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Pobreza assassina

O Globo, Mundo, p. 24
14 de Out de 2016

Pobreza assassina
Segundo ONU, 90% das mortes em catástrofes naturais ocorrem nos países menos ricos

-NOVA YORK E PORTO PRÍNCIPE- O terrível terremoto de 2010, que matou mais de 200 mil haitianos, tinha magnitude de 7 graus na escala Ritcher. Na Nova Zelândia, um tremor semelhante com intensidade um pouco maior, de 7,2 de magnitude, poucos meses depois, não deixou vítimas fatais. De acordo com um estudo das Nações Unidas divulgado ontem, o número de mortos por desastres naturais é, em média, cinco vezes maior em países pobres do que em nações ricas. Entre 1996 e 2015, pelo menos 1,35 milhão de pessoas morreram por catástrofes do tipo - 90% delas em países pobres ou de renda média. Em seu relatório anual, também publicado ontem, Cruz Vermelha e Crescente Vermelho alertam para a capacidade de antecipar os desastres e assim reduzir seu impacto. O Haiti, que além do terremoto viveu um surto de cólera iniciado naquele mesmo ano e três anos de seca causados pelo fenômeno El Niño, foi o que registrou mais mortes nas duas últimas décadas: 229.699.
No caso do país, particularmente vulnerável em condições meteorológicas, os vínculos entre pobreza e catástrofes naturais são "muito claros", de acordo com o representante especial das Nações Unidas para a Redução dos Riscos de Catástrofe, Robert Glasser.
- Considero realmente escandaloso e inaceitável que nós, à exceção do Haiti, tenhamos podido ver pela televisão como a tempestade se aproximava, enquanto era impossível avisar a população haitiana com alertas precoces. E quando se mandavam alertas, eles não serviam de nada pela falta de preparo da população - lamentou.
O documento da ONU, que contabiliza sete mil desastres naturais no período, mostra ainda que, além da pobreza, a falta de sistemas de alerta e prevenção agrava os casos. "Os países de renda alta registram enormes perdas econômicas, mas, nos países com baixa renda, as pessoas pagam com a vida", alertou o secretáriogeral da ONU, Ban Ki-moon, em nota.
MAIS DESASTRES LIGADOS AO CLIMA
Entre 1991 e 2010, foram perdidos US$ 846 bilhões (R$ 2,3 trilhões) em catástrofes. E cerca dez milhões de pessoas estão expostas a riscos possíveis de serem previstos.
"As necessidades humanitárias atingiram níveis sem precedentes. Conseguir mais dinheiro não é suficiente para crises futuras. Algo tem de mudar. Investimentos de prevenção devem ser levados mais a sério", diz o relatório da Cruz Vermelha.
Em setembro, líderes mundiais concordaram em reduzir a pobreza até 2030. Yolette Etienne, coordenadora executiva da ActionAid no Haiti, lembra que o país é o mais pobre e desigual nas Américas e um dos mais pobres do mundo.
- As zonas rurais, que foram mais afetadas já têm muito pouco acesso à saúde, educação, água e saneamento básico. O suprimento de alimentos é baixo, o que é agravado pelo impacto da seca e da persistência do cólera em várias regiões - afirma ao GLOBO. - As necessidades mais urgentes agora são alimentos, água potável e abrigo.
O relatório mostra ainda que, se terremotos e tsunamis são os "maiores homicidas", eles são seguidos de perto por desastres ligados ao clima. A mudança climática, aliás, desempenhou um papel importante em 2015, o ano mais quente já registrado: quase o mesmo número de pessoas que morreram no terremoto no Nepal - cerca de cinco mil - foram vítimas de ondas de calor no ano passado no mundo. Os desastres relacionados com o clima mais que dobraram ao longo dos últimos 40 anos, passando de três mil a 6.392.
"Um tipo diferente de megadesastre vem aumentando, quase em segredo, graças à mudança climática. Terremotos ainda podem dominar as manchetes e as estatísticas, mas os desastres relacionados ao clima são mais difíceis de calcular, devido a baixa notificação em países mais pobres, especialmente sobre a mortalidade por ondas de calor", indica a ONU.
Depois do Haiti, os países com maior número de mortes ligadas a catástrofes naturais são Indonésia, afetada pelo tsunami de dezembro de 2004 no Oceano Índico, e Mianmar, varrido pelo ciclone Nargis em maio de 2008. Na sequência, aparecem China, Índia, Paquistão, Rússia, Sri Lanka, Irã e Venezuela. Dentre os 20 países mais afetados também aparecem nações ricas como França, Itália, Espanha e Japão. (Colaborou Marina Gonçalves)

O Globo, 14/10/2016, Mundo, p. 24

http://oglobo.globo.com/mundo/90-das-mortes-em-catastrofes-ocorrem-nos-…

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