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Produtor de soja vai fechar rodovias

OESP, Economia, p. B10
28 de Abr de 2006

Produtor de soja vai fechar rodovias
Protestos contra governo Lula já atingem 20 cidades em Mato Grosso; bloqueio está marcado para terça-feira

Patrícia Campos Mello

Os agricultores de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Bahia vão bloquear estradas dos três Estados na terça-feira, para impedir o escoamento da safra da soja. Estradas de Rondonópolis, Sapezal e Barra do Garça (MT), Luís Eduardo Magalhães (BA) e os acessos de Mato Grosso do Sul para São Paulo e Paraná serão fechados pelos produtores, que protestam contra a queda do dólar, o alto preço do óleo diesel e a falta de auxílio do governo federal para combater a ferrugem asiática que atingiu a lavoura de soja.
Segundo José Nardes, presidente do Sindicato de Produtores Rurais de Primavera do Leste, cidade próxima a Rondonópolis, será bloqueada a passagem de caminhões de grãos, fertilizantes, defensivos e outros insumos.
Os protestos dos agricultores começaram no início da semana no norte de Mato Grosso e foram batizados de Grito do Ipiranga, por causa da cidade onde se originaram. As manifestações estão se ampliando e já atingem 20 cidades, entre elas Sorriso, Sinop, Lucas do Rio Verde e Nova Mutum, que estão entre as maiores produtoras de soja do País.
Nessas cidades, as prefeituras decretaram ponto facultativo e os produtores usaram colheitadeiras para bloquear estradas e impediram a abertura de bancos e armazéns de grãos. Em Lucas do Rio Verde, os produtores queimaram uma colheitadeira e um trator na estrada.
LAGARTA
Em Cuiabá, veículos circulam com adesivos de protesto, mostrando uma lagarta com o rosto do presidente e a frase: Lula, a nova praga da agricultura.
Os agricultores pedem mudanças na política cambial do governo, porque o dólar baixo estaria inviabilizando a produção. Segundo Homero Alves Pereira, presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Mato Grosso (Famato), os produtores têm uma dívida de cerca de R$ 4 bilhões com fornecedores de insumos, multinacionais como a Bunge e a ADM e empresas de máquinas agrícolas como a Valmet, Valtra e outras.
"Precisamos de uma moratória de 180 dias para reestruturar essas dívidas", diz. "Não é um calote, nós simplesmente não temos como pagar. Vai todo mundo para o Serasa." Segundo ele, o atual governo protege a agricultura familiar e tem um preconceito contra a agricultura comercial, dizendo que é excludente. "Só que em MT, o Estado com o agronegócio mais competitivo, todos são grandes, precisamos de escala."
A Famato reivindica a redução da Cide, PIS e Cofins incidentes sobre o diesel usado pelos produtores rurais. "O preço do diesel triplicou em três anos."
Para o prefeito de Rondonópolis, Adilton Sachetti, os protestos são uma forma legítima de chamar a atenção para o problema do campo. "Fomos vítimas de um tsunami", Sachetti, ele mesmo produtor, demitiu 800 dos 1,2 mil funcionários da Agropecuária Sachetti desde novembro do ano passado.
Iraí Scheffer Maggi, que planta 100 mil hectares de soja e é o segundo maior produtor do grão no Brasil (só perde para Blairo Maggi, seu primo, o governador de Mato Grosso), também participa dos protestos. "Vou reduzir a área plantada em 20%", diz ele. "As medidas que o governo anunciou são apenas paliativas."

