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Povoado em PE sobrevive da extração ilegal de madeira

G1 - http://g1.globo.com
17 de Jul de 2011

Em Caroalina, comunidade rural que pertence ao município de Sertânia, no sertão de Pernambuco, das 250 famílias, 190 recebem algum auxílio do governo. O povoado tem uma escola, algum comércio e um posto de saúde em estado muito precário. Não há remédio ou médico.

A água que sai das torneiras das casas, quando sai, é de péssima qualidade. É preciso buscar latões de água potável do dessalinizador do povoado, um equipamento que tira o sal da água. Há limite para isso: cada família pode retirar duas latas, dia sim, dia não.

É a abertura de cacimbas, pequenas escavações no leito do rio Moxotó, que garante água em tempo de estiagem, e não só para lavar roupa, mas também para cozinhar e tomar banho. Sem mata ciliar, o Moxotó está assoreado e cheira mal. Parte do seu leito virou lixão, contaminando a água.

Até a década de 1940, quase todo mundo em Caroalina vivia do caroá, daí o nome do povoado. O caroá é da família das bromélias. A planta terrestre costuma aparecer em regiões de caatinga mais fechada. Gera uma fibra boa e resistente, que, no passado, já sustentou cidades inteiras.

Caroalina dependia de uma fábrica de cordas de fibra de caroá que hoje virou curral. A unidade empregava muita gente no corte e beneficiamento da planta.

Depois da decadência do caroá, quase todo mundo teve que migrar para a produção de carvão, que ainda hoje é a principal atividade econômica do povoado.

Além do marido, três dos quatro filhos da artesã Irani Silva vivem do corte da madeira. Em casa, estudando, tem apenas o caçula, Lucas, de 12 anos. Para fugir dessa vida, muitos jovens têm deixado o povoado. Foi o que aconteceu na família de Josefa Lima. Suas quatro filhas foram embora para tentar a sorte na cidade grande. Com ela, ficou só o marido e o neto Fernandinho, que cria desde pequeno.

A ausência de alternativas de renda empurra as pessoas para a produção de lenha e carvão, muitas vezes ilegal. "Eu acho que, da parte legal, é menos da metade, principalmente quando se usa madeira nossa, da nossa caatinga, da nossa vegetação". A estimativa alarmante é do secretário de Agricultura e Meio Ambiente de Sertânia, Antônio Monteiro de Almeida.
"Tem toda uma falha na questão de fiscalização. É uma região muito grande. A gente não tem órgão direcionado para isso, e muitas vezes, dentro da legal, entra muita coisa que não é legal. E não é só em Caroalina, não é só no município de Sertânia. É uma questão que existe no semi-árido nordestino como um todo, o que é bastante preocupante, e, principalmente na questão do meio ambiente na nossa região", afirma Almeida.

Em Caroalina, achar fornos queimando madeira da caatinga sem autorização é fácil. Um homem casado e pai de três filhos, que não quis ser identificado, conta que tira a madeira do próprio terreno que tem no fundo da casa, onde também planta milho e feijão no período da chuva e cria uns poucos animais, só para subsistência.

A renda mesmo vem do carvão e dos R$ 130 que ele recebe do programa Bolsa Família. Triste, para esse carvoeiro, é saber que a profissão que matou seu pai e que tão mal sustenta sua família pode ser também o destino dos seus filhos.

Quase todo o carvão que sai da região é vendido em lojas e supermercados da capital Recife. Só quem tem um plano de manejo autorizado pelo órgão ambiental do estado poderia extrair madeira nativa para comercializar o produto de forma legal, e, mesmo assim, respeitando uma série de condições, como, por exemplo, não cortar determinadas espécies, protegidas por lei, como a aroeira e a baraúna.

Democriton Mendes da Silva, que compra e vende madeira na região já há mais de vinte anos, tinha um desses planos de manejo, mas decidiu abandonar. "A despesa não compensa. Eu tirei dois talhões e deixei a área. Não pedi mais fiscalização porque achei que não dava pra cobrir a despesa. Preferi perder o projeto", diz.

Hoje, Democriton trabalha comprando madeira da propriedade de terceiros. Pagando uma diária aos trabalhadores que gira em torno dos R$ 45, vende a madeira para grandes empresas do ramo de alimentos e cerâmica.

A única madeira que pode ser usada livremente para a produção de lenha e carvão é a da algaroba, que, apesar de abundante, não é nativa. Por isso, todos gostam de dizer que a lenha e o carvão produzidos na região vêm dessa árvore. Basta um informativo de corte junto ao órgão ambiental e os produtos circulam sem restrição.

Manoel Oliveira não encontrou um só galho dessa árvore entre as toras de madeira no forno sem dono encontrado queimando no meio da mata. Oliveira já fez muito carvão no passado, e hoje é agente distrital de Caroalina. Representa a prefeitura de Sertânia no povoado. "Catingueira, marmeleiro, angico, baraúna, umburana. Algaroba não tem", diz. A baraúna, por exemplo, é uma daquelas árvores protegidas, inclusive nos planos de manejo autorizados em Pernambuco.

O pessoal na região diz que colocar esse carvão ilegal no mercado formal é relativamente simples. Funciona mais ou menos assim: alguém tem uma propriedade de 100 hectares, plano de manejo, autorização para vender. A outra pessoa tem uma propriedade menor, sem autorização. Essa pessoa faz o carvão, vende para a outra e ela revende, com nota fiscal, como se fosse dela.

A prática é confirmada pelo secretário de agricultura e meio ambiente de Sertânia. "A gente tem que criar não só o município, mas as três esferas de governo. Tem que se juntar para poder buscar outras alternativas, soluções, para que realmente a gente possa trabalhar de forma mais sustentável na zona rural do nosso município", afirma Antônio Monteiro de Almeida.

Na capital Recife, o diretor-presidente da agência estadual de meio ambiente e recursos hidrícos, Hélio Gurgel, reconhece que, este ano, foram poucas as autuações por produção ilegal de lenha e carvão no estado, apenas quatro até julho, mas faz um alerta. "São práticas que violam a legislação em vigor e fazem com que o infrator venha arcar com pesadas multas e até mesma com responsabilidade pessoal. A pessoa pode ser presa", afirma.

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