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Produtos organicos conquistam mercado

OESP, Economia, p.B6
31 de Jul de 2005

Produtos orgânicos conquistam mercado
Grandes redes cedem cada vez mais espaço para produtos sem agrotóxicos
Vera Dantas
O apelo de produto saudável, livre de agrotóxicos, numa época em que a preocupação do consumidor com qualidade de vida é cada vez maior, abriu espaço para o aumento de vendas dos orgânicos nos supermercados. Grandes redes, como o Carrefour, registraram nos últimos dois anos um crescimento anual em torno de 30% dos produtos cultivados sem agrotóxicos. No Pão de Açúcar, em quatro anos as vendas triplicaram.
As empresas apostam muito no potencial do produto. Mas ressalvam que o crescimento ocorre em cima de uma base de consumo baixa e admitem que o preço mais alto dos orgânicos em relação ao produto convencional influencia na decisão de compra do consumidor.
O Carrefour nas próximas duas semanas começa a testar em quatro lojas uma área especial só para produtos orgânicos. Eles serão concentrados em uma única gôndola de 10 a 12 metros, com decoração diferenciada. Cada uma delas terá mais de 150 itens e alguns produtos poderão ser degustados. Se der certo a novidade será ampliada para a rede.
"Dependendo da loja, as vendas de frutas, verduras e legumes orgânicos já representam de 7% a 10% do faturamento da categoria", diz o diretor de Agronegócios do Carrefour, Arnaldo Eijsink. No concorrente Wal-Mart, as vendas dos mesmos produtos correspondem a 8% da categoria. A rede tem mais de 100 itens orgânicos entre produtos in natura, de mercearia e açougue.
Mas, por mais que o volume e a variedade aumentem, os orgânicos, observa Eijsink, sempre serão voltados para um nicho de mercado. Há barreiras para uma expansão muita acentuada. A primeira delas, e a mais mencionada por produtores e pelo varejo, é o preço.
A tecnologia para desenvolvimento dos orgânicos não é a mesma dos convencionais. O tempo de produção mais longo e a produtividade, mais baixa, encarecem o custo por metro quadrado. "A diferença de preço em relação ao produto convencional pode ser de 30%, 50% e até 100% em alguns casos", admite a gerente responsável pelas compras de hortaliças e frutas do Pão de Açúcar, Sandra Caires.
Ela acredita, porém, que os movimentos de valorização da vida mais saudável e de preocupação em preservar o meio ambiente influenciam o consumo em todas as classes sociais. "Mesmo a classe C compra alguns produtos", diz Sandra.
Há dois meses, os orgânicos entraram no supermercado CompreBem, mais voltado para o consumidor de menor poder aquisitivo. Das 164 lojas da rede, 42 já oferecem hortaliças e industrializados orgânicos. No Pão de Açúcar, todas as lojas comercializam esses produtos.
A falta de conhecimento é outro problema. "O consumidor desinformado vê, por exemplo, um pé de alface pequeno e mais caro e desiste da compra. Não sabe que o produto pode ser menor, mas é mais saboroso e saudável", compara Miguel Ferrari Stella, responsável por um estande de orgânicos na feira da Associação Brasileira de Supermercados (Abras), em setembro. É a primeira vez que a Abras destina um espaço especial para orgânicos na sua feira anual.

