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Posse de terra move a violência

CB, Brasil, p. 11
29 de Out de 2012

Posse de terra move a violência
Embate entre os guaranis-caiovás e fazendeiros em Mato Grosso do Sul traz à tona o maior problema dos índios no país: território. Especialista destaca falta de vontade governamental

RENATA MARIZ

Graças ao incalculável poder da internet, o impasse envolvendo guaranis-caiovás e fazendeiros de Mato Grosso do Sul impressionou brasileiros na última semana, que se mobilizaram no mundo virtual e já começam a programar protestos em algumas capitais, incluindo Brasília. A situação, porém, não é novidade entre os indígenas. Desde que o homem branco aportou em terras brasileiras, a disputa por território com níveis elevados de violência marca a história das etnias. Dados do relatório mais recente do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) apontam a ocorrência de 53 conflitos ligados à terra só no ano passado em 12 unidades da Federação.
Mato Grosso do Sul, apesar de registrar apenas três casos de conflito, responde por 62% dos 51 assassinatos de indígenas no Brasil em 2011, informa o órgão vinculado à Igreja Católica (veja quadro). Os patamares elevados de violência historicamente registrados naquela região explicam a tensão em torno da atual disputa por uma área no município de Iguatemi (MS). Desde 2008, a Fundação Nacional do Índio (Funai) faz estudos para verificar se o local deve ser demarcado como terra indígena, mas uma decisão publicada em setembro pela Justiça Federal em favor dos fazendeiros esquentou o conflito que se arrasta há cerca de um ano. Não houve registro de mortes no local na última semana.
A demora nas demarcações de territórios tradicionais, segundo Cleber Buzatto, secretário executivo do Cimi, é a origem das mazelas que atingem os indígenas. A entidade calcula em 399 o número de áreas reivindicadas por grupos no Brasil para as quais não há qualquer iniciativa do Executivo Federal em iniciar os estudos. "Essa tarefa é da Funai, que hoje não tem recurso material nem pessoal para atuar. Sem contar a falta de vontade política do governo Dilma Rousseff, o mais decepcionante desde a redemocratização em relação aos direitos indígenas", critica Buzatto. A Funai não foi encontrada para comentar os dados do Cimi, que apontam 361 terras registradas no país.
O guarani Otoniel Ricardo, liderança do grupo em Mato Grosso do Sul, conta que a situação no local continua tensa. Ele destaca que a carta divulgada na internet mencionando "morte coletiva" foi interpretada de forma errada por alguns. "Não pensamos em nos matar. O que nossa mensagem quis dizer é que, se for preciso, vamos morrer pela terra. Vivemos ameaçados por pistoleiros que trabalham para os fazendeiros, mas agora decidimos resistir a todo custo", afirma.
Ricardo virá a Brasília amanhã para uma reunião na Secretaria de Direitos Humanos, acompanhado de outras três lideranças. O grupo pretende entregar um manifesto à vice-procuradora-geral da República Deborah Duprat, que tem atuação reconhecida em favor dos direitos indígenas. Segundo o guarani, o clima de insegurança continua sem a presença de forças policiais. Ele conta que, na última sexta-feira, correu o boato de que uma índia da redondeza havia sido estuprada. "Todo mundo está com muito medo, principalmente o grupo de uns 60 índios que ficam lá na área. Mas ninguém atende a gente."

Correio Braziliense, 29/10/2012, Brasil, p. 11

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