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Produtor já aguarda feijão transgênico

OESP, Agrícola, p. 4-5
05 de Out de 2011

Produtor já aguarda feijão transgênico
Esperança é retomar o plantio da seca, inviável por causa do mosaico dourado - doença à qual nova variedade resiste

JOSÉ MARIA TOMAZELA

A aprovação do primeiro feijão transgênico 100% nacional gerou grande expectativa entre agricultores do sudoeste paulista, principal região produtora do Estado de São Paulo. A região, responsável por 90% da produção estadual, praticamente deixou de plantar uma das duas safras anuais do grão por causa de uma praga conhecida como mosca branca.
O feijão transgênico desenvolvido pela Embrapa tem como principal característica a resistência ao vírus do mosaico dourado, doença transmitida pelos ataques do inseto. "Não vejo a hora de plantar esse feijão", diz o agricultor Luis Domingues Ramos, produtor em Itapeva, sudoeste paulista.
As variedades geneticamente modificadas, batizadas de Embrapa 5.1, foram desenvolvidas em parceria pelas unidades de Recursos Genéticos e Tecnologia, de Brasília, e Arroz e Feijão, de Goiânia, e são as primeiras plantas transgênicas totalmente produzidas por instituições públicas de pesquisa brasileiras. O problema é que ainda há um caminho a percorrer para que esse feijão chegue à mesa do brasileiro. A Secretaria de Agricultura de São Paulo prevê de dois a três anos para que a semente esteja à disposição do produtor.
"O que foi aprovado foi apenas o primeiro ciclo de produção. Há que se fazer uma ampla pesquisa, pois o cultivar transgênico pode não ter qualidade de grão ou alta produtividade. E há o teste de panela, já que o consumidor de feijão tem uma predileção específica e precisa gostar do novo produto", adverte o pesquisador José Sidnei Gonçalves, do Instituto de Economia Agrícola (IEA).
Otimismo. Nada que reduza a expectativa otimista dos produtores. Agricultor desde pequeno, Ramos conta que a região tinha como tradição plantar duas safras anuais de feijão, conhecidas como a das águas e a da seca. Esta última era semeada entre o fim de dezembro e o início de fevereiro e, no passado, chegou a ocupar área maior do que a das águas.
"Até o fim da década de 1990, a mosca branca não incomodava, mas quando o pessoal começou a plantar soja por aqui, ficou ruim para o feijão da seca. A última safra que fizemos foi em 2000. De lá para cá, só plantamos o feijão das águas."
Mosaico. Segundo ele, a mosca se hospeda nas lavouras de soja e depois migra para os feijoeiros. "O inseto suga a seiva e transmite o vírus do mosaico. Logo as folhas começam a amarelar e deixam de fazer a fotossíntese e a planta não produz." Não há pulverização que dê conta. Ramos deixou de plantar feijão e agora se dedica a cuidar dos 435 hectares plantados pelo patrão, na Fazenda Água Limpa, em Itapeva.
O produtor Ariovaldo Fellet, que tem 726 hectares de feijão irrigado na Fazenda Lagoa Bonita, em Itaberá, também deixou de fazer o plantio da seca, há cinco anos, vencido pela praga. "As moscas faziam revoada sobre os feijoeiros e até pareciam resistentes ao inseticida. As perdas chegaram a 100%." Produtor de sementes, ele espera que a Embrapa instale, em parceria com a secretaria paulista, campos de reprodução do feijão transgênico na região.
O agricultor José Carlos Fogaça, com 500 hectares de feijão das águas no campo, em Itapeva, está na expectativa da variedade transgênica. "Poder plantar a segunda safra do feijão será um alívio, pois ajuda na rotação com a lavoura de milho", diz.
O mosaico dourado está presente em todas as regiões produtoras e pode ser responsável pelo fato de o Brasil não ter autossuficiência na produção de feijão. Mesmo sendo o maior consumidor do mundo, o País não consegue abastecer todo o mercado interno, segundo o pesquisador Francisco Aragão, da Embrapa/Brasília. "Quando falta feijão, o preço sobe e a população mais carente se vê privada de um dos alimentos mais ricos em proteína vegetal, ferro e vitaminas."
Segundo Aragão, a nova tecnologia protege as plantações e garante que os produtores alcancem a produtividade necessária. "O vírus do mosaico dourado é o maior problema para a cultura. Se a doença atacar as lavouras precocemente, as perdas podem chegar até 100%.
Com a semente transgênica, serão abertas novas áreas de produção, onde antes não era possível alcançar bons resultados", acredita o pesquisador. Segundo Aragão, a lógica é a de que, com mais sementes de feijão transgênico disponíveis, mais o mercado interno estará abastecido. Assim, os preços ficam estabilizados e maior quantidade de pessoas pode consumir o alimento.

Cultivo em SP reduziu-se 85%

O impacto da mosca branca levou ao quase desaparecimento da safra do feijão da seca paulista, segundo o IEA. Em 1983, foram plantados 237 mil hectares e colhidos 2 milhões de sacas de 60 kg. Em 2010, o cultivo restringiu-se a 37 mil ha - menos de 20% da área original, embora a produção tenha chegado a 999 mil sacas por causa da maior tecnologia. / J.M.T.

Ainda há áreas livres do mosaico dourado

Para o pesquisador José Sidnei Gonçalves, a resistência ao mosaico dourado altera a dinâmica das lavouras de feijão no Brasil. "De imediato torna viável a produção de feijão no sudoeste paulista e algumas regiões do centro-oeste, principalmente na safra da seca e em regiões de ocorrência da mosca. Mas o mosaico dourado não tem ocorrido no sul do Brasil e em muitas outras áreas de produção."
Ele lembra que uma das razões históricas que deslocaram o feijão para o sudoeste paulista e outras regiões de concentração da produção foi exatamente o fato de que a mosca branca (vetor do mosaico) ocorre em áreas onde também ocorre o cultivo da soja que é uma planta hospedeira. "A resistência ao mosaico dourado volta a tornar viável a convivência soja-feijão no mesmo espaço geográfico. Assim, em médio prazo, em especial nos ciclos de preços altos, ampliam-se as possibilidades de plantio de feijão substituindo lavouras de soja."
Gonçalves considera importante a aceitação do novo produto pelo consumidor. "Se for produtivo, mas não passar no teste de aparência e de panela, terá que entrar em ampla programação de melhoramento genético para satisfazer o consumidor."
Ele recorda que, nos anos 1980, o Instituto Agronômico de Campinas (IAC) havia lançado um cultivar considerado "fantástico", o IAC carioca 80. "Mas ele simplesmente não pegou porque não produzia bom caldo no prato. Outro feijão, o IAC ayso, com todas suas características nutricionais superiores, não pegou pela cor do grão. O próprio IAC carioca no início dos anos 1970 enfrentou inúmeras barreiras para se consolidar frente ao rosinha."
Por isso, ele considera que a conquista relevante do feijão transgênico está no plano da ciência. "Mas no plano da inovação incorporada à produção há que se ter paciência." Ele lembra ainda do genoma da xylela, do amarelinho dos citros, cuja conquista científica do sequenciamento do genoma foi capa da Nature, importante revista científica internacional. "Esse avanço científico ainda não chegou aos pomares." / J. M.T.

OESP, 05-11/10/2011, Agrícola, p. 4-5

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