Boletim da AVA, v. 1, n. 1, p. 8-12
31 de Mar de 1995
Projeto fronteiras do PIX
Expedições de perenização
No mês de novembro passado, foram realizadas duas expedições de perenização de trechos da picada demarcatória do PIX, com a coordenação das atividades assumidas pelos próprios índios, os quais também colocaram a disposição seus barcos, motores e equipamentos.
Nas expedições aos trechos na área de influência do Posto de Vigilância Pachiku estiveram envolvidos índios Kayabi, Juruna e Suyá, e na do Posto de Vigilância Kurizevo índios Meinako. Nestes Postos, foram plantados os trechos da picada reabertos na expedição de reaviventação de agosto de 94, totalizando 100 km de fronteira.
Foram plantadas sementes coletadas previamente ( macaúba, tucum, inajá, jatobá, pequi, mangaba ), bem como transplantadas mudas crescidas próximas a picada demarcatória, principalmente da palmeira buriti nos locais alagados da picada. O engajamento dos índios na realização destas expedições demonstra a sua disposição de testarem todas as alternativas de controle do seu território.
Capacitação
Realizou-se no Posto Indígena Diauarum, entre 27.11 e 01.12. 94, o Encontro/Curso de Capacitação do Projeto Fronteiras para os chefes e equipes dos Postos de Vigilância.
Com os dados obtidos pelas diferentes instituições e comunidades indígenas ao longo dos 3 anos de atividades deste Projeto, montou-se um diagnóstico atualizado da situação das fronteiras do PIX, que permitiu a elaboração de um plano preliminar de monitoramento e vigilância das fronteiras do PIX, o qual definiu os procedimentos legais e específicos às várias situações encontradas nos diversos trechos da fronteira. Buscou-se ainda definir as responsabilidades e atribuições de cada instituição e comunidade envolvida no Projeto.
0 Encontro/Curse contou- com-a participação do administrador do PIX Megarom Txucarramãe, de todos os chefes dos Postos Indígenas e de Vigilância e lideranças representativas do PIX, dos técnicos de projeto da AVA, do antropólogo Jorge Bozobom da Coordenação Geral de Projetos Especiais - CGPE/FUNAI, dos indigenistas André Villas Boas e cartógrafo Sérgio Mauro do Instituto Socioambiental, e do indigenista Ariovaldo José dos Santos e Will Sellert do Programa de Desenvolvimento Agroambiental do Estado de Mato Grosso - PRODEAGRO/ PNUD.
Deste modo foi atingido um dos objetivos da reunião, que é o envolvimento do PRODEAGRO/ PNUD a fim de garantir os recursos para o financiamento das experiências de perenização das picadas, da manutenção da infra-estrutura dos Postos de Vigilância e das ações urgentes de vigilância estabelecidas ao final do Curso. Tais recursos são vultosos para qualquer ONG, e enquadram-se nas típicas atribuições constitucionais do Estado, que neste caso raro serão cumpridas devido aos recursos disponíveis do Banco Mundial.
Levantamento de dados e mapeamento.
Em 12.09.94, realizou-se na sede o ISA - São Paulo, a reunião dos avaliadores do FrontPix, que é o componente de levantamento de dados e mapeamento do Projeto Fronteiras da AVA, executado pelo ISA através de convênio. Com a participação dos staffs de ambas instituições, reuniram-se os seguintes profissionais: Sociólogo Alfredo Wagner - avaliação do levantamento socioeconômico da fronteira oeste do PIX, Cartógrafo Calle Hedberg - aval: ação do sensoriamento remoto e cartografia,
Antropóloga - Tânia Stolze - avaliação da aplicação prática dos conhecimentos gerados pelo ISA nas atividades do projeto desenvolvidas pela AVA, e da aceitação/entendimento destes conhecimentos pelos índios.
O Instituto Socioambiental - ISA está finalizando o mapeamento d fronteira leste, sendo que a AVA j repassou todos os recursos previsto no orçamento de 1994 do projeto par esta atividade. Como não serão feito levantamentos de campo, como n, fronteira oeste, e empregadas somente a Base Cartográfica da região IBGE e DSG) e fotos de satélite, espera-se que o resultado esteja dispo nível para a nova reunião do grupo que, finalizará a discussão das atribuições e compromissos a serem assumido pelas diversas partes envolvidas, i definirá os recursos disponíveis e c planejamento das ações integrada: para 1995, levando em conta as pro postas da avaliação considerada: como de implantação factível e imediata.
