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Produtos bons, mas sem fôlego

OESP, 29/09-05/10/2011, Paladar, p. P2, P11-P12
29 de Set de 2011

Produtos bons, mas sem fôlego

Baunilha do Cerrado, caranguejos, cajuzinho-do-mato, arroz vermelho do Vale do Piancó, mangarito... Você precisa descobrir o Brasil! É enorme a quantidade de produtos nativos que os brasileiros não conhecem porque não chegam ao mercado.
O que acontece é que o pequeno produtor de alimentos está sujeito à mesma legislação que os grandes e, em geral, não consegue cumpri-la por falta de recursos.
Sem registro, não pode comercializar. E aí, ou abandona a produção ou vende de modo clandestino. As soluções incluem uma legislação específica para alimentos artesanais, apoio financeiro aos artesãos e organização de chefs para garantir a compra dos produtos.

Tucupi or not tucupi

De origem indígena, o tucupi é um dos grandes ingredientes nacionais. Extraído da mandioca brava triturada e espremida no tipiti, este suco amarelo e de acidez pronunciada é separado da goma decantada e fervido por horas para se livrar do ácido cianídrico. É um ingrediente essencial no preparo de pratos do Norte do país. Mas como sua produção não é regulamentada, não pode ser comercializado. O tucupi não pode viajar e poucos estabelecimentos se arriscam a comercializá-lo.
Embora encontre tucupi com facilidade em Belém do Pará, o chef Thiago Castanho, do Remanso do Peixe, diz que é mais comum achá-lo em feiras livres que em supermercados.
Adequar o processo de fabricação do tucupi às normas sanitárias é a saída. Mas vai dar trabalho. Ele é cozido no tacho de cobre (proibido em todo o Mercosul) e processado em um moinho improvisado com um motor de carro. E alguns dos utensílios usados no processo são de madeira (proibida em cozinhas comerciais).

Ameaça no futuro ou no passado?

Roberto Smeraldi

É pior perdermos o que temos ou o que poderíamos passar a ter? É o dilema chave ao tratarmos dos impactos das crises ambientais sobre gastronomia. As perdas naquilo que os economistas chamam de valor de opção (uso potencial) são enormes, afetando a inserção competitiva de um país como o Brasil. Isso porque apenas conhecemos, reconhecemos e aproveitamos uma parcela insignificante do nosso patrimônio.
Para compreender o desafio, não basta apenas focar o produto, a raridade ameaçada de extinção, seja por exploração excessiva ou por perda de habitat. É algo bem mais desafiador para o conjunto da sociedade: valorizar atributos do território como alavanca de seu protagonismo em vez de eliminar sua diversidade, enxergada como obstáculo. A relação é mútua. Se ao destruir o Cerrado podemos acabar com o pequi ou o baru, também ao deixarmos de construir arranjos com a diversidade de nossos óleos ou nozes vamos levar à perda daquele bioma. Não interessa preservar tal farinha ou caranguejo em museus ou reservas, e sim articular os mesmos com ciência, artesanato e indústria adequados.
O que é melhor - planejar a infraestrutura de turismo em função de um mês de Copa ou de uma malha de sabores que sustentem a marca Brasil ao longo do século 21? Conservar o ambiente que abriga a abelha nativa ou a base genética da mandioca, manejar as águas para não acabar com pargo ou tambaqui dependem da construção de identidade, do desenvolvimento de tecnologia e da articulação de cadeias que afirmem nossa gastronomia. Não é saudosismo, é investimento.

Jornalista, gastrônomo, é diretor , da OSCIP Amigos da Terra - Amazônia Brasileira

OESP, 29/09-05/10/2011, Paladar, p. P2, P11-P12

http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,tucupi-or-not-tucupi-,77890…
http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,ameaca-no-futuro-ou-no-pass…

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