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Povos indígenas do Alto Rio Negro estão sem assistência de equipes de saúde

ISA
08 de Mar de 2007

Depois que a Foirn e a Funasa romperam em novembro o convênio que mantinham há cinco anos para o atendimento à saúde indígena, nenhuma equipe de médicos, enfermeiros e dentistas se deslocou para as áreas por falta de equipamentos e insumos. As populações estão sendo assistidas por agentes de saúde indígenas e o número de mortes aumentou.

Em novembro do ano passado, quando o convênio para atendimento à saúde indígena entre a Fundação Nacional de Saúde (Funasa) e a Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro foi rompido, os profissionais foram retirados das áreas deixando 22 povos indígenas que habitam seis Terras Indígenas na região do Alto Rio Negro sem assistência. De acordo com o coordenador técnico do Distrito Sanitário Especial Indígena (Dsei), Sizinando Pontes, a mudança provocou descontinuidade no atendimento. A partir de dezembro, entretanto, novo convênio foi assinado com a Associação dos Trabalhadores de Enfermagem de São Gabriel da Cachoeira (Atesg) e cinco equipes foram mantidas em áreas estratégicas, mas incompletas, sem médicos, enfermeiros e dentistas. De acordo com Pontes, houve problemas com os motores dos barcos que estavam sucateados e sem condição de uso, o que impediu o deslocamento.

A Funasa já enviou motores de popa, mas não são suficientes. Enquanto isso, as comunidades estão sendo atendidas por Agentes de Saúde Indígena e também pelo pajés.

"Nem mesmo resgates estão sendo efetuados" diz um profissional que prefere não ser identificado por temer represálias. Com a época de seca, a navegação nos rios da região torna-se lenta e é uma tarefa que exige perícia. Em caso registrado na comunidade de São Joaquim, próximo à divisa com a Colômbia, a não-liberação de uma aeronave para o resgate de uma índia doente acabou em morte.

"Quantos mais terão que morrer para que a Funasa envie as equipes pra área?" questionam as lideranças indígenas da região.

Enquanto isso cerca de 80 profissionais entre médicos, dentistas, enfermeiros e agentes de saúde aguardam equipamentos para realizar seus trabalhos em campo. A previsão do Dsei é que no final da semana de 12 de março algumas equipes já possam se deslocar para as áreas. Parte dos profissionais demitidos pela Foirn foram recontratados pela Atesg para manter os serviços de saúde indígena enquanto o órgão federal estruturava seu funcionamento como gestor da saúde indígena na região. Mas quase quatro meses depois e o quadro é de incerteza.

Erivaldo Almeida Cruz, diretor da Foirn, explica que quando o convênio acabou, a Funasa se responsabilizou pelos insumos, equipamentos e medicamentos. "Mas a Funasa não está assumindo o papel a que se propôs. Ela se comprometeu e nós acreditamos. O atendimento não está acontecendo e mesmo as equipes que foram mantidas em algumas áreas não dão conta", diz

André Baniwa, presidente do Conselho Distrital de Saúde Indígena do Alto Rio Negro, escreveu um artigo endereçado ao presidente da República responsabilizando-o pela situaçlão em que se encontra a saúde indígena. Leia abaixo.

O convênio assinado entre a Fundação e Atesg vale até março para os profissionais de nível superior. "A Funasa está em negociações com a prefeitura de São Gabriel da Cachoeira que assumirá a folha de pagamento desses profissionais a partir daí", explica Pontes. Já os de nível técnico continuam com a Atesg até dezembro de 2007, quando os convênios costumam ser renovados.

Outro agravante apontado por Pontes é que o Dsei contava com o apoio das Forças Armadas, e em fevereiro muitos militares se foram porque acabou o tempo de perrmanência em São Gabriel e os substitutos só vão chegar em abril.

Diante desse quadro, a morbidade aumentou. "Mas surtos ou epidemias não ocorreram", garante Pontes.

A paralisação dos serviços em campo e a incerteza das futuras condições de contratação e de trabalho têm incentivado os profissionais a buscar emprego em outras instituições, como dentistas migrando para quadros do Exército na região, o que reduz ainda mais a oferta já escassa de profissionais de nível superior para atendimento à população aldeada.

O governo brasileiro é desobediente e sacrifica os povos indígenas com a não implantação de unidades gestoras como novo modelo de atenção básica à saúde indígena

Na mitologia indígena, como a povo Baniwa a qual pertenço, a desobediência é fator determinante para o caos e é também responsável pela mudança de valor. A população indígena está passando por uma situação bem difícil no que se refere ao serviço de saúde nas comunidades indígenas no Brasil inteiro. Os índios chegam a seqüestrar funcionários da Funasa para chamar a atenção para o fato de que o modelo vigente não funciona mais, que é preciso mudança urgente. Muitas invasões por indígenas aconteceram nas sedes locais da Funasa no ano passado e ainda continuam, para brigar por repasse de recursos para a continuidade da assistência de saúde às comunidades indígenas. O que significa isso? Boa ou má gestão da saúde indígena? O governo não governa junto com o povo, o governo é desobediente e sacrifica os povos indígenas negando as últimas deliberações das Conferências nacionais de saúde indígena que recomendam entre outras, a implantação de Unidades Gestoras como novo modelo para avançar na qualidade de prestação de serviço com controle social.

No Estado do Amazonas, a Coordenação Regional tem falado de mudanças para melhorar a saúde indígena. Criou condições inaceitáveis para parceiros não- governamentais com estratégia para mudanças. A mudança de um trabalho, dependendo da condição, pode significar melhoramento ou "pioramento" no serviço e na gestão. Depois da mudança aqui no Rio Negro já podemos contar mais de 100 dias sem assistência nas comunidades indígenas. Essa assistência parou no dia 15 de Novembro de 2006. As comunidades indígenas são mais de 700, agravando o sofrimento dos 27 mil indígenas no Rio Negro. São 25 pólos base. A dificuldade é claramente vista quando o chefe do Distrito Rio Negro diz: - "vou fazer somente o possível, gente!"

Os profissionais que foram treinados entre 12 e 16 de fevereiro de 2007, baseados na cidade de São Gabriel da Cachoeira, mesmo com planejamento e agendas de viagem, dificilmente cumprirão esta missão por causa da condição de viagem (e cobranças podem ocorrer na reunião do conselho distrital no período de 5 a 9 de Março de 2007). Porque estão sem motores, sem voadeiras, carros quebrados e material de trabalho como equipamentos odontológicos, de enfermagem e médicos quando existem, são insuficientes e estão sucateados. Assim também é a infra-estrutura precisando de reformas e outras construções de pólos bases; Os serviços de enfermagem e odontológicos ficam muito prejudicados, e as comunidades indígenas precisam deste serviço. É um direito que está sendo violado com isso.

Sabemos que é responsável por isso, o presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva, porque não quer mexer na Funasa. A Funasa é responsável por comprar equipamentos, materiais, e não está dando certo porque não está comprando, não está construindo pólos base e outros não estão sendo reformados. Saneamento básico não chega às comunidades indígenas que mais precisam.

Sem mudança estrutural a saúde indígena continuará travada. O senhor Presidente do Brasil precisa abrir o olho para isso e resolver esse problema porque ele está omisso em relação aos direitos humanos e aos direitos indígenas nacionais e internacionais.

André Fernando

Liderança indígena da Etnia Baniwa

Presidente do Conselho Distrital de Saúde Indígena do Alto Rio Negro

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