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Plataformas poluem tanto quanto carros

OESP, Economia, p. B8
16 de Jul de 2007

Plataformas poluem tanto quanto carros
Produção da Petrobrás emite entre 4 e 7 milhões de toneladas de gás carbônico por ano na atmosfera

Nicola Pamplona

Um volume de gás carbônico (CO2) equivalente ao emitido pelos veículos da cidade de São Paulo pode estar sendo despejado na atmosfera diariamente pelas plataformas de produção de petróleo da Petrobrás. A estimativa é do Banco Mundial, que tem um programa para tentar reduzir as emissões de poluentes pelos queimadores de gás natural em instalações petrolíferas. A instituição calcula que a queima ou a liberação de gás (chamada de venteio) sejam responsáveis pela emissão de 350 milhões de toneladas de CO2 equivalente por ano em todo o mundo.

No Brasil, o volume de emissões pelas plataformas de petróleo varia entre 4 e 7 milhões de toneladas por ano, dependendo do volume de gás queimado, diz o consultor do Banco Mundial Francisco Sucre. A título de comparação, estudo da Coppe/UFRJ para a Secretaria do Verde e do Meio Ambiente da prefeitura de São Paulo estima que todo o transporte rodoviário na capital paulista lance na atmosfera 7,6 milhões de toneladas de CO2 por ano. É o setor que mais polui a cidade, aponta o inventário das emissões feito pela universidade.

A Petrobrás queima por dia cerca de 5,5 milhões de metros cúbicos de gás natural, segundo a Agência Nacional do Petróleo (ANP). O valor é 10,5% superior à média do ano passado, mas representa importante queda com relação aos 7,1 milhões registrados em 2001.

A empresa diz que a queima 'é inerente ao processo de produção de petróleo'. 'Ela ocorre para garantir a segurança do sistema ou por eventuais dificuldades operacionais', justificou a área de exploração e produção da companhia em e-mail enviado ao Estado.

Para especialistas, é também resultado da falta de peso que o gás tinha para a companhia quando as principais plataformas da Bacia de Campos foram instaladas. Cerca de 75% do gás produzido no Brasil vem junto ao petróleo extraído das reservas (por isso, é chamado de gás associado) e a busca pela auto-suficiência em óleo elevou também a produção do gás. Sem grandes investimentos no transporte e distribuição do combustível, a solução é queimá-lo nas plataformas ou reinjetá-lo nos poços.

O trabalho do Banco Mundial, denominado Parceria Global para a Redução da Queima de Gás (GGFR, na sigla em inglês), é buscar mercados para o gás que é hoje queimado ou liberado na atmosfera diretamente dos poços, como faz a Rússia. O Brasil é apontado como o 17o maior queimador de gás do planeta, mas não é signatário do acordo. 'Temos conversado com a Petrobrás e eles se comprometeram a realizar um workshop sobre o assunto este ano, o que indica que há preocupação com o assunto', avalia Sucre.

A Petrobrás informa que tem um programa interno de otimização do uso de gás na Bacia de Campos, que já recebeu investimentos de US$ 298 milhões. Segundo a estatal, o índice de utilização do gás produzido na região subiu de 61% para 84%. No início da década, a ANP propôs um programa chamado de Queima Zero, com o objetivo de reduzir o desperdício. Há indícios de que a empresa tenha investido menos em transporte do gás para o continente porque precisava usar o gás comprado da Bolívia.

Falta de gás

Hoje, o Brasil sofre com a falta de gás natural. 'Estimamos que o gás queimado atualmente represente cerca de 20% do gás importado da Bolívia. Daí, a importância estratégica em aumentar a utilização do gás que hoje vai para os queimadores', aponta o consultor do Banco Mundial.

'À medida em que o preço do gás subir, será mais interessante para a empresa investir em dutos para trazer o combustível. As plataformas de Campos ficam longe do continente e o transporte é realmente caro', avalia o consultor Marco Tavares, da Gas Energy.

Não há, na legislação brasileira, nada que obrigue os concessionários de petróleo a mandar a produção para terra firme. Embora a ANP tenha apenas a prerrogativa de aprovar os volumes de queima propostos pela companhia, o concessionário pode optar por reinjetar o restante do gás. Do ponto de vista econômico, a agência cobra royalties sobre o gás queimado, o que pode incentivar investimentos para vender o combustível.

Ibama só avalia impacto local
Legislação para plataformas ignora o efeito estufa

Do ponto de vista ambiental, o problema da poluição provocado pela queima não é relevante nas análises de projetos petrolíferos em alto-mar. 'Pela lei, nossa avaliação considera os impactos locais de cada empreendimento, mas não olha para efeitos globais, como o efeito estufa', explica o coordenador de licenciamento de projetos de produção de petróleo do Ibama, Guilherme Carvalho. Como as plataformas estão localizadas em alto-mar, longe de centros urbanos e com alto nível de dispersão dos poluentes, a emissão de CO2 tem pouco impacto local.

Estudos do GGFR, porém, estimam que o volume de emissões de CO2 pela queima ou venteio de gás no mundo inteiro representa mais do que a redução de emissões que será provocada por todos os projetos em curso no âmbito do Protocolo de Kyoto. O programa tem por objetivo pelo menos manter os níveis de emissão atuais, mesmo com o crescimento da produção mundial. Há grande preocupação com a Rússia, maior produtor mundial do combustível, e com países africanos, como Nigéria e Angola.

Nove empresas são signatárias do tratado, entre elas as gigantes mundiais Chevron, ExxonMobil, Total e BP. A Petrobrás informa que vem mantendo contato com a coordenação do GGFR e que cumpre a maior parte das normas do grupo. Além disso, afirma que todas as novas plataformas são projetadas para um uso mais eficiente de energia. Após ser criticado por não assinar um acordo pela redução de emissões de carbono no início do mês, o presidente da Petrobrás, José Sérgio Gabrielli, propôs a criação de um fórum empresarial global para discutir o tema.

FRASE

Guilherme Carvalho
coordenador do Ibama

'Pela lei, nossa avaliação considera os impactos locais de cada empreendimento, mas não olha os efeitos globais, como o efeito estufa'

OESP, 16/07/2007, Economia, p. B8

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