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Quanto custa a energia?

O Globo, Opinião, p. 19
Autor: MALTA, Sérgio
10 de Jan de 2014

Quanto custa a energia?
A tarifa de energia elétrica que a indústria paga no Brasil não é uma das mais caras do mundo -pelo contrário, é uma das mais baratas

Sérgio Malta

O setor industrial é o segmento econômico que mais consome energia elétrica, representando cerca de 40% do consumo total do Brasil. No país a demanda de energia elétrica das indústrias é abastecida pelo mercado cativo, que atende a 34% do consumo da indústria, através das empresas de distribuição e pelo mercado livre, que atende aos grandes consumidores responsáveis por 66% do consumo industrial total. No mercado cativo, o governo, através da Aneel, faz um controle minucioso dos custos de cada distribuidora para que a tarifa tenha um valor adequado. Já no mercado livre prevalece o livre jogo das forças de mercado na fixação das tarifas.
Recentemente a Firjan publicou o estudo "Quanto custa a energia elétrica para a indústria no Brasil?", indicando que o setor industrial brasileiro estaria pagando quase R$ 292,80 por MWh e que, entre 27 países selecionados aleatoriamente, o Brasil estaria com a 11o tarifa mais cara. Estudos desse tipo são importantes por se tratar de tema que afeta o bem-estar e a competitividade dos países. O problema é que nesses estudos os critérios e procedimentos metodológicos têm que ser muito consistentes, pois do contrário chega-se a conclusões erradas que podem, até, levar a ações e políticas equivocadas e sem fundamento.
Infelizmente, este é o caso do estudo da Firjan, pois a tarifa de R$ 292,80 só atinge uma pequena parcela do consumo industrial de eletricidade, que não representa a média do setor. Os equívocos metodológicos são graves e de dois tipos. Primeiro, o cálculo da tarifa de R$ 292 não considera os valores que são praticados no mercado livre, onde as tarifas são bem menores, estando, segundo especialistas, abaixo de R$ 150 para contratos de mais de um ano. A tarifa da Firjan está 95,2% mais cara! Como o mercado livre supre 66% do consumo industrial de eletricidade, não considerar a tarifa bem menor que é praticada nesse mercado é um erro grave que vai distorcer as conclusões do estudo da entidade. Segundo, a tarifa média de R$ 292 do mercado cativo refere-se somente a um único nível tarifário: A4, modalidades verde, azul, convencional, justamente o mais caro! A tarifa média de todos os níveis da indústria de janeiro a setembro de 2013 foi de R$ 220,97. Ou seja, a tarifa "calculada" pela Firjan está 32% maior do que a tarifa média industrial publicada pela Aneel.
Desta forma, o estudo da Firjan superestima o valor médio da tarifa industrial brasileira. E a partir daí comete outro erro elementar que é o de compará-la com outros 27 países cujos valores foram calculados com base em metodologia da IEA (Internacional Energy Agency), que considera a média industrial, e não um consumidor específico (A4), como faz a Firjan. Em síntese, a Firjan está comparando valores que expressam realidades totalmente diferentes, dado que os critérios e fundamentos metodológicos não são os mesmos.
Ou seja, se examinarmos somente o mercado industrial cativo, a tarifa industrial média que prevaleceu em 2013, de R$ 220 MWh, colocaria o Brasil com a 12ª mais barata. Isto, sem considerar que mais da metade do consumo industrial é fornecida no mercado livre por um preço ainda inferior ao do mercado cativo.
Ao contrário do que diz o estudo da Firjan, a tarifa de energia elétrica que a indústria paga no Brasil não é uma das mais caras do mundo - pelo contrário, é uma das mais baratas do mundo!
Energia boa e barata é fundamental para garantir a atividade econômica e o bem-estar das famílias. Por ser uma atividade complexa e que envolve investimentos de longo prazo é necessário definir tarifas justas para remunerar os investimentos e ao mesmo tempo garantir a oferta desse insumo com qualidade, quantidade e preço de equilíbrio. Buscar esse equilíbrio exige estudos rigorosos e com critérios metodológicos consistentes. O excelente Departamento de Estudos da Firjan, neste caso, errou.

Sérgio Malta é presidente do Sinergia e conselheiro
da Firjan

O Globo, 10/01/2014, Opinião, p. 19

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