VOLTAR

A polêmica do macaco louro

O Globo, Ciência, p. 35
20 de Jul de 2006

A polêmica do macaco louro

Roberta Jansen

Um simpático macaco-prego de incomum pelagem longa e loura está causando polêmica no meio científico brasileiro. Para um grupo de pesquisadores, trata-se de uma espécie nova, chamada Cebus queirozi. Já uma outra equipe sustenta que se trata de um animal descrito há 232 anos pelo naturalista alemão Johann Schreber e que recebeu o nome de Cebus flavius.

O embate acadêmico teve início em maio deste ano, quando pesquisadores da Universidade Federal de Pernambuco publicaram um estudo na revista eletrônica "Zootaxa", anunciando a descoberta da nova espécie de macaco-prego.

Agora, um grupo de pesquisadores do Ibama e da Universidade Federal da Paraíba sustenta que se trata de um animal já descrito no passado. O novo estudo acaba de ser publicado no "Boletim do Museu Nacional".

- Trabalhamos com o animal há dois anos e, inicialmente, achávamos que era uma espécie nova - conta o biólogo Marcelo Marcelino, do Centro de Proteção dos Primatas Brasileiros, do Ibama. - Levamos a questão à reunião do Comitê Internacional de Conservação e Manejo do macaco-prego e a conclusão dos especialistas foi que se tratava de uma espécie nova.

A partir dai, os pesquisadores começaram o trabalho de campo, coletando três animais para estudo.O primeiro passo para a descrição de uma nova espécie é justamente consultar a literatura antiga.

O mergulho nos textos e desenhos antigos fez com que Marcelino e Alfredo Langguth, da Universidade Federal da Paraíba, encontrassem a primeira referência ao incomum macaco "de pêlo mais longo, amarelo-claro" na obra "Historias Rerum Naturalium Brasiliae", do naturalista alemão Georg Marcgrave, membro da comitiva do Conde Maurício de Nassau, que esteve no Nordeste entre 1637 e 1644. Uma pintura atribuída a Albert Eckhout, que integrava a comitiva, retrata o mesmo macaco-prego.

A descrição de Marcgrave, entretanto, não é considerada cientificamente válida porque é anterior ao Código Internacional de Nomenclatura Zoológica, instituído em 1758. Em 1774, Johann Schreber pintou o exemplar da espécie que veio a chamar de Símia flavia (macaco dourado em latim). Schreber, porém, não guardou em coleção científica um exemplar do animal pintado nem informou a sua procedência exata.

- Ficou um mistério: quem era o animal? - contou Marcelino. - Mas quando vimos a pintura, não tivemos dúvida de que era o mesmo bicho. Nenhuma outra espécie de Cebus tem um padrão de pelagem semelhante.

A partir dessa constatação, a dupla de pesquisadores corrigiu a nomenclatura para Cebus flavius já que todos os macacos-prego pertencem ao gênero Cebus.

- A grande questão é: será que Cebus flavius é Cebus queirozi ? - questiona o vice-presidente de ciência da Conservação Internacional, José Maria da Silva. - Mas o mais importante é que se trata de um bicho diferente, endêmico da Mata Atlântica e ameaçado de extinção.

O Globo, 20/07/2006, Ciência, p. 35

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.