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Rede Alerta denuncia coação a índios em audiência com Aracruz

Seculodiário.com
Autor: Flávia Bernardes
13 de Abr de 2007

A Rede Alerta Contra o Deserto Verde denunciou, por meio de um documento, que houve coação aos índios das tribos Tupinikim e Guarani do Estado em audiência realizada no dia 28 de março. A audiência previa uma "solução" para o conflito entre os índios e a Aracruz Celulose. A denúncia foi feita na tarde dessa quinta-feira (12) e demonstra a intenção de se repetir o acordo ilegal feito no passado pelo então ministro Iris Resende.

Na época, os índios foram levados a Brasília, onde assinaram um acordo com a transnacional para não perder definitivamente suas terras e ainda permitir o uso dessas terras pela Aracruz Cleulose.

A Rede Alerta tornou públicos detalhes sobre a audiência convocada pela juíza Isabel Cristina Longuinho Batista de Sousa, da Justiça Federal de Linhares.

Para a audiência foram intimados os caciques Tupinikim e Guarani, a Aracruz Celulose, o Ministério Público Federal (MPF) do Espírito Santo e a Fundação Nacional do Índio (Funai), como ré. A ação diz respeito às mobilizações dos índios nos últimos dois anos para recuperar os 11.009 hectares de terras indígenas em poder da transnacional.

Entretanto, ao chegar à audiência a juíza Isabel Cristina informou que a sessão se destinava apenas de uma conversa informal. "Um diálogo de entendimento sobre a proposta que a empresa Aracruz estava disposta a fazer aos índios, e que por isso, os caciques estavam ali como convidados." A juíza citou o despacho do ex-ministro da Justiça Márcio Thomaz Bastos, no qual ele devolveu o processo de demarcação à Funai para elaboração de uma proposta mais adequada que contemple os interesses das partes", diz o documento.

Segundo a Rede Alerta, durante a audiência, a Aracruz Celulose teve tempo indeterminado para expor seu ponto de vista, enquanto os índios tiveram suas falas restritas a apenas três dos sete caciques, sendo pressionados a falar de forma resumida.

Outro ponto chamou a atenção de representantes da Rede Alerta: os representante de entidades dos direitos humanos que prestam assessoria à Comissão de Caciques Tupinikim e Guarani do Espírito Santo também foram barrados na audiência com a justificativa de não haver espaço físico para eles no local. Ainda assim, aguardaram em frente ao prédio, onde foram fotografados por pessoas que saíram do prédio da Justiça Federal sem se identificar.

Foi apresentada a "proposta de entendimento" por representantes da empresa. A proposta previa que ambas as partes reconhecessem que não existem terras indígenas na região de Aracruz e que as áreas ocupadas pelas comunidades são Reservas Indígenas; que, diante disso, a Aracruz não descartaria a possibilidade de examinar a "doação" de uma área ajustada entre MPF, Funai, Ministério da Justiça e comunidades indígenas. Outros itens da proposta podem ser encontrados no site www.aracruz.com.br

Em um clima de coação a proposta foi apresentada pela empresa e apoiada pela juíza, segundo o depoimento dos índios. A proposta foi considerada uma manobra da empresa, que significaria transformar terras indígenas já demarcadas, como Caieras Velhas I e II, Pau Brasil e Combois, em Reservas Indígenas, negando a posse tradicional e aceitando a redução dos 11.009 hectares de terras já comprovadas como tradicionalmente indígenas. Conseguir as terras nestas condições é "inaceitável", na avaliação dos caciques.

Para isso, os índios foram intimados, impedidos de escolher livremente seus representantes e de se expressar, e obrigados a ouvir inverdades. Segundo eles, foram ditas frases como: "O problema de vocês é dinheiro e não a terra"; "O despacho do ministro da Justiça nega a tradicionalidade da posse indígena"; "A terra é da Aracruz Celulose"; "Os índios ameaçam os empregados e/ou contratados da Aracruz".

A ata da audiência não foi incluída ao processo, mas apenas as intimações como, informou o documento da Rede Alerta contra o Deserto Verde. Ficou marcada ainda uma nova audiência para o dia 23 de maio, às 9h. Os caciques já receberam novas intimações.

A Rede Alerta ressalta que reconhece o procedimento administrativo (decreto 1.775/96) como o único instrumento legal para a demarcação das terras indígenas.

Tal processo foi examinado pela Consultoria Jurídica do Ministério da Justiça em novembro de 2006 e, ao contrário do que afirma a Aracruz Celulose, concluiu: "Examinados os aspectos constitucionais e infraconstitucionais aplicados à espécie, conclui-se que o procedimento administrativo em pauta, com vistas a declarar as terras Indígenas Tupiniquim e Comboios, devidamente identificadas e delimitadas, como de posse permanente dos Grupos Indígenas Tupiniquim e Guarani Mbyá, pode prosperar".

A organização denuncia a audiência e alerta os responsáveis pela realização e acompanhamento da demarcação das terras indígenas no Brasil, como o Ministério da Justiça, Fundação Nacional do Índio e Ministério Público Federal, para que não admitam novas pressões e coações aos índios. Sugere negociar uma "solução" para seus direitos constitucionalmente garantidos, como aconteceu nas lutas passadas, em 1981 e 1998.

A expectativa agora é que os responsáveis se pronunciem o quanto antes sobre o ocorrido na audiência em Linhares e assumam suas responsabilidades.

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