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Rap de aymaras bolivianos destila raiva

FSP, Mundo, p.A10
27 de Mai de 2005

Jovens indígenas da cidade de El Alto adotam música agressiva americana para atacar políticos
Rap de aymaras bolivianos destila raiva
Juan Forero
Do "New York Times"
El Alto é uma cidade que fica numa região exposta aos fortes ventos das altas planícies da Bolívia e onde vivem cerca de 800 mil índios. Foco histórico de tensões sociais, é um local isolado onde se fala o dialeto aymara e as famílias descansam ouvindo antigas músicas dos Andes- sons de flautas e gaitas. Em outras palavras, não é um lugar onde se imagina que poderia surgir uma próspera e politicamente agressiva cultura de rap.
Mas El Alto está fervilhando, e um número cada vez maior de jovens aymaras está expressando sua insatisfação através do rap. As letras das músicas criticam os líderes bolivianos e falam sobre as péssimas condições sociais do país.
Adotando os típicos trajes da cultura hip-hop norte-americana, os jovens índios usam calças largas e bonés de beisebol, gesticulam constantemente com as mãos ao falar e seu vocabulário é cheio de gírias.
A maior inspiração desses rappers, no entanto, vem da história da Bolívia: a renúncia do presidente Gonzalo Sánchez de Lozada, em outubro de 2003, motivada pelos protestos nos quais 60 índios foram mortos; a briga pelas reservas de gás do país; a indignação com a ajuda financeira dos EUA para erradicar a coca; e a extrema pobreza da região.
"Temos uma música sobre o "Outubro Negro'", diz Abraham Bojorquez, 22, o líder de um grupo chamado Clandestinos. "Nossas canções são revolucionárias. Protestamos sem passeatas ou greves. Fazemos nossas manifestações através da música para alcançar o maior número possível de pessoas."
Na canção "Jichaw"- que em aymara quer dizer "agora"- o refrão capta o entusiasmo do movimento: "Agora somos nós que falamos/Agora eles nos conhecerão/Agora nós nos levantaremos." As letras misturam um forte amor pela Bolívia com um sentimento de raiva em relação a seus opressores e exploradores- tanto bolivianos como estrangeiros.
A canção "As Pessoas Não Caem", composta por Bojorquez, tenta mostrar a violência com que o Estado tem tratado os indígenas ao longo dos anos. A música fala com desprezo do ex-presidente Lozada- conhecido pela população como "Goni"- e condena a venda do gás natural boliviano a estrangeiros.
"Goni, inepto, as pessoas querem gás/As pessoas querem paz/Goni, entenda, nosso gás não está à venda/Porque as pessoas dependem da democracia/ Elas exigem seus direitos", diz a letra.
Divulgação em rádio local
Com pouco dinheiro e nenhuma experiência comercial, os rappers em El Alto divulgam suas músicas na rádio local Wayna Tambo, que dedica parte de sua programação aos novos artistas. Os rappers cantam, entrevistam pessoas da mundo hip-hop e falam de política.
Um dos discos mais conhecidos, o ""Wayna Rap", foi pirateado por milhares de pessoas em toda a Bolívia. "Não quero viver do hip-hop", diz Gover Canavari, 23, um dos autores. "Não me importa se minha música é pirateada. O dinheiro não é importante. O que queremos é mandar nossas letras para que elas possam influenciar as pessoas."

FSP, 27/05/2005, p. A10

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