VOLTAR

Plano contra violência no campo já esta pronto

O Globo, O País, p.16
28 de Mar de 2004

Plano contra violência no campo já esta pronto
Projeto do governo exige que prefeito garanta abrigo a sem-terra antes de juiz determinar desocupação de área invadida

Num momento em que o Movimento dos Sem Terra (MST) ameaça fazer nova onda de invasões de terra, o governo concluiu o Plano de Combate à Violência no Campo, criado para tentar evitar conflitos agrários e reduzir os assassinatos na área rural. Uma das principais medidas do plano, que será lançado em breve pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, é o cumprimento de uma série de pré-requisitos antes de um juiz determinar a desocupação de uma fazenda invadida.

Um dos pré-requisitos será a exigência de que o prefeito da cidade encontre um lugar para o acampamento provisório das famílias que serão despejadas da propriedade invadida. Essa é uma das 26 ações previstas no plano do governo.

Ouvidor agrário nacional presidiu comissão

A comissão criada pelo Executivo para elaborar o plano foi presidida pelo ouvidor agrário nacional, o desembargador Gercino José da Silva Filho, e contou com representantes de diversos ministérios. Para serem implementadas, as medidas vão depender de atos, decretos e portarias dos governo federal e estaduais; da aprovação de projetos de lei no Congresso; e de resoluções dos tribunais de Justiça.

Gercino disse que uma medida que considera fundamental para o sucesso do plano, a criação das ouvidorias agrárias federais nos estados, depende apenas de um decreto do presidente da República. A previsão é instalar, até o fim de 2004, oito ouvidorias nos estados com maiores índices de violência no campo: Pará, Maranhão, Rondônia, Mato Grosso, São Paulo, Pernambuco, Alagoas e Minas Gerais.

Ouvidorias servem para mediar os conflitos

As ouvidorias fazem a intermediação dos conflitos agrários. Quando não conseguem evitar as invasões de terra, as ouvidorias atuam para garantir tanto os direitos humanos e sociais dos sem-terra que ocuparam a área como o direito de propriedade, em caso de a terra ser produtiva.

O ouvidor federal nos estados será escolhido pelo presidente da República, a partir de listas tríplices enviadas pelos movimentos sociais que atuam no campo e pelos produtores rurais.

Outra medida prevista no plano do governo é a criação de varas agrárias para agilizar o julgamento de casos de desapropriação de imóveis rurais, e a criação de promotorias agrárias. Já o plano de execução de mandados de reintegração de posse estabelece que, antes de conceder uma liminar ao fazendeiro, o juiz deverá, primeiro, ouvir o Incra, os institutos de terras estaduais e o Ministério Público para se certificar de que a terra ocupada não é grilada nem está ilegalmente nas mãos do fazendeiro.

Posseiros usariam até documentos ilegais

Gercino lembra, que, muitas vezes, o grileiro se apresenta como legítimo proprietário da terra:
- Ele apresenta documentos irregulares que fundamentam uma decisão injusta e até ilegal. Isso provoca aumento de conflitos agrários e da violência no campo.
PROJETO CRIA OUVIDORIAS PARA TERRAS INDÍGENAS
Plano prevê rigor na fiscalização de firmas de segurança

BRASÍLIA. O Plano Nacional de Combate à Violência no Campo pretende combater a violência provocada também pela disputa de terras indígenas, onde há a presença