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Por pressão ruralista, Bolsonaro demite comando de órgão de reforma agrária

FSP, Poder, p. A12
01 de Out de 2019

Por pressão ruralista, Bolsonaro demite comando de órgão de reforma agrária
General que preside o Incra e secretário do Ministério da Agricultura entraram em conflito sobre entrega de títulos de posse a assentados

Ricardo Della Coletta
Rubens Valente
BRASÍLIA

Por pressão de ruralistas, o presidente Jair Bolsonaro (PSL) decidiu substituir a presidência e a diretoria do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária).

A saída do general João Carlos Jesus Corrêa da presidência e dos demais diretores de seus cargos no órgão foi definida numa reunião, na tarde desta segunda-feira (30), no Palácio do Planalto com Bolsonaro, a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, e o secretário especial de Assuntos Fundiários da pasta, Nabhan Garcia.

A saída de Jesus Corrêa foi confirmada pela assessoria da secretaria especial do ministério. Ele e Nabhan vinham protagonizando uma longa disputa sobre a entrega de títulos de propriedade de terras para assentados, sobretudo na Amazônia.

O secretário de Assuntos Fundiários argumenta que esse processo de regularização fundiária garantirá ao assentado acesso a crédito e financiamento, mas críticos alegam que essa política configura um estímulo à grilagem de terras.

O general -no comando do Incra desde fevereiro deste ano- era visto por Nabhan como um obstáculo para a política de entrega de títulos para assentados, razão que motivou sua demissão.

Internamente Jesus Corrêa vinha se defendendo das críticas de Nabhan com o argumento de que o Incra sofreu severos cortes orçamentários, o que inviabiliza a política de regularização fundiária defendida pelo secretário especial.

O governo trabalhou com a promessa de entregar 600 mil títulos de terra no país em quatro anos do governo Bolsonaro, segundo Nabhan Garcia confirmou em entrevistas que concedeu à imprensa em agosto.

O número, contudo, é considerado, dentro das atuais condições do órgão, inexequível por técnicos do Incra consultados pela Folha. A média anual oscila de 30 mil a 40 mil famílias. De janeiro para cá, o número não teria passado de 2.000.

Na avaliação de técnicos do órgão, um dos entraves para o cumprimento dessa meta foi originado pelo próprio governo, ao desarticular o programa Terra Legal, criado em 2009, durante o governo Lula (PT).

Em oito anos, até julho de 2017, o programa já havia distribuído 13 milhões de hectares, sobretudo à responsabilidade de órgãos da União, nos estados do Acre, Amapá, Amazonas, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins.

O programa buscava georreferenciar, cadastrar, regularizar e titular as terras, o que auxiliava no combate ao desmatamento.

Outro ponto de atrito entre Nabhan e a atual gestão do Incra se refere às desistências de áreas para assentamentos.

O secretário especial tem pressionado para que o instituto desista de desapropriar terras para a reforma agrária no país, prática que já foi alvo de uma advertência pelo Ministério Público Federal.

A diretoria do Incra agora demitida era indicada por Jesus Corrêa, sendo que a maioria dos cargos era ocupada por militares. Segundo relatos feitos à Folha, a ideia é entregar as funções para indicados de partidos políticos.

É o segundo general do Exército que deixa o comando de um órgão público no governo Bolsonaro após uma disputa política com Nabhan Garcia.

Em junho, o presidente da Funai (Fundação Nacional do Índio), o general Franklimberg Freitas, foi destituído do cargo após se opor a pressões de Nabhan.

Na ocasião o general disse que o líder ruralista "saliva ódio aos indígenas".

A assessoria de comunicação do Incra informou, às 19h40, que o órgão não havia sido comunicado oficialmente sobre a troca da presidência e dos diretores e que, por isso, não iria se manifestar.

Procurado pela Folha por meio de seu telefone celular nesta segunda-feira, o general Jesus Corrêa não foi localizado para comentar sua saída do Incra.

FSP, 01/10/2019, Poder, p. A12

https://www1.folha.uol.com.br/poder/2019/09/por-pressao-ruralista-bolso…

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