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Qual é o motivo de tanta cobiça?

CB, Brasil, p. 12
22 de Abr de 2005

Qual é o motivo de tanta cobiça?
São duas as hipóteses mais prováveis para a coleta ilegal de sangue de índios suruí e karitiana: estudar a resistência das etnias a doenças ou entender a trajetória feita pelo homem primitivo até chegar às Américas

Leonel Rocha
Da equipe do Correio

Para que serve uma dose de DNA de índio, que está sendo oferecida na Internet pela empresa norte-americana Coriel Cell Repositories, de Nova Jersey, instituição independente de pesquisa, ao módico preço de US$ 85, o equivalente a R$ 212,50? Esta é a pergunta que o Ministério Público (MP) e a Polícia Federal terão que responder ao final da investigação para saber como e quem são os responsáveis por este crime. O estudo do DNA dos índios suruí e karitiana pode descobrir por que as duas tribos são resistentes a doenças como hepatites de todos os tipos, por exemplo. E esta descoberta terá valor incalculável. A transação é bastante simples, e o interessado, na hora de encomendar a amostra, ainda poderá optar pelo sexo e idade do doador. Além do DNA verde e amarelo, o comprador pode escolher se quer doses da seqüência genética de tribos peruanas e mexicanas.
Na próxima quarta-feira, a CPI da Biopirataria vai ouvir o procurador federal de Rondônia, Reginaldo Pereira da Trindade, responsável pela ação civil pública impetrada pelo MP, para tentar esclarecer a retirada do sangue dos índios e o envio clandestino do material para o laboratório da Universidade Federal do Pará.
Deputados da CPI da Biopirataria também investigam outras razões para tanto interesse internacional pelo DNA dos índios.
Entre elas, segundo o deputado Mendes Thame (PSDB-SP), presidente da comissão, está a hipótese de que o DNA humano com as características encontradas entre os suruí e os karitiana possa revelar traços genéticos do homem pré-colombiano. É uma linha de investigação que está sendo examinada pelos pesquisadores da Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).
Quebra-cabeça
Por esta hipótese, as características do DNA dos índios brasileiros poderiam ajudar a fechar o quebra-cabeça sobre a chegada do homem primitivo às Américas.
Se algum pesquisador que comprar o DNA dos suruí e karitiana e descobrir os mesmos traços genéticos de antigas tribos nômades da Europa e da Ásia, pode concluir que os antepassados europeus e asiáticos chegaram às Américas pelo Alasca. Esta constatação mudaria teses e linhas de estudos da antropologiae até da geografia. Em 2003, uma delegação indígena da etnia katukina reivindicou ao Ministério do Meio Ambiente os direitos de propriedade sobre o princípio ativo da secreção do sapo kambo. O pedido foi encaminhado ao Ibama e ao Conselho Genético, responsável pelo regulamento da bioprospecção e o acesso aos recursos naturais. Outras comunidades indígenas também fizeram pedidos idênticos.
Projeto genográfico
A IBM e a National Geographic lançaram há duas semanas o Projeto Genográfico www.nationalgeographiccom/genografic) que, através de dez centros de pesquisa no mundo, irão coletar durante cinco anos DNA de povos indígenas. O objetivo é tentar mapear a história das migrações humanas desde 100 mil anos atrás, quando se estima que a espécie tenha surgido na África. A CPI da Pirataria vai tentar esclarecer quem terá acesso às informações genéticas obtidas com as amostras? As pessoas serão identificadas? Essas informações poderão ser usadas comercialmente ou gerar patentes? As comunidades indígenas serão consultadas?
Há 15 anos, o Projeto Diversidade do Genoma Humano, lançado pelo grande geneticista italiano Luca Cavalli-Sforza, e que tinha praticamente os mesmos objetivos, foi abortado devido a pressões de antropólogos e ambientalistas.
Ficou conhecido como "projeto vampiro". Segundo o deputado Mendes Thame, os atuais coordenadores do Projeto Genográfico, Spencer Wells (USA) e Fabrício Santos (UFMG-Brasil), aprenderam a lição e tomaram as cautelas necessárias disponibilizando uma página de perguntas e respostas sobre o assunto onde as questões mais polêmicas não foram escamoteadas.

CB, 22/04/2005, Brasil, p. 12

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