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RAZÕES PELAS QUAIS OCUPAMOS A SEDE DA FUNASA EM MANAUS - EXIGÊNCIAS À FUNASA

CIR-Boa Vista-RR
16 de Dez de 2004

Que a FUNASA assuma de fato o seu papel, claramente definido na Portaria 070, de janeiro de 2004, segundo a qual a saúde indígena é de total responsabilidade deste órgão, e que libere urgente e imediatamente os recursos atrasados do convênio vigente assinado com a COIAB e outras organizações indígenas para que estas prossigam com os serviços de atendimento e programas de saúde indígena. Essas foram algumas das reivindicações apresentadas ao diretor nacional de Departamento de Saúde Indígena (Desai), Alexandre Padilha, pelas lideranças indígenas que ocuparam a sede da Funasa em Manaus, no dia 14 de dezembro.O protesto, segundo as lideranças, serviu para relatar a situação caótica da saúde indígena, exigir a liberação de recursos e o cumprimento por parte da Funasa de seu papel, assumindo compromissos claros sobre o futuro da saúde indígena, após o fim dos atuais convênios assinados com as organizações indígenas.

Leia a íntegra da carta direcionada ao Presidente da Funasa, com os motivos da ocupação e a relação das reivindicações formuladas a partir de depoimentos dos manifestantes.

Ao
Exmo.Senhor
VALDI CAMARCIO BEZERRA
Presidente da Fundação Nacional de Saúde - FUNASA
Brasília - DF

Estimado Senhor,

Nós, usuários, lideranças, conselheiros e representantes dos povos indígenas Sateré Mawé, Baniwa, Tukano, Mura, Tenharim, Munduruku, Tikuna, Torá, Dessano, Parintintin, Arapasso, Xavante, Apurinã, Baniwa, Baré, da área de abranhgência do Distrito Sanitário Especial Indígena de Manaus (DSEI/Manaus) e dos Distritos do Alto Rio Negro, Tefé, Alto Solimões, Vale do Javari, Médio Purus, entre outros, preocupados pelo estado de calamidade em que se encontra a saúde dos nossos parentes e comunidades, e indignados pelo que consideramos desrespeito por parte da FUNASA às nossas organizações representativas que tem convênio com este órgão, e cujas ações estão paralisadas pela falta do repasse de recursos nos últimos cinco meses, decidimos na manhã da terça-feira, 14 de dezembro, ocupar a sede regional da FUNASA em Manaus, como medida extrema para protestar e exigir desta Presidência atenção e resposta imediata às demandas que muito nos afligem e listamos a seguir. Esta ação tem o apoio de organizações representativas dos nossos povos e comunidades, entre elas a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB), o Conselho Indígena do Vale do Javari (CIVAJA), o Conselho Indígena Mura (CIM), a União das Nações Indígenas de Tefé (UNI-TEFÉ), o Conselho Geral da Tribo (CGTT), Federação das Organizações, Caciques e Comunidades Indígenas Ticuna (FOCCIT), a Organização dos Povos Indígenas do Médio Purus (OPIMP), a Coordenação Geral da Tribo Sateré Mawé (CGTSM), Organização dos Povos Indígenas Tora, Tenharim, Apurinã, Mura, Parintintin e Piranhã (OPITTAMPP), e a Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (FOIRN).

A falta de repasse dos recursos correspondentes ao Convênio ainda vigente para a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira - COIAB, em situação similar às outras organizações indígenas conveniadas, está provocando junto aos nossos povos e comunidades, entre outros, os seguintes problemas: paralisação das ações de atendimento e descontinuidade dos programas de saúde, aumento da mortalidade infantil, baixa cobertura vacinal, profissionais de saúde sem salário, fornecedores sem pagamentos em dia, fechamento de pólos-base, falta de medicamento, falta de transporte e combustível, Casa de Saúde do Índio (Casai) em total abandono, mortes de indígenas por falta de atendimento, enfim, falta de condições para exercer as ações complementares e compromissos assumidos nos termos de pactuação com a FUNASA. Esta situação vivida por nós, tornou-se insustentável e não dá mais para seguir esperando, ouvindo discursos, promessas e alegações que só despertam expectativas e nunca viram realidade. Além prejudicar o atendimento à saúde dos nossos povos esta situação tem provocado desgaste e comprometido a credibilidade das nossas instâncias representativas junto à opinião pública, órgãos de governo e, principalmente, junto às nossas próprias comunidades.

Face a esta situação, senhor presidente, exigimos da FUNASA

01 - Que a FUNASA assuma de fato o seu papel, claramente definido na Portaria 070, de janeiro de 2004, segundo a qual a saúde indígena é de total responsabilidade deste órgão.

02 - Que a FUNASA libere urgente e imediatamente os recursos atrasados do convênio vigente assinado com a COIAB e outras organizações indígenas que também enfrentam os mesmos problemas descritos acima.

