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Prefeitos ensaiam rebeliao contra a Sabesp

OESP, Cidades, p.C1
05 de Out de 2004

Prefeitos ensaiam rebelião contra a Sabesp
Contratos feitos por 30 anos estão para vencer e muitos ameaçam recorrer à privatização
Responsável pelos serviços de água e esgoto em 368 das 645 cidades paulistas, a Companhia de Saneamento Básico do Estado (Sabesp) iniciou em agosto um processo inédito de renegociação de contratos com prefeituras.
Nada menos do que 100 vencem nos próximos três anos. Diversos prefeitos indicaram que vão jogar duro, cobrando investimentos e tarifas menores como condição para renovar o acordo. Como trunfo, ameaçam recorrer a autarquias municipais ou à privatização, opções que, em alguns casos, têm garantido serviços mais baratos.
Criada no regime militar, em 1973, para aplicar o Plano Nacional de Saneamento (Planasa) no Estado, a Sabesp atende hoje a cerca de 25 milhões de pessoas. A estatal firmou com a maioria dos municípios contratos de 30 anos de duração. O primeiro a vencer foi o de Botucatu, no mês passado. A prefeitura renovou provisoriamente com a Sabesp, enquanto estuda uma decisão definitiva, a ser tomada no fim do mês.
Com a reeleição, no domingo, do prefeito Agripino Lima (PTB), a Sabesp já pode se preparar para perder o contrato em Presidente Prudente. Antes mesmo da votação, Lima prometeu criar uma autarquia municipal em vez de renovar o termo de adesão com a Sabesp, que vence em 2008 (Veja abaixo). Segundo ele, com a receita mensal de R$ 2 milhões das contas de água é possível melhorar muito o saneamento, que considera precário e um dos mais caros do interior.
Enquanto o consumidor de Prudente paga R$ 17,62 para cada 10 mil litros de água, o de Bauru - cidade do mesmo porte onde abastecimento e coleta de esgoto são municipalizados - desembolsa R$ 9,80.
O presidente da Associação Nacional dos Serviços Municipais de Saneamento (Assemae), Silvano Silvério da Costa, diz que a opção pelos serviços autônomos livra as prefeituras do ônus de financiar a estrutura da Sabesp, que encarece serviços e tarifas. "Nas autarquias, a estrutura é compatível com a demanda da região."
Na Sabesp, o vencimento dos contratos - além do de Botucatu, 15 terminam no ano que vem e outros 50 em 2006 - é visto com tranqüilidade. "As pessoas confiam em nossos serviços e não haverá problemas para renovar", diz o assessor executivo da presidência, Antônio Cesar da Costa e Silva. "As tarifas baixas dos autônomos ocorrem muitas vezes às custas de subsídios elevados."
Reeleito prefeito de Botucatu, o petista Mario Ielo quer saber quanto a Sabesp investiu no município durante a concessão e quando será construída a estação de tratamento do esgoto na cidade. Também quer discutir a possibilidade de adoção de tarifa local para os serviços, hoje cobrados com base numa tabela com apenas três níveis: região metropolitana, litoral e interior.
Ielo pretende que a Sabesp reconheça o direito do município de discutir metas e normas - da fixação das tarifas à expansão dos serviços, passando por questões ambientais. Ele quer, por exemplo, criar um fundo de preservação dos rios da região.
Caso a outra centena de municípios faça exigências semelhantes, a Sabesp pode se preparar para, no mínimo, elevar consideravelmente o volume de investimentos. "Vamos ter de iniciar uma série de negociações", admite Wanderlei Paganini, assessor da diretoria da estatal. (Jair Aceituno, especial para o Estado, Bruno Paes Manso e José Maria Tomazela)

