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Recado de índio mostra que não basta dinheiro nas aldeias

O Liberal-Belém-PA
15 de Abr de 2002

A Semana do Índio começa hoje marcada por várias programações para lembrar o quanto os povos indígenas ainda estão longe de terem seus direitos garantidos na prática. Hoje, quase 100% das terras índigenas, inclusive as demarcadas, estão invadidas por posseiros, garimpeiros e madeireiros, ou integram algum tipo de projeto. Os números da violência também denunciam as várias faces do descaso. Levantamentos do Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) revelam que, entre 1995 e 1998, foram 46 homicídios e mais de 138 mil ocorrências, com um total de 10.385 vítimas não fatais entre a população indígena.

"Luta sem fim" foi o tema escolhido para representar o desabafo das comunidades indígenas durante as programações da administração regional executiva da Fundação Nacional do Índio (Funai). O objetivo é mostrar que, enquanto, não houver determinação política dos governo e das prefeituras municipais, as terras indígenas vão continuar sendo invadidas. "A Funai, sozinha, e dispondo de parcos recursos, não tem como fiscalizar áreas como a reserva Alto Rio Guamá, que abrange 270 mil hectares", ressalta o indigenista Juscelino Bessa.

Para Célia Valois, administradora regional da Funai, os índios assistidos pela administração de Belém realmente são exemplo de resistência, já que mantêm a posse de suas terras, principalmente na reserva Alto Rio Guamá, e ainda conseguem preservar muitos traços da cultura, incluindo a pintura e a dança.

De acordo com a Funai, as lideranças indígenas também querem mandar um recado para os governantes durante a programação. A principal mensagem é que, "não adianta mais as autoridades ficarem espalhando, na mídia, que ajudam as comunidades. Para os índios, o dinheiro aplicado pelo governo estadual e pelas prefeituras municipais para a construção de escolas e financiamento projetos agrícolas ajuda-os apenas em parte, já que não é suficiente para impedir que as terras indígenas sejam invadidas".

A chefe da Divisão Fundiária da Funai, Edna Miranda, diz ainda que lamenta que a mídia e a sociedade só lembrem dos problemas indígenas no mês de abril, às vésperas no Dia do Índio. Ela lembra que para os povos indígenas, as dificuldades acontecem durante 365 dias do ano e o principal entrave ainda é a falta de recursos para garantir a fiscalização das terras. "Não adinta só demarcar, porque é só a Funai sair para começar a roubalheira de madeira e couro", afirma.

Segundo Edna Miranda, hoje, quase 100% das terras indígenas estão invadidas. No Brasil, são 561 áreas, sendo que, dessas, 32% estão no Pará. No Estado, são 21.046.969 hectares já demarcados ou a serem regularizados. A última contagem realizada pela Funai, em 1996, identificou um número populacional estimado em 25 mil índios.

Estima-se que a população indígena total seja de 550.438 pessoas, pertencentes a 225 povos falando cerca de 180 línguas diferentes. Desta população, cerca de 358.310 indivíduos vivem em seus territórios, outros 191.228 migraram para centros urbanos e cerca de 900 índios são pertencentes a povos não contactados.

Os grupos que aparecem de forma mais expressiva no Estado são os Mundurukus, com população de 7.146 índios, os Kayapós, distribuídos entre o Pará e o Mato Grosso, somando cerca de 4.972 índios, e os Tembés, que possuem uma população de 1.335 indivíduos.

A maioria das tribos vive da agricultura de subsistência e da caça. Porém, alguns grupos exploram os recursos naturais das reservas onde estão localizados ou produzem artesanato de cuias, paneiros, cestos, vasos e outras manifestações criativas da arte indígena plumária, objetos de adorno e amuletos.

Comemorações incluem exposição sobre trabalho indígena

Entre as inúmeras programações desta semana, a administração regional executiva da Fundação Nacional do Índio (Funai) promove, de 15 a 23 deste mês, na galeria dos Correios e Clube Thália, no município de Santa Izabel, exposição de artesanato, fotografias e exibições de vídeo.