População e governo apóiam o protesto
Até as prefeituras fecharam ontem em solidariedade aos produtores
Nelson Francisco
Pelo menos 10 mil produtores agrícolas de Mato Grosso aderiram ao protesto Grito do Ipiranga em 14 municípios. A manifestação nas principais rodovias federais, por onde escoa toda a produção agrícola do Estado, entrou no quarto dia com o apoio da população. Comércio e prefeituras fecharam as portas em solidariedade aos produtores. Com a crise da agropecuária, base da economia estadual, todos sentem as conseqüências vividas pelos produtores.
Os agricultores queimaram máquinas, distribuíram leite e espalharam uma carga de soja no asfalto em Sorriso e Lucas do Rio Verde, na BR-163, que liga Cuiabá a Santarém (PA). Foram montadas barreiras para impedir o escoamento da produção para os portos de Itacoatira (AM) e Paranaguá (PR).
O protesto tem apoio da Federação da Agricultura e Pecuária de Mato Grosso (Famato) e sindicatos rurais, e é contra a política econômica, pagamento de preço mínimo pelos produtos e falta de renda no campo.
Houve manifestações com tratoraço e piquetes nas BRs 163 e 364 em Comodoro, Diamantino, Ipiranga do Norte, Sapezal, Sinop e Itanhangá, entre outros municípios. "Muito pouco foi feito para o produtor recuperar a a rentabilidade; hoje, toda a população sente o que tentamos evitar", disse o presidente da Famato, Homero Pereira.
Mato Grosso é o maior produtor de soja e algodão e tem o maior rebanho bovino do País. No Estado, pelo menos 2.100 produtores estão devendo R$ 5 bilhões aos bancos com empréstimos para financiar a produção 2003/2004. Segundo a Famato, R$ 6 bilhões deixaram de circular na economia local entre 2005 e 2006 com a crise do agronegócio. A arrecadação estadual caiu em média 40% nos primeiros meses do ano, informa a Secretaria de Fazenda. O agronegócio é responsável por 70% do PIB de Mato Grosso.
Para Pereira, o pacote de ajuda anunciado no início do mês é paliativo, pois não se espera intervenção no câmbio até as eleições. "Este protesto é um movimento legítimo e não é isolado, porque desde 2004 isso já era previsível", disse Pereira.

Pacote do agronegócio demora, diz Rodrigues
Fabíola Salvador
O ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, admitiu que o pacote de medidas estruturais para o agronegócio, previsto para o final de abril, só sairá dentro de três semanas. "O governo está fazendo as contas, e, quando o assunto é redução de impostos, você tem de sangrar em alguma área, e essa é a discussão atual", disse o ministro, após participar das comemorações dos 33 anos da Empresa Brasileira de Pesquisas Agropecuárias (Embrapa).
Uma das medidas previstas no pacote é a diminuição de impostos sobre a importação de insumos e a redução das alíquotas de PIS e Cofins incidentes sobre produtos agrícolas. O ministro reafirmou que a crise no setor do agronegócio nos últimos dois anos causou prejuízo de R$ 30 bilhões aos produtores rurais. "É uma crise sem precedentes na agricultura", disse Rodrigues. "A crise tem vários motivos: câmbio, taxa de juros, seca e logística".
O ministro anunciou a criação de um consórcio para o desenvolvimento da cadeia de agroenergia. Rodrigues afirmou que o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) tem interesse em financiar a construção de um pólo de agroenergia na América Latina e no Brasil.
Segundo o ministro, o Brasil terá o que o BID chama de "Bangalore", ou seja, um centro de alta tecnologia, numa referência à cidade de mesmo nome na Índia. No local estarão reunidos bancos, instituições de pesquisa em agroenergia e interessados neste segmento. O governo pretende investir R$ 10 milhões no centro de alta tecnologia, dos quais R$ 5 milhões este ano e R$ 5 milhões em 2007. Os parceiros serão reunidos ao redor da Embrapa.
Também fará parte do grupo a Itaipu Binacional, o que mostra, segundo Rodrigues, a importância da agroenergia para o País. "Nós vamos mudar a estrutura do planeta na área energética", disse. "O império do petróleo ainda vai demorar para chegar ao fim, mas seus alicerces começam a tremer".

OESP, 28/04/2006, Economia, p. B10

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