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Projeto de megaporto na Bahia invade área de proteção ambiental

OESP, Vida, p. A24
01 de Nov de 2008

Projeto de megaporto na Bahia invade área de proteção ambiental
Obras de complexo para escoamento de minério e grãos orçado em R$ 4 bilhões devem estar prontas em 2012

Tiago Décimo

Na terça-feira, em visita a Salvador, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou um protocolo de intenções para estabelecer procedimentos para a construção de uma das mais controversas obras de infra-estrutura previstas para os próximos anos no Brasil: o Porto Integrado Público de Ilhéus, município a 458 quilômetros ao sul da capital baiana - razão pela qual o projeto é conhecido como Porto Sul.

De acordo com o documento, o complexo ocupará área de 1.771 hectares na região conhecida como Ponta do Tulha, entre Ilhéus e Itacaré, e reunirá porto, aeroporto, rodovia, ferrovia, hidrovia, minerioduto e pólo industrial. Servirá, sobretudo, para o escoamento de minérios e grãos produzidos no Nordeste, Centro-Oeste e Sudeste com destino ao exterior. Os investimentos previstos são de R$ 4 bilhões, com conclusão das obras em 2012.

Segundo a Secretaria Especial dos Portos, a idéia é que o chamado sistema intermodal seja administrado por empresas privadas, por meio de concessão pública. "Devemos ter o modelo de concessão até o fim do mês", diz o titular da pasta, Pedro Brito.

A assinatura do protocolo reacendeu discussão que se arrasta há mais de um ano na região. "O complexo trará muito mais prejuízo que lucro à Bahia", sentencia o presidente da ONG Floresta Viva, Rui Barbosa Rocha. "Além de destruir uma das mais belas paisagens do litoral brasileiro, o Porto Sul vai causar impactos ambientais irreparáveis, como esgotamento dos recursos hídricos na região, poluição do ar e da água e desmatamento. Também vai prejudicar o desenvolvimento turístico da Costa do Cacau." De acordo com ele, o projeto inicial, de autoria do governo da Bahia, é ilegal porque prevê a ocupação de parte da Área de Proteção Ambiental (APA) da Lagoa Encantada, que abrange sete municípios. Além disso, contraria o plano diretor de Ilhéus, que delimita a área para uso apenas de empreendimentos turísticos e residenciais de baixa densidade.

"Ilhéus já tem um porto, que está com boa parte da capacidade ociosa", analisa. Para Rocha, o investimento poderia ser usado na consolidação de outros vetores do desenvolvimento econômico da região, como o cacau, o turismo e a indústria de informática. "São setores produtivos que têm mais relação com a região."

TURISMO

"Planos de investimento de R$ 4 bilhões em equipamentos turísticos nos próximos cinco anos, com criação prevista de 7 mil empregos na região, agora estão ameaçados", afirma o presidente da Associação de Turismo de Ilhéus (Atil), Luigi Massa. "Isso sem falar dos 140 empreendimentos já instalados na área, que podem ser profundamente afetados." Massa, ainda assim, considera justa a idéia de montar o complexo, mas lamenta a forma como o projeto é conduzido. "Os estudos foram feitos às pressas, não houve discussão com a comunidade."

"É preciso cumprir os trâmites com cuidado, pois é uma das áreas com maior biodiversidade do planeta", lembra. "Ao que sabemos, o porto terá como principal cliente a indústria de exportação do minério extraído em Caetité (município a 400 quilômetros, com solo rico em minério de ferro) e as jazidas de lá têm previsão de esgotamento em 25 anos. E depois?" Ele ainda ressalta que um porto de grande porte na região pode dar origem a grandes desastres ambientais.

AÇÃO CIVIL

Em fevereiro, o governo assinou decreto de desapropriação das áreas que farão parte do complexo. O documento causou reação imediata das ONGs ambientais atuantes na região e da Atil, que entraram com ação civil pública contra o ato, alegando ausência de estudos de impacto ambiental e de apresentação da proposta à comunidade. O Ministério Público Estadual analisa o caso.

"Desde o início do ano os investimentos estão completamente parados naquela área e os empresários não sabem como proceder", afirma Massa. Segundo ele, por causa da controvérsia, em julho, as associações ambientais e de turismo do município foram procuradas pelo governo estadual para uma reunião. "Fizemos apenas aquele encontro, no qual apresentamos nossas preocupações e não chegamos a um acordo. Depois, nunca mais fomos procurados", diz.

'É o preço do desenvolvimento'
Segundo a Secretaria de Indústria, Comércio e Mineração da Bahia, a localização do porto foi definida por estudos que levaram em conta questões como distância para o ponto de convergência dos equipamentos usados pelos outros meios de transporte abrangidos pelo complexo, como trens e caminhões, profundidade do calado e impacto ambiental.

"Será um hub logístico inédito no País', diz o superintendente de Comércio e Serviços do Estado, Antonio Celso Filho, coordenador do grupo de estudos para a construção do complexo.

"Estamos, neste momento, realizando estudos de pré-viabilidade ambiental', afirma. 'Só com base neles vamos determinar a posição exata em que vai ficar. Mas não existe desenvolvimento sem impacto ambiental.'

OESP, 01/11/2008, Vida, p. A24

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