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RESISTÊNCIA INDÍGENA VAQUEIROS INTIMADOS

Memélia Moreira
Autor: Memélia Moreira
10 de Nov de 2003

Quase um ano depois do assassinato de Aldo Mota, índio do povo Makuxi, de Roraima, os acusados de sua morte foram intimados, pelos jornais, a se apresentarem ao juíz Helder Girão Barreto. Elizel Martin e Robson Belo Gomes, os intimados, são vaqueiros. Eles trabalhavam na fazenda "Retiro", ex-propriedade do vereador Francisco de Chagas, e que fica dentro da terra Indígena de Raposa/Serra do Sol. Por falta de provas, o vereador não foi intimado. Já os vaqueiros, foram denunciados pelo Ministério Público Federal por homicídio qualificado e ocultação de cadáver. O corpo do índio só foi encontrado dez dias depois do crime.

O resultado desse processo é imprevisível. Os vaqueiros vão a juri popular mas, em Roraima, juri popular para assassinos de índios tem veredicto anunciado. Dificilmente eles serão condenados porque a sociedade local, instigada por políticos (entre eles o vice-líder do Governo no Senado, Romero Jucá-PMDB), que também são grandes proprietários de terras, é racista. Os índios são discriminados e, recentemente, um dos principais jornais de Boa Vista, capital do Estado, chegou a anunciar a venda de índios do povo Yanomami como se fossem animais. Mas já está pagando por isso.

O assassinato desse líder Makuxi aconteceu no momento em que foram retomadas as discussões sobre a homologação de Raposa/Serra do Sol. Demarcada há mais de cinco anos, essa terra, onde vivem Makuxis e Wapixanas, é disputada também pelos fazendeiros-políticos e empresários japoneses que já estão plantando soja. A demora na homologação (ato político que finaliza o processo de regularização da terra indígena, quando ela passa a ser domínio da União) levantou suspeitas sobre um acordo que teria sido feito entre o ministro José Dirceu, chefe do Gabinete Civil da presidência da República e o governador do Estado, Flamarion Portela.

Eleito pelo obscuro PSL, Flamarion aceitou se filiar ao Partido dos Trabalhadores desde que a terra indígena não fosse homologada. Os rumores dessa negociação começaram antes do primeiro turno das eleições presidenciais, e até hoje, não foram desmentidos oficialmente pelo ministro José Dirceu.

Aldo Mota foi o primeiro da série de 23 índios assassinados no Brasil nos dez primeiros meses do governo Lula. Em todos os casos, a luta da terra é a causa principal do crime. Entre os mortos há dois importantes líderes. Marcos Veron, cacique Guarani-Kaiowá, assassinado em plena luta pela demarcação de sua terra em Mato Grosso do Sul e Orides Belini, cacique Kaingang morto em Chapecó, Santa Catarina. Orides rejeitava todas as propostas de arrendamento da terra do seu povo.

Mas nem tudo é notícia ruim em Roraima. Está germinando naquele Estado a primeira tentativa de aliança entre índios, trabalhadores urbanos e camponeses. Com apoio da Comissão Pastoral da Terra (CPT), Central Única dos Trabalhadores/RR (CUT), Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e Conselho Indígena de Roraima (CIR), o movimento "Nós existimos" já promoveu marcha contra corrupção e fez reunião em Maturuca, principal comunidade de Raposa/Serra do Sol, Apiaú, território do povo Yanomami que ficou fora da demarcação e hoje é área de projeto agrícola e, em Boa Vista, com os sindicatos locais.

Essa aliança é o primeiro sinal de que a manipulação política dos latifundistas roraimenses contra os índios começa a se enfraquecer.

Esse artigo está publicado no site da jornalista Memélia Moreira, que há três décadas trabalha com a questão indígena.

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