Proposta para lei do saneamento só sai após eleição
Governo vai deixar de fora polêmica de Estados e municípios sobre titularidade dos serviços
José Ramos
BRASÍLIA - O marco regulatório do saneamento ambiental, que engloba redes de água, esgoto, coleta de lixo e escoamento de águas pluviais, só deverá ser enviado pelo governo ao Congresso depois das eleições. A proposta ainda está sendo elaborada pelo Ministério das Cidades e o texto deve ser avaliado por uma comissão interministerial.
Mas o ponto principal de divergências entre prefeituras e Estados - a titularidade dos serviços - não deverá ser abordado pelo projeto, ficando para ser resolvido pelo Congresso. Segundo declarou o ministro Olívio Dutra, não cabe à lei tratar desse assunto, pois a Constituição determina que os municípios são os titulares.
Pela proposta do governo, caberá aos municípios definir como será explorado o serviço em sua região: por meios próprios, por contrato com empresa privada, por consórcio com outras cidades ou por contrato com a empresa estadual de saneamento. Na última hipótese, o acordo poderia ser feito sem necessidade de licitação. No caso de não-renovação de acordos, a empresa estadual teria direito a receber indenização.
O secretário Nacional de Saneamento do ministério, Abelardo de Oliveira, considera a indenização uma garantia para os Estados que não existe na legislação atual. Mas os Estados, por meio do presidente da Associação das Empresas de Saneamento Básico Estaduais, Vitor Fernando Bertini, consideram insuficientes as garantias oferecidas pelo projeto.
Em primeiro lugar, porque não haveria garantias de que a indenização será paga antes de o município se apossar do serviço. Depois, porque haveria perda de segurança jurídica quando o município renovasse o contrato com a empresa estadual. É que em vez de uma concessão de longo prazo, será assinado um contrato de programa entre as duas partes, que pode ser cancelado a qualquer momento. Como são os contratos longos que permitem às empresas lastrear empréstimos, essa mudança pode dificultar financiamentos externos a custos baixos, conforme argumentam os representantes dos estados.

Câmara de Paulínia recomenda que contrato seja rompido
Paulínia, pólo petroquímico paulista e uma das cidades com o maior orçamento do Estado, não trata nada do esgoto produzido pelos cerca de 56 mil habitantes, lançado no Rio Atibaia. No ano passado, a falta de investimento em saneamento básico no município rendeu uma Comissão Especial de Inquérito (CEI) na Câmara Municipal, cujo relatório recomendou o rompimento do contrato com a Sabesp.
O diretor de Comunicação da prefeitura, Clemente Buoni, explica, entretanto, que a prefeitura teria de pagar uma alta multa caso a medida fosse tomada.
Segundo ele, o contrato expira em 2007. "O prefeito já quis assumir as obras, mas o contrato não permite", diz. "Paulínia tem dinheiro, mas não pode investir", afirma.
Para tentar resolver o problema, segundo o diretor, a Secretaria de Obras entrou com uma ação civil pública na Justiça e conseguiu que a Sabesp assinasse um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) no Ministério Público Estadual de Americana, comprometendo-se a construir uma estação de tratamento de esgoto até o primeiro semestre deste ano.
O prefeito de Presidente Prudente, Agripino de Lima (PTB), também reclama dos serviços da estatal. A relação da prefeitura com a Sabesp é ruim desde que a cidade ficou vários meses sem água, em 1986, por causa da falta de investimentos. Segundo Lima, o problema só foi sanado há seis anos, com a extensão do sistema de captação ao Rio do Peixe, localizado a 40 quilômetros.
De acordo com Lima, foi necessária a proximidade das eleições para a empresa inaugurar um sistema de tratamento de esgotos capaz de atender 80% da demanda. Até hoje, todo esgoto é despejado no Rio Limoeiro. A taxa de esgoto, no entanto, ele afirma, sempre foi cobrada dos moradores.
A prefeitura de Laranjal Paulista também tenta rever o contrato assinado na gestão passada, em que a prefeitura entregou os serviços à estatal. Segundo a Secretaria de Obras, a Sabesp não cumpriu ainda nenhuma cláusula do contrato, válido por 25 anos. O trabalho se resume à coleta e distribuição de esgoto, sendo que o esgoto não tratado é jogado no Rio Sorocaba. A prefeitura estuda duas saídas: retomar o Sistema de Água e Esgoto, o que custaria mais de R$ 10 milhões ao município, ou acionar o Ministério Público, exigindo da Sabesp o pagamento das multas conseqüentes do não-cumprimento do contrato. (José Maria Tomazela e Silvana Guaiume)

OESP, 05/10/2004, p. C1

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