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Retomada do julgamento expõe cisão entre índios

CB, Brasil, p. 8
08 de Dez de 2008

Retomada do julgamento expõe cisão entre índios
Grupo de indígenas que trabalham para os arrozeiros afirmam que retirada dos produtores acaba com o comércio e com 6 mil empregos

Leonel Rocha
Da equipe do Correio

A diretoria da Sociedade de Defesa dos Índios Unidos de Roraima(Sodiur) estima que cerca de 6 mil indígenas poderão perder os empregos com a demarcação da reserva indígena Raposas Serra do Sol em área contínua e a subseqüente expulsão dos arrozeiros que se instalaram na região. O alerta da instituição será feito a partir de hoje aos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), que vão retomar na quarta-feira o julgamento da ação impetrada pelo governo do Estrado de Roraima contestando o decreto presidencial que regulamentou a demarcação em áreas contínuas da reserva indígena, no nordeste de Roraima, fronteira com a Venezuela e a Guiana. A posição da entidade confirma a divisão existente até entre os índios sobre o futuro da reserva.

Os cerca de 11 mil indígenas representado pela Sodiur discordam da posição da Fundação Nacional do Índios (Funai), defensora da manutenção do decreto presidencial que prevê a demarcação da reserva em área contínua e a desintrusão dos produtores rurais que se instalaram dentro da reserva há alguma décadas. Muitos índios liderados pela Sodiur trabalham para os arrozeiros e reclamam que a expulsão dos produtores rurais acabou com o comércio que havia nos distritos do interior de Roraima, como Mutum, Socó, Água Fria e Vila Surumu, por falta dos consumidores não-índios que deixaram as áreas. "Nós não precisamos somente de terras. Queremos produzir arroz, feijão, mandioca e farinha para vender nos comércios, mas as vilas não existem mais com a saída dos não-índios", lamenta Silvio da Silva, presidente da Sodiur, instituição ligada ao movimento evangélico da Amazônia..

O tuxaua (chefe) macuxi Emerson de Souza, 32 anos, casado, oito filhos, critica a Funai por não fornecer equipamentos agrícolas para o trabalho dos índios que desejam produzir arroz. Além da agricultura, ele chega a defender a mineração em terras indígenas. "Lá, somente os índios não podem minerar. A área está cheia de estrangeiros com seus equipamentos de mineração com a autorização da Funai", protesta Emerson. O líder indígena também deseja que o governo permita a criação de gado na área da Raposa Serra do Sol.

Divergência
Outro grupamento indígena, liderado pelo Conselho Indigenista de Roraima (CIR), prega tese oposta à do Sodiur e defende ferozmente a demarcação da reserva em áreas contínuas. O CIR considera que o modelo de produção coletivista é mais adequado a uma região sensível do ponto de vista ambiental. Além disso, de acordo com a tese dos advogados do CIR apresentada no começo do julgamento no Supremo, a retirada dos arrozeiros é fundamental para que as terras ocupadas pelos produtores rurais (as melhores da região) possam ser utilizadas pelos indígenas.

Depois de uma suspensão de quase quatro meses, o Supremo retoma na quarta-feira o julgamento que vai definir os critérios para a demarcação da reserva indígena mais polêmica do país. O trabalho do STF foi interrompido a pedido do ministro Menezes Direito, que pediu vista do processo para analisá-lo melhor, já que não estava no tribunal quando a ação começou a tramitar. O relator do caso na mais alta corte do país, o ministro Carlos Ayres Britto, já votou - e defendeu a tese da manutenção da reserva em áreas contínuas como a melhor forma de sobrevivência dos indígenas.

O conflito entre índios e fazendeiros na região já levou para a cadeia o prefeito de Pacaraima, Paulo Cézar Quartiero, que também é um dos maiores produtores locais de arroz. A fazenda do produtor rural fica no foco do conflito. Com a demarcação e o decreto de regulamentação, o governo definiu os valores a serem pagos pelas benfeitorias de cada propriedade rural, mas Quartiero liderou um movimento de resistência, com o apoio do governador de Roraima, José de Anchieta, e contestou a demarcação na Justiça. A reserva Raposa Serra do Sol está ocupada por grupamentos da Polícia Federal, que estão na área para evitar novos conflitos entre fazendeiros e indígenas.

CB, 08/12/2008, Brasil, p. 8

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