VOLTAR

Resgate ambiental no Entorno

CB, Cidades, p.29
07 de Mar de 2004

Em uma ação conjunta, biólogos e veterinários salvam peixes, aves e outros animais da região de Unaí (MG) que será inundada por lago da hidrelétrica de Queimado
Resgate ambiental no Entorno
Renato Alves
Da equipe do Correio
Uma das três turbinas da hidrelétrica de Queimado, em Unaí (MG), entra em operação na próxima semana. Quando estiver com a capacidade máxima, em abril, a usina vai gerar 105 megawatts, o suficiente para atender uma cidade de 300 mil pessoas. Serão abastecidos dois municípios mineiros, dois goianos e parte do Distrito Federal. Na tentativa de não repetir as tragédias ambientais produzidas na construção de outras hidrelétricas brasileiras, que arrasaram a vegetação praticamente sem deixar sobreviventes, biólogos, veterinários e outros profissionais passaram os últimos oito meses resgatando animais no reservatório formado com a barragem do Rio Preto, afluente do São Francisco.
O Correio acompanhou o último dia do trabalho de captura e soltura dos animais, na quinta-feira passada. Ao todo, foram salvos 10.043 aves, mamíferos, répteis, anfíbios e artrópedes (aranhas e escorpiões). A maioria foi solta em matas das redondezas. As equipes resgataram ainda 16.790 exemplares de peixes, de 38 espécies diferentes. Todos os animais acabaram removidos para outros pontos do Rio Preto, distantes da hidrelétrica. "As perdas foram mínimas. Ao longo de todo o período de enchimento do reservatório, não encontramos nenhum animal morto, boiando na água",
comemora o gerente ambiental da hidrelétrica de Queimado, Edmir Rocha Andreatta.
O enchimento lento do reservatório facilitou o resgate dos animais e evitou mortes em massa, segundo a bióloga Lúcia Paulinelli Barros, coordenadora dos trabalhos de captura, feitos por uma empresa terceirizada. Até o fim do ano passado, a média de enchimento do lago era de dois centímetros por dia", conta Barros. Com a escassez de chuvas no período, animais de maior porte, como onças e capivaras, tiveram tempo de migrar para áreas mais altas. Os maiores bichos resgatados foram os tamanduás, menos ágeis que os felinos.
No entanto, a partir de janeiro, com as constantes chuvas, as equipes de resgate tiveram que acelerar o trabalho. 0 lago de até 60 metros de profundidade e 40 km2 - equivalente a 4 mil campos de futebol - começou a subir 20 cm por dia. Roedores e outros bichos menores, como os lagartos, sapos e cobras, foram os últimos encontrados nas ilhotas que se formaram em meio ao reservatório.
Peixes
O resgate dos bichos teve início com o enchimento do reservatório da usina de Queimado, no dia 25 de junho do ano passado. Os primeiros a sofrer o impacto da obra foram os peixes. Com o fechamento da barragem, o leito do Rio Preto começou a baixar. Nos cinco primeiros dias de trabalho, os pesquisadores se dedicaram apenas à captura dos peixes que habitavam os seis quilômetros de rio após a barragem. Depois, passaram ao resgate dos animais que viviam em terra
Divididos em oito barcos, os pesquisadores e 16 ajudantes deixavam o canteiro de obras logo cedo, todo dia. A missão era resgatar qualquer animal encontrado em ilhas ou no topo de árvores submersas. Inclusive ratos, aranhas, cobras e outros animais peçonhentos. "Não podíamos excluir nenhum, porque todos são importantes para o equilíbrio do meio ambiente", ressalta a bióloga Lúcia Barros.
Apesar da possibilidade de fuga com a ajuda das asas, aves também foram recolhidas pelos pesquisadores. Principalmente os filhotes e os ovos deixados em ninhos ameaçados pelas águas. "Para garantir o crescimento dos filhotes com a menor interferência possível, os biólogos faziam o manejo dos ninhos, colocando-os nos pontos mais altos das árvores até que as aves aprendessem a voar", conta Barros. Os 1.099 ovos colhidos foram levados para o centro de triagem montado no canteiro de obras. Ali, nasceram filhotes de gaviões, garças, marrecos, patos. Alguns foram doados a zoológicos e criadores autorizados pelo Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama).
Animais são monitorados
Todos os animais resgatados também passaram pelo centro de triagem. Aqueles que chegaram machucados foram medicados. Em casos mais graves, eram internados e liberados somente quando estavam aptos a retornar à vida selvagem. A maioria dos bichos foi solta no mesmo dia após receber identificação para monitoramento. 0 Ibama definiu 23 pontos de soltura. Os animais foram liberados em dias e locais alternados, para evitar superpopulação de alguma espécie e desequilíbrio na natureza.
Cuidados maiores mereceram os micos e os macacos. "São animais que têm dificuldade para se adaptar a outros bandos", explica Lúcia Barros. Os bichos são acompanhados por meio de aparelhos de radiotelemetria. Coleiras presas nos animais emitem sinais de rádio captados pelos pesquisadores com a ajuda de antenas.
Perdas
Os cuidados tomados pela Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig) - maior acionária da hidrelétrica de Queimado -, no entanto, não foram suficientes para impedir alguns prejuízos ao meio ambiente. Cerca de 1.100 hectares foram desmatados durante a construção do reservatório. É um quarto do total do lago artificial.
Pelas contas de alguns especialistas, a fauna e a flora cobertas pelas águas levarão mais de 200 anos para se decompor. Isso provocará a emissão de gases poluidores, como o dióxido de carbono e o ácido sulfúrico. "Isso poderia ser minimizado com o corte de mais árvores. Mas o Ibama não deixou", pondera Edmir Andreatta, gerente ambiental da hidrelétrica.

CB, 07/03/2004, p. 29

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.