas obrigatórias mais elevadas para um segundo período do protocolo, de 2013 a 2020. De outro, os países em desenvolvimento mais os EUA, negociando compromissos voluntários.
Como os EUA -o principal emissor histórico de gases-estufa- jamais integrarão algo parecido com Kyoto, os europeus têm pressionado pela incorporação de elementos de Kyoto num único "trilho", que abarque o mundo todo.

Dividir para conquistar
Para o G77, a estratégia dos europeus é "dividir para conquistar". As ONGs criticaram o resultado da reunião, chamando-o de "retrocesso". Segundo os ambientalistas, o encontro em Bancoc não refletiu as declarações dos chefes de Estado como Barack Obama e Nicolas Sarkozy nas Nações Unidas no fim do mês passado. Na ocasião, todos prometeram liderar o processo rumo a um acordo em Copenhague.
"Estamos em um momento difícil da negociação", disse o embaixador Luiz Alberto Figueiredo Machado, chefe da delegação brasileira em Bancoc. "Faltam convergências importantes em metas para os países industriais e apoio financeiro. São temas que só vão se resolver em Copenhague."
Yvo de Boer, secretário-executivo da Convenção do Clima da ONU, voltou a minimizar ontem o racha político, comparando a discussão a escolher a cor do papel de presente antes de comprar um sapato. Foi interpelado por uma jornalista indonésia: "Mas e se ninguém quiser comprar o sapato"?
A União Europeia, por sua vez, insistiu que leva Kyoto a sério e que não está matando o protocolo. "Estamos é na nossa segunda operação de resgate", afirmou o sueco Turesson.
Ele disse que os europeus não querem "reinventar nada", mas dizem que um acordo que não inclua todas as principais economias do planeta não evitará o aquecimento global.
O negociador americano Jonathan Pershing insistiu que seu país está comprometido com "metas de curto prazo para toda a economia". Disse também que os EUA não trabalham com a possibilidade de o Congresso não aprovar a lei de mudanças climáticas antes de Copenhague, mas que a atuação dos congressistas é determinante. Disse também que o Executivo não teria força para propor algo mais ambicioso que o máximo de 7% de redução de emissões até 2020 considerado pelo Senado. Mas isso foi antes do Nobel de Obama.

Nem Nobel de Obama dá gás a negociações

Do enviado a Bancoc

Nem a notícia do Prêmio Nobel da Paz para Barack Obama foi capaz de energizar as conversas sobre clima em Copenhague.
O único delegado que fez referência ao Nobel foi o maltês Michael Cutajar, que preside a negociação. "Agora o presidente Obama terá duas razões para ir à Escandinávia em dezembro", brincou. A cerimônia do Nobel acontece em Oslo no dia 10 -quando a conferência do clima já terá começado não muito longe, em Copenhague.
"Se o presidente Obama quiser ser um verdadeiro Nobel da Paz, ele deve se envolver pessoalmente para reverter a atitude do seu país de bloquear as negociações", declarou Gerd Leipold, diretor-executivo do Greenpeace.
Menos feliz parecia Harlan Watson, negociador de clima do governo Bush. Questionado pela Folha sobre o Nobel, Watson disparou: "Foi uma surpresa. Acabo de saber. Sem comentários." (CA)

FSP, 10/10/2009, Ciência, p. A18

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