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Reforma agraria cria latifundios

JT, Politica, p.A4
08 de Fev de 2004

Reforma agrária cria latifúndios
O Incra encontrou em vários estados do País a esdrúxula situação de grandes áreas loteadas em favor de pequenos produtores voltarem a pertencer a um dono
ROLDÃO ARRUDA
O trabalho de moralização de assentamentos rurais, que o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) começou a realizar no ano passado, está deixando à mostra alguns absurdos que nem os especialistas no assunto imaginavam. No assentamento Cidapar, que fica na fronteira do Pará com o Maranhão e onde a área média permitida para cada família assentada é de 30 hectares, os fiscais do Incra encontraram uma vastidão de quase 4 mil hectares concentrados nas mãos de um único dono. "Estava tudo com um madeireiro da região, que além de ocupar a terra ilegalmente, porque a venda de lotes é proibida, transgredia as leis ambientais explorando a reserva florestal do projeto", conta o superintendente do Incra em Belém, José Roberto Oliveira Faro.
O Cidapar é um dos maiores projetos de reforma agrária do País, com 329 mil hectares, espalhados pelos territórios de quatro municípios. Segundo Faro, cerca de 40% da área do assentamento apresenta irregularidades e está voltando para o Incra, que age por meio de processos administrativos ou, quando encontra resistência, recorre à justiça. "São lotes que estão abandonados ou foram vendidos ilegalmente para pessoas que não fazem parte da clientela da reforma agrária", afirma.
O superintendente do Incra em Rondônia, Olavo Nienow, relata que um dos maiores problemas nos 132 assentamentos sob sua jurisdição é a reconcentração das terras distribuídas pela reforma agrária.
No Tocantins, o superintendente José Cardoso estima que do total de 19 mil lotes que foram distribuídos no Estado, 2 mil estão irregulares. "Terras que deveriam pertencer a pequenos agricultores ficaram concentradas nas mãos de funcionários públicos, comerciantes, vereadores, policiais", diz ele.
Na área da superintendência de Marabá, no sul do Pará, a situação é uma das mais dramáticas do País. Ali, onde o número de assentamentos da reforma saltou de 20 para 380 no espaço de 15 anos, existe uma verdadeira cultura de venda
de lotes, segundo a superintendente, Bernadete ten Caten. "Há casos de assentamentos em que até 80% dos lotes foram negociados ilegalmente", diz ela. "Encontramos verdadeiras fazendas em alguns projetos, com áreas de 1.500 hectares."
Um caso específico citado por Bemadete é o da Fazenda Bamerindus, com quase 50 mil hectares, que foi desapropriada há oito anos para a reforma agrária. "No ano passado, quando começamos a intervenção ali, quase metade da área estava ocupada irregularmente", conta ela. "Encontramos fazendas com até 6 mil cabeças de gado e uma situação de conflito social permanente entre grandes e pequenos produtores."
0 exemplo mais curioso, provavelmente, foi localizado em Pernambuco, no Assentamento Engenheiro Amaragi, região litorânea. Dois lotes foram vendidos, por R$ 45 mil, a um empresário, que aproveitou a vista para o mar e ergueu no lugar uma casa avaliada em R$ 500 mil. 0 Incra está tentando retomar os lotes na justiça.
JT, 08/02/2004, p. A4

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