A solenidade de abertura da Semana do Índio acontece hoje, no hall de entrada da agência central dos Correios, às 15 horas. Nos Correios, na avenida Presidente Vargas, ficará à disposição do público uma exposição de fotos e artesanatos indígenas, até o dia 19 deste, das 8 às 17 horas.

O Club Thália, no município de Santa Izabel, será palco de exibição de vídeos sobre diversas comunidades indígenas, que também acontecerá no hall de entrada da agência central dos Correios, no Pão de Santo Antônio, no Centro de Reeducação Feminina, no Lar da Providência e no Preventório Santa Terezinha. Esses locais, incluindo a Pediatria da Santa Casa, também serão visitados pela biblioteca ambulante do Centur, também conhecida como caixa-estante, que colocará à disposição do público, além de exibição de slides e vídeos, diversas publicações relacionadas às comunidades indígenas.

Este ano, além das escolas das redes pública e particular de ensino, os técnicos da Funai já estão ministrando palestras sobre a questão indígena em alguns municípios paraenses, igrejas e universidades.

No dia 23, às 14 horas, na sede da Funai, as técnicas do INSS Maria Anízia Dantas Nery e Ana Maria Santa Brígida vão ministrar palestra sobre os benefícios e serviços previdenciários, direcionado aos direitos dos índios.

O indigenista Juscelino Bessa, que integra a equipe de técnicos da Funai, estará ministrando palestras nas escolas das redes pública e privada de ensino sobre o "A luta sem fim!" das comunidades indígenas assistidas pela administração da Funai em Belém, que hoje atende a 20 mil índios que habitam as reservas Alto Rio Guamá, Turé-Mariquita, Acará-Mirim, Nhamundá-Mapuera, no Pará, e algumas aldeias localizadas no Maranhão, na fronteira com o território paraense.

A Paróquia Santo de Pádua também faz programação para refletir sobre as questões indígenas, na comunidade Santa Terezinha do Menino Jesus. A abertura da semana aconteceu sábado, com celebração de missa e participação de várias tribos. Até quarta-feira, 18, acontece, sempre às 19 horas, o momento de celebração, seguido de apresentações culturais. No dia, 19, às 8 horas, a Pastoral da Juventude fará o mutirão dos abaixo-assinados pela aprovação do estatuto do índio e a não instalação dos grandes projetos nas áreas indígenas. Em seguida, haverá almoço comunitário, na praça da Matriz de Santo Antônio. E às 19 horas, o show Aldeia Fraterna, na comunidade de Santa Terezinha.

No domingo, na praça da República, acontece o evento "A Campanha vai Praça" e o Encerramento da Cidadania, no Curumbá.

CNBB vai mostrar que falta boa vontade para com povos

Com o lema "Terra sem males", a Campanha da Fraternidade deste ano vai estar na Praça da República no próximo domingo, das 9 às 14 horas, para mostrar à população que hoje são duas as principais lutas dos índios e que sempre esbarram na falta de interesse político. Segundo o padre Adriano Sella, coordenador das pastorais sociais e da Comissão de Justiça e Paz da CNBB, o primeiro grande entrave é a aprovação do Estatuto dos Povos Indigenas, há vários anos tramitando no Congresso nacional. "É um questão de falta de vontade. São vários interesses, onde estão a bancada ruralista e os latifundiários", aponta.

Outra luta dos índios, segundo o sacerdote, é contra o preconceito e a violência. "Ainda hoje, há pessoas que pensam que os índios são bicho do mato ou que não são civilizados. Mas não são eles que desvalorizam a terra e nem vivem em cidades, onde milhares de pessoas estão abandonados ou passando fome", comenta.

Na avaliação de padre Adriano, o problema dos povos indígenas tem solução. "Mas falta vontade. É um questão política", afirma.

Amanhã,16, na Assembléia Legislativa, a CNBB estará participando de sessão especial para apresentar dados sobre a campanha da fraternidade deste ano.

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