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A polêmica dos transgênicos

GM, Opinião, p. A3
Autor: BOLSON, Eder Luiz
04 de Nov de 2004

A polêmica dos transgênicos

O futuro da competitividade do agronegócio brasileiro está ameaçado. A discussão sobre a soja transgênica foi colocada para a opinião pública como uma escolha entre o bem e o mal, entre ambientalismo e desenvolvimentismo, despertando paixões emocionais, políticas e ideológicas. Recebemos muita informação, mas pouco conhecimento. A maioria desconfia dos cientistas e se esquece que eles formulam muitas hipóteses, mas só aprovam as inovações baseados em evidências. Nossos três poderes, cientistas e empresários perdem tempo ao discutir os transgênicos de maneira dicotomizada e pouco ponderada. Eles deveriam preocupar-se com o futuro, com planos e orçamentos para o desenvolvimento de uma plataforma biotecnológica que dê estabilidade aos avanços já conquistados pela produção agropecuária brasileira. O futuro da competitividade do agronegócio brasileiro está ameaçado. Perdemos competitividade na soja ao utilizarmos cultivares transgênicas argentinas menos adaptadas e produtivas. Estamos perdendo terreno no algodão porque os americanos, chineses e australianos já utilizam sementes transgênicas e gastam 25% a menos com inseticidas. Precisamos de cientistas treinados e de ferramentas biotecnológicas para controlar as pragas e doenças que vão continuar prejudicando a nossa soja (US$ 1,3 bilhão de perdas, por safra, com a ferrugem asiática), os nossos frangos (gripe asiática), laranjas, bananas (sigatoga), café, suínos e bovinos (doença da vaca louca). A Embrapa, onde fui pesquisador, colhe agora o que plantou há mais de 30 anos. Ela investiu treinando-nos no exterior, de onde trouxemos protocolos científicos, que na época eram públicos, de livre acesso, e não privados/patenteados como hoje. Os US$ 20 milhões por ano que o Brasil investe em pesquisas biotecnológicas são irrisórios, para não dizer ridículos, perto dos US$ 4 bilhões aplicados anualmente no mundo. Somente a Índia aporta recursos em pesquisa biotecnológica em volume dez vezes superior ao brasileiro e o governo chinês promete investir US$ 500 milhões em 2005. Ao planejarmos com a visão de tatus, e não de águias, vamos nos transformar em passageiros de terceira classe nesse trem biotecnológico que parte para o futuro na velocidade do pensamento. As discussões novelescas sobre os riscos dos transgênicos para a saúde e o meio ambiente estão desviando o assunto, ou jogando uma cortina de fumaça sobre as reflexões acerca das perdas econômicas, de médio e longo prazo, que a transgenia patenteada pode trazer para o Brasil. Estão em jogo as fatias do mercado brasileiro de sementes, que somam R$ 4,2 bilhões por ano, e os royalties que remeteremos para o exterior para acessar os eventos transgênicos do futuro. Estão também na berlinda a soberania, a independência tecnológica e o controle estratégico dos estoques de sementes para plantio. Os eventos transgênicos serão sempre exclusivos e a sua oferta, ou não, para plantio no Brasil ficará a critério de quem os detém via patentes. Enquanto discutimos o capítulo de ontem da novela "Soja Nostra", estamos deixando de pensar e planejar para que possamos escrever os capítulos futuros, principalmente aqueles que tratam das questões econômicas que envolvem os transgênicos. A onda transgênica já abraçou mais da metade da produção mundial de alimentos e nós mantemo-nos numa posição defensiva e de força. Não podemos perder essa oportunidade única para discutir e negociar em posição privilegiada a liberação dos transgênicos, conseguindo vantagens econômicas e obtendo garantias de soberania tecnológica e alimentar. kicker: Vamos nos transformar em passageiros de terceira classe nesse trem biotecnológico

(Eder Luiz Bolson - Vice-presidente do Sindicato das Empresas de Base Biotecnológica (SindBio).)

GM, 04/11/2004, Opinião, p. A3

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