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RAPOSA SERRA DO SOL - CIR lança campanha e faz carta ao STF

Folha de Boa Vista
Autor: Andrezza Trajano
29 de Abr de 2008

As cinco principais lideranças indígenas da terra indígena Raposa Serra do Sol concederam entrevista coletiva à imprensa ontem, na sede do Conselho Indígena de Roraima (CIR), para um pronunciamento oficial sobre os conflitos registrados na região no início do mês e quanto à expectativa do julgamento dos méritos das ações que contestam a demarcação, que tramitam no Supremo Tribunal Federal (STF).

Sentados a uma mesa forrada com uma toalha pintada pelos índios, onde os nomes de todas as comunidades indígenas da Raposa Serra do Sol estão bordados, as lideranças receberam a imprensa.

Além da pauta programada, eles falaram sobre mineração em terra indígena, perspectivas de desenvolvimento e cobraram a saída imediata da reserva dos habitantes não-índios, que consideram "invasores". Também apresentaram uma carta que deverá ser entregue ao STF nos próximos dias, como forma de sensibilizar a instituição para uma decisão "rápida e justa" para os índios, além de falarem sobre campanha que vão desencadear em favor da homologação intitulada "Anna Pita Anna Yan - Nossa Terra, Nossa Mãe".

Com opiniões unânimes, o coordenador de projetos do CIR, Júlio Macuxi, o coordenador de projetos da região das Serras, Jaci José de Souza, e os coordenadores regionais do Surumu, Walter de Oliveira, da Raposa, Clodomir Malheiro, e do Baixo Cotingo, Nelino Galé, disseram não aceitar nenhuma redução da área territorial da Raposa Serra do Sol.

O primeiro a falar foi o coordenador regional de Surumu, Walter Oliveira Segundo ele, o impedimento da retirada dos "invasores" da reserva, com a suspensão da operação Upatakon 3 pelo STF, causou uma preocupação entre os povos indígenas que exigem o cumprimento do decreto presidencial, onde a terra indígena é de usufruto exclusivo dos índios.

Ele disse não haver discussões quanto aos limites da reserva. "Não aceitamos reduzir nem negociar a nossa terra. O que tinha de ser feito já foi feito e negociado, nem um palmo de terra mais", disse.

Oliveira criticou o olhar da sociedade roraimense sobre a política indigenista. Disse que a discussão em torno das terras indígenas é sempre negativa e que, portanto, continuarão por seus direitos garantidos na Constituição Federal. "Somos todos iguais, todos brasileiros, com exceções das diferenças étnicas-culturais", afirmou.

Ao ter a palavra, Galé também ponderou sobre a permanência dos moradores não-índios na terra indígena. "Pode passar milhares de anos, mas nós somos dali e vamos ficar. Vão sair os arrozeiros e vamos tirar os não-índios que vivem ali como manda a lei".

O coordenador regional da Raposa Serra do Sol, Clodemir Malheiro, criticou a classe política de Roraima, que ele disse ser contrária aos povos indígenas. "O senador Romero Jucá [PMDB] falou de deixar algumas áreas fora da homologação, o que não aceitamos. Mas eles [políticos] só lembram da gente na época da eleição", criticou.

O líder indígena Jaci destacou a economia dos povos indígenas, principalmente a pecuária, onde os mesmos possuem 35 mil cabeças de gado. Ele também ressaltou que a entrada na terra indígena se fará, a partir de ontem, por meio de autorização das lideranças indígenas. "Aprendemos com vocês [não-índios]. Quando vamos entrar em qualquer lugar em Boa Vista precisamos de autorização", justificou.

A informação foi confirmada por Júlio Macuxi, ao apresentar uma carta que será entregue à população e ao Supremo, para que o subsidie com informações na hora de julgar o mérito das ações que tramitam no Supremo. Também foi apresentado um memorial com uma retrospectiva da homologação da terra indígena Raposa Serra do Sol. Esses dois documentos fazem parte da campanha desencadeada pelos indígenas em favor da homologação, intitulada "Anna Pita Anna Yan - Nossa Terra, Nossa Mãe".

O item de número cinco desta carta faz alusão ao que foi dito por Jaci e estipula a data de ontem como marco da questão. "Estamos exigindo o cumprimento do artigo 5o da Portaria do MJ no 534 de 13 de abril de 2005, que proíbe o ingresso, trânsito e a permanência de pessoas ou grupos de não-índios dentro da nossa terra sem nossa autorização", diz a carta.

Júlio Macuxi acrescentou que o desenvolvimento indígena não recebe incentivos do Estado, embora ele tenha total contribuição com a economia local. Sobre as declarações feitas pelo comandante da Amazônia, general Augusto Heleno, "de que a política indigenista brasileira é lamentável, para não dizer caótica", afirmou que os indígenas contribuem com o Exército para manutenção da fiscalização nas faixas de fronteiras.

"Existem diversos pelotões de fronteiras nas terras indígenas e os deixamos lá, porque além de parceiros na vigilância, queremos que eles cumpram com a sua missão constitucional. Além do mais, eles têm indígenas nossos como soldados em todos os pelotões, já que não adianta trazer apenas gaúchos para trabalhar na selva amazônica", disse.

Conforme o líder indígena, o general Heleno teria faltado com a ética ao dizer que a homologação da Raposa Serra do Sol traz risco à soberania. "É dizer que o Exército não está fazendo nada. Ele está criticando a própria instituição", declarou.

Ele ainda acrescentou que tal afirmação "é uma discriminação aos povos indígenas, um crime de racismo".

MINERAÇÃO - Um ponto discutido na coletiva foi sobre a mineração nas terras indígenas, veemente aceita por Júlio Macuxi, embora exista uma insatisfação com a demora na aprovação de um projeto pela Câmara Federal.

"Queremos que seja aprovado um Estatuto Indígena que regulamenta a exploração das riquezas minerais, dos nossos recursos hídricos e que contempla outras áreas como educação e saúde. Não queremos ganhar migalhas de royalties, queremos vender o nosso produto ao Brasil. Também não queremos ganhar migalhas de royalties com a construção da hidrelétrica de Cotingo. Temos condição de construí-la e de vender energia ao Estado".

Ao finalizara coletiva, Júlio Macuxi falou sobre a presença de ONGs na terra indígena. "Quem controla a entrada de pessoas no Brasil é a Polícia Federal, mas entendemos que os movimentos sociais existem, e nada mais justo que as comunidades indígenas tenham os seus", frisou.

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