03 - Que a FUNASA se estruture, no prazo de 90 dias, para assumir de fato as suas responsabilidades com a saúde indígena conforme o estabelecido pela Portaria 070, e pelas demandas impostas pelo fato de que mais de 80% de suas ações se relacionam com a saúde indígena, e não prosseguir com a simples terceirização, o repasse das responsabilidades a municípios que geralmente discriminam os índios, a Universidades ou Organizações Não Governamentais (ONG's) que não conhecem a nossa realidade e cultura e que muitas vezes não tem nenhum compromisso com os nossos povos e comunidades.

04 - Que a FUNASA se comprometa a garantir um processo de transição, que não prejudique a continuidade das ações de atendimento e programas de saúde, quando algumas organizações indígenas conveniadas, como a COIAB, encerrarem os convênios e devolverem ao órgão as responsabilidades que atualmente assumem.

05 - Que a FUNASA garanta recursos financeiros e condições necessárias para a efetivação de um processo realmente participativo de avaliação continua e profunda do atual sub-sistema de saúde indígena, visando a definição de um modelo que realmente atenda as necessidades concretas, as especificidades regionais e culturais e às demandas de saúde dos povos indígenas. Nesse processo, que deve culminar com a Conferência Nacional de Saúde Indígena, devem participar todos os segmentos envolvidos com a saúde indígena: conselheiros indígenas dos Distritos Sanitários, profissionais de saúde, dirigentes das organizações conveniadas, representantes e lideranças tradicionais dos diferentes povos e comunidades indígenas.

06 - Que neste processo de reformulação do modelo de atendimento à saúde indígena sejam incluídos, nas mesmas condições das comunidades indígenas que habitam os territórios tradicionais, os indígenas e comunidades que por motivos históricos habitam atualmente nas cidades, sujeitos a condições de descaso e discriminação dos órgãos e serviços de saúde pública, incluindo os Distritos Sanitários.

07 - Que a FUNASA determine urgentemente a execução do Projeto de reestruturação física, profissionalização, capacitação e humanização da Casa de Saúde do Índio (CASAI), proposto pela própria FUNASA em resposta ás demandas indígenas. Esta demanda vale tanto para a CASAI de Manaus, como às de outras cidades e regiões que também passam por situações de total abandono. Essa estruturação deve, no entanto, avançar para a transformação da CASAI em Unidade de Referência Hospitalar para os povos indígenas, com equipe médica, profissionais e serviços de atendimento permanentes.

08 - Que a FUNASA garanta nas instituições e instâncias vinculadas à saúde dos povos indígenas a contratação de profissionais indígenas, selecionados criteriosamente, com idoneidade, capacidade e competência.

09 - Que a FUNASA em comum acordo com as organizações conveniadas avalie e reveja os termos de pactuação e as competências de cada uma das partes, visando o estabelecimento e cumprimento de compromissos realmente factíveis.

10 - Que a FUNASA garanta a inclusão de novas comunidades indígenas à área de abrangência do DSEI/Manaus, como a comunidade Saterê-Mawé do Rio Tarumã, nas proximidades de Manaus, e as comunidades e organizações indígenas localizadas em bairros desta cidade. Outros povos que não recebem atendimento devem ser incluídos no planejamento e ações dos Distritos mais próximos a suas comunidades.

Dessa forma, senhor presidente, exigimos atendimento imediato a estas demandas que recolhem o sentimento, as necessidades e a própria esperança dos nossos povos por dias melhores, cuja saúde não pode mais depender das determinações de gente que na maioria dos casos não conhecem em absolutamente nada as nossas realidades e necessidades. A nossa saúde tampouco pode ser prejudicada por indefinições políticas, tramitações burocráticas e ineficiências no cumprimento dos compromissos pactuados com as organizações indígenas conveniadas.

O não atendimento destas demandas, senhor presidente, implicará na responsabilização da FUNASA, pelas conseqüências irreparáveis, como mortes e epidemias, que ameaçam a integridade e continuidade física e cultural dos nossos povos.

Esclarecemos, finalmente, que ocupamos a sede da FUNASA em Manaus de forma pacífica, com a única intenção de chamar a FUNASA para que assuma de fato as suas responsabilidades, nos termos do Decreto 70, garantindo ao mesmo tempo condições para que as organizações conveniadas, como a COIAB, cumpram devidamente o seu papel, desenvolvendo sem empecilhos as ações complementares. Que a FUNASA proceda com urgência a resolver o estado de calamidade pública em que está a saúde indígena no Distrito Sanitário Especial Indígena de Manaus (DSEI/Manaus) e nos outros Distritos em que estão envolvidos outras organizações indígenas representativas dos nossos povos.

Manaus, 16 de dezembro de 2004.

Abaixo assinamos:

LIDERANÇAS INDÍGENAS (aldeias e centros urbanos)
COIAB
FOIRN
FOCCIT
CGTT
OPIMP
UNI-TEFÉ
CIVAJA
CGTSM
CIM

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