Projeto de educação
Após o II Curso de Formação de Professores no mês de outubro/94, o professor Loyke Kalapalo foi designado como assessor permanente do projeto, para efetuar o trabalho de coordenação de campo na área do Alto Xingu. Residindo permanentemente na aldeia Tanguro, o professor Loyke tem acompanhado sistematicamente as atividades escolares e pedagógicas nas escolas em funcionamento naquela área do PIX.
No período de 30/01 a 01/02/95, realizou-se a reunião da equipe coordenadora do Projeto de Educação para discussão da produção de material didático, metodologias de alfabetização, e planejamento das atividades para 1995. Esta reunião contou com a participação da Prof Dra. Silvia Braggio, sociolingüista da Universidade Federal de Goiás -UFG, especialista em metodologia pedagógica de alfabetização indígena.
O Curso ocorrerá simultaneamente nos P.1. Diauarum e P.I. Pavuru, entre os dias 06.04 a 10.05.95, e constará dos seguintes módulos com cinco dias de duração cada um: Geografia, História, Línguas Indígenas, Matemática e Língua Portuguesa.
Com o avanço do processo educacional no Parque Indígena do Xingu - PIX possibilitado pelo Projeto, a sua coordenadora Antropóloga Monica Pechincha foi contactada pelo consultor do PNUD/Estado de Mato Grosso para educação indígena - Darci Sechi, que ao tomar conhecimento das atividades educacionais desenvolvidas pela AVA no PIX , reuniu-se com a equipe do projeto em Brasília, para discussão conjunta da inclusão do PIX na proposta de educação indígena para o Estado de Mato Grosso em elaboração pelo novo Governo estadual.
Projeto apoio aos transportes no PIX
Oficina escola
Estágio de formação
Em novembro/dezembro de 94, o aprendiz Nikrakaisse Suyá realizou dois importantes estágios para sua formação em mecânica e manutenção de barcos e motores. Em São Paulo capital, "Nikrá" estagiou por um mês nas oficinas da Motonáutica, uma das maiores oficinas de motores de popa do país. Em seguida, estagiou em um conceituado estaleiro de Ubatuba - litoral paulista, sob a supervisão do consultor do projeto Engenheiro Naval Lars Paust, onde trabalhou por uma semana em reformas e calafetagem de embarcações de madeira.
Consultoria
Entre os dias 15.11 e 16.12.94, o Eng. Naval Lars Paust viajou entre os Postos Indígenas Diauarum, Pavurú e Leonardo, conhecendo a realidade fisica e cultural do PIX, e realizando um levantamento das embarcações e motores lá existentes. O contato com a realidade do PIX possibilitou ao consultor formular importantes propostas para o currículo dos cursos/estágios de formação de monitores mecânicos e para o planejamento das atividades da Oficina Escola e da lancha Kaytuká.
Com base nos barcos, motores e equipamentos existentes o consultor formulou ainda propostas preliminares para um sistema integrado de transportes no PIX adequado às condições ambientais, sociais e econômicas dos povos xinguanos, com a perspectiva de gradualmente eles mesmos assumirem a sua operação e manutenção.
Inauguração da oficina escola
Encontra-se concluído e equipado o prédio da Oficina Escola no Posto Indígena Diauarum. Como atividade comemorativa de inauguração, a AVA vai realizar, no período de 28/03 a 10/ 04, um workshop coordenado pelo consultor do projeto - Eng. Naval Lars Paust e pelo mecânico instrutor da oficina escola Sr. Duquinha. O workshop constará de três oficinas para treinamento de 6 índios cada uma nos seguintes temas : Técnicas e Regras de Navegação Fluvial, Mecânica de Motores de Popa, e Reforma e Manutenção de Embarcações de Madeira.
Neste período, a AVA e o consultor do projeto apresentarão para discussão com as comunidades xinguanos as propostas resultantes de sua viagem pelo PIX acima mencionadas.
Lancha Kaytuká
Em sua viagem pelo PIX, após realizar um completo exame do casco, motor, desempenho e capacidade de carga da Kaytuká, o consultor concluiu pela sua adequação ao serviço que executa no PIX, e deixou uma série de instruções para a sua retirada da água e reforma no próprio PIX com baixo custo. Sob a direção do instrutor mecânico Sr. Duquinha e seu aprendiz Nikrákaisse Suyá, a reforma da kaytuká será a principal atividade da oficina Reforma e Manutenção de Embarcações de Madeira do workshop de inauguração do prédio da Oficina Escola.