Feiras abrem novo canal de venda aos produtores
Agnaldo Brito
É madrugada. Adenilso Roncaglia está pronto para viagem de 100 quilômetros, até o Parque da Água Branca, em São Paulo. Rotina semanal, cansativa, mas compensadora. A principal feira de produtos orgânicos de São Paulo é um alento. Roncaglia é um pioneiro. Junto com o pai e o irmão, produz fruta numa pequena roça em Valinhos, na região de Campinas.
Detalhe: fruta orgânica, que, quando sobra, chega às gôndolas das grandes redes de varejo. Hoje, os principais inimigos, dizem os produtores, da expansão desse modo de produzir alimento. "A sobrevivência da agricultura orgânica brasileira está nos canais alternativos", assegura Roncaglia. Busca insistente por espaços menos hostis como os que existem nas grandes redes de varejo.
Produtor de morango, goiaba, figo, Roncaglia está satisfeito. O ganho é pouco, mas suficiente para garantir o sustento da toda a família. Não há produção que encalhe. Tem em mãos algo mais do que um produto plantado e cuidado sem uma gota de produto químico: oferta de qualidade a preço justo.
Fernando Ataliba, outro produtor de orgânicos na região de Campinas, com sítio em Indaiatuba (SP), tem exatos 20 hectares com hortaliças. Há 8 anos desistiu da agricultura convencional. Tem boa produção, mas enfrenta, além do problema da comercialização, outro desafio. Na região, a terra vale mais dividida em metros quadrados para loteamento do que o rendimento obtido em caixas de berinjela, abobrinha e tomate extraídos num hectare. O assédio imobiliário é gigantesco. Pois qual é a razão de manter a disposição de ser agricultor há 25 anos? Não é o dinheiro, responde.
A agricultura orgânica lhe dá o sustento. Garante a ele uma bela casa com decoração rústica de muito bom gosto, dois carros de meia vida e um trator de 1989. "Nada é fácil. Há muita fantasia sobre a produção de orgânicos e os produtores de orgânicos. Os problemas são os mesmos de um pequeno produtor", antecipa. Não é demanda, mas é comercialização. Praticamente toda a produção é entregue hoje às distribuidoras, as mesmas que negociam com as grandes redes do varejo. Sem escala e dependente de logística irremediavelmente cara, os orgânicos não têm alternativa senão criar novos canais de comercialização.

Exportar é a melhor saída
Alemanha, EUA e Japão são os maiores compradores
O mercado externo é o grande alvo dos produtores de orgânicos. Do total de US$ 200 milhões movimentados pelo setor no ano passado, U$ 140 milhões foram destinados à exportação, segundo levantamento da Associação Brasileira de Produtores e Processadores de Produtos Orgânicos (BrasilBio). A Europa, principalmente a Alemanha, seguida pelos Estados Unidos e Japão são os maiores compradores do mundo. Na lista de exportados estão café, cacau, açúcar, suco de laranja, frutas secas e tropicais, cereais e produtos de pecuária.
"De tudo que é consumido de verduras, frutas e legumes na Alemanha, cerca de 40% são orgânicos", diz Sandra Caires, que responde pelas compras do setor do Grupo Pão de Açúcar.
No Brasil, segundo o Ministério da Agricultura, existem cerca de 19 mil produtores e o número de certificações, expedidas por empresas que fiscalizam quem comercializa orgânicos, vem crescendo. De acordo com o Instituto Biodinâmico (IBD), maior certificador do País, o número de projetos certificados saltou de 94 em 2000 para 404 este ano.
A Native, certificada desde 1997 para vender açúcar orgânico, exporta 22 mil toneladas da sua produção de 25 mil toneladas. A marca é do Grupo Balbo, que tem as Usinas de São Francisco e Santo Antonio e produz 200 mil toneladas de açúcar por ano, sendo só 3 mil de orgânico para o mercado interno.
Além do açúcar, a Native já vende café, sucos e achocolatados. "O mercado cresce e também o número de oportunistas.Eles imaginam que vão obter grandes lucros porque os produtos têm preço mais alto", diz o diretor da empresa, Leontino Balbo Junior. Mas, observa, há vários obstáculos para os produtores: dos conhecidos problemas para obtenção de empréstimos às dificuldades de competir com o produto convencional.
Há três anos no mercado, a Ecoville, que industrializa café, ainda não conseguiu entrar no azul. O proprietário da marca, Fernando Marx, comenta que a concorrência para os menores é feroz, principalmente com as empresas de marcas tradicionais que decidem investir nos orgânicos. Ele também se queixa das redes que determinam preços. Para evitar maiores riscos ele tem procurado vender seus produtos para os supermercados médios no interior.

Uma agricultura que produz alimento e muitas idéias sociais
Conceito: A agricultura orgânica tem como princípio o uso exclusivo de produtos naturais. Jamais admite o uso de moléculas sintéticas, produzida pelo homem. A visão basilar dessa agricultura é que não é possível melhorara natureza, apenas aprender com ela. A Revolução Verde, que surgiu nos anos 70, apregoou que a tecnologia produzida pelo homem tem condições de melhorar a natureza e, assim, ampliar a produção de alimentos. Os agricultores de produtos orgânicos afirmam que foi a Revolução Verde que expulsou o homem do campo quando limitou o acesso à tecnologia. A. B.

OESP, 31/07/2005, p. B6

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