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Projetos do governo na Amazônia têm oposição de ambientalistas

Valor Econômico, Especial Amazônia, p. F6
05 de Set de 2024

Projetos do governo na Amazônia têm oposição de ambientalistas
Para críticos, planos de asfaltar rodovia, construir ferrovia e extrair petróleo trazem riscos à floresta

André Borges

05/09/2024

Cinquenta anos depois do plano desenvolvimentista dos militares, que avançaram sobre a Amazônia com estradas e hidrelétricas prometendo "integrar para não entregar", e deixaram um rastro de desmatamento e ocupações irregulares, a região continua a ser alvo de projetos que, para ambientalistas, são capazes de fragilizar ainda mais a floresta. Na área de logística, os planos federais incluem a pavimentação da BR-319, eque liga Porto Velho (RO) a Manaus (AM), e a construção da Ferrogrão, ferrovia de 900 quilômetros de extensão que ligaria Sinop (MT), região que é a maior produtora de grãos no país, ao porto de Miritituba (PA), área historicamente conhecida pelo garimpo ilegal.

Para defender a retomada da estrada, o governo argumenta que a BR-319 já esteve ativa até início dos anos 1980, mas que foi abandonada e engolida pela floresta, deixando Manaus isolada por via terrestre do restante do país. Sua pavimentação seria, portanto, a garantia do direito de ir e vir da população local. Ambientalistas afirmam, porém, que a pavimentação da rodovia carrega os mesmos problemas já vistos em outras estradas, como a BR-163, no Mato Grosso, que impulsionou a abertura de vicinais em seus mais de mil quilômetros, gigantescas "espinhas de peixe" para saquear madeira.

No caso da Ferrogrão, defensores do projeto afirmam que a estrada de ferro seria construída ao lado da BR-163, reduzindo o impacto ambiental sobre a floresta, consolidando uma nova rota de escoamento de grãos rumo aos portos do Arco Norte do Brasil e desafogando os terminais portuários de Sudeste e Sul. Críticos ao projeto afirmam, porém, que a ferrovia teria um impacto direto em áreas extensas de unidades de conservação ambiental, além de afetar terras e povos indígenas.

Se na área de mineração o problema histórico é a profusão do garimpo ilegal, projetos bilionários de exploração fóssil também rondam o futuro da Amazônia, seja na retirada de gás ou de petróleo. No subsolo de Coari (AM), onde a Petrobras já extrai óleo desde a década de 1980, está a maior jazida de petróleo terrestre do Brasil. Na região de Silves, pequeno município do Amazonas, poços de gás são explorados há mais de três anos, em meio a conflitos com povos indígenas.

É do mar, porém, que vem a maior preocupação dos ambientalistas atualmente, com os planos da Petrobras de explorar petróleo em área próxima à foz do rio Amazonas. "Deve ser destacado que não é a renda do petróleo e de outras fontes fósseis que vai resolver os problemas amazônicos. Esse tipo de exploração só traz mais concentração de renda, com injustiça social e intensificação dos problemas climáticos", diz Suely Araújo, coordenadora de políticas públicas do Observatório do Clima.

Em Coari, a situação do município que explora petróleo há quase 40 anos é de extrema precariedade, com falta de saneamento básico e emprego e altos índices de violência. Em Silves, o que se vê no município é falta generalizada de infraestrutura. As evidências revelam que os cobiçados royalties do petróleo e do gás, fator financeiro que costuma justificar a exploração desses insumos, não se traduzem em melhoria das condições de vida da população local.

"As ameaças estruturais precisam ser globalmente enfrentadas e o Brasil pode fortalecer o seu protagonismo se, além de reduzir o desmatamento, liderar negociações internacionais para pactuar um cronograma para a redução na produção e no consumo de petróleo, compatível com as exigências da emergência climática", diz o sócio fundador e presidente do Instituto Socioambiental (ISA), Márcio Santilli. "A maior ameaça local à Amazônia continua sendo a ocupação e a exploração predatória do território e dos recursos naturais, que impede o desenvolvimento de uma economia sustentável. Isso requer consciência política."

O presidente do Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental (Proam), Carlos Bocuhy, lembra que a "consciência política" também passa pela garantia de uma estrutura adequada para fiscalização, licenciamento e monitoramento ambiental.

"Foi restabelecida a vontade política de proteger a floresta, o que é obrigação do governo. Mesmo assim, a resposta poderia ter sido mais efetiva se o governo tivesse equacionado devidamente as pendências com os quadros funcionais do Sistema Nacional do Meio Ambiente [Sisnama], estabelecendo plano de carreira, salários condignos e complementação dos quadros funcionais do Ibama e do ICMbio", diz Bocuhy. "É preciso aumentar a capacidade de recursos humanos e operacionais."

Valor Econômico, 05/09/2024, Especial Amazônia, p. F6

https://valor.globo.com/publicacoes/especiais/amazonia/noticia/2024/09/…

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