O Projeto Lancha Kaytuká entrou em seu quinto e último ano, e encontra-se em período de transição com a perspectiva de repassar para as comunidades xinguanas a operação e manutenção da Kaytuká. Neste período, a AVA continuará fornecendo uma cota mensal de combustível /lubrificante e alimentação para a tripulação, e executará a reforma acima mencionada.
Projeto Panará
Após as expedições Panará de junho a agosto do ano passado à aldeia nova em seu território imemorial, três novos acontecimentos deste projeto merecem destaque, a saber:
Reunião geral com os Panará
Devido aos problemas ocorridos com jagunços de grileiros na última expedição, conforme noticiado no número zero desta publicação, e ainda ao posicionamento contrário de lideranças do PIX à mudança dos Panará, a AVA atendendo sua solicitação, apoiou a realização de uma reunião geral , para juntamente com os Panará discutir a questão. Esta reunião ocorreu na aldeia panará, nos dias 24,25 e 26.11.94.
Participaram da reunião, além dos Panará e do staff da AVA , diversas lideranças do PIX e profissionais que acompanham a trajetória Panará desde sua remoção para o PIX. Entre eles temos o Administrador do PIX Megaron Txucarramãe, os antropólogos Ezequias Heringer, Olympio Serra e Steve Schwartzman , e o indigenista André Vilas Boas pelo Instituto Socioambiental.
Após três dias de discussões, onde todos colocaram os seus prós e contras a mudança, os Panará oficialmente reafirmaram sua decisão soberana e majoritária de retomar ao seu antigo território, marcando outra expedição à nova aldeia ainda no mês chuvoso de fevereiro , para acelerar os trabalhos de conclusão de sua infra-estrutura. Nesta expedição, pretendem levar um efetivo maior de homens , aproveitando a melhor navegabilidade do rio Iriri, que dá acesso ao local, neste período chuvoso.
Este posicionamento dos Panará frente às demais tribos e a sociedade nacional revela a evolução de sua reafirmação étnica , após vinte anos de sua transferência, período marcado por um penoso processo de reconstrução social e posição desconfortável no contexto político interno do PIX.
Encaminhamento administrativo
Este aspecto é fundamental para a AVA, pois garante o embasamento legal para as aspirações e ações dos Panará, uma vez tratar-se de matéria polêmica, e a região muito conturbada.
A FUNAI publicou no Diário Oficial da União, de 14.12.94, portaria de seu Presidente apresentando as conclusões do grupo de trabalho criado para realizar a identificação do território reivindicado pelos Panará. Deste modo, foi iniciado o longo trâmite burocrático que toda terra indígena deve percorrer até seu reconhecimento oficial e definitivo pelo Estado Brasileiro com a homologação da demarcação pelo Presidente da República. O território Panará identificado, com 488.000 ha remanescentes de sua imensa área original, foi encaminhado para o Ministério da Justiça para a ,provação da delimitação e autorização para a demarcação física, primeiros passos do reconhecimento oficial.
Um fato crucial que advém deste novo status é a -possibilidade da comunidade requerer à FUNAI, Polícia Federal, Ministério Público Federal, entre outros órgãos, proteção e assistência em seu processo de retorno ao seu antigo território, pondo fim a vinte anos de exílio forçado.
Nova ação judicial
Em 19.12.94, a comunidade Panará, através de procuração outorgada ao Núcleo de Direitos Indígenas, entrou com nova Ação Judicial na 7 Vara da Justiça Federal em Brasília contra a União Federal, desta vez requerendo indenização em dinheiro para os danos materiais e morais sofridos em todos estes anos de remoção e exílio forçado no PIX. Na estratégia jurídica de apoio às reivindicações dos Panará,a Ação Declaratória contra a União Federal, a Funai e o Incra para recuperação da porção preservada de seu território, iniciada em agosto / 94, deveria preceder a de reparação de perdas e danos, tanto devido às invasões e à reação dos grileiros de terras da região, como para ter prioridade sobre qualquer outra ação movida pela União ou particulares relacionada com o território dos Panará. Isto vale dizer que outras ações subseqüentes devem ser anexadas à ação movida pelos Panará, que será sempre a primeira referência nesta causa junto a Justiça Federal.
Finalizada as medidas iniciais na Justiça Federal e na Funai /Ministério da Justiça, o projeto entra em nova fase, em que a campanha de divulgação junto a opinião pública nacional e internacional será crucial para o sucesso das iniciativas dos Panará em campo e dos processos administrativos e judiciais.
Boletim da Ava n. 1, Mar de 1995, p. 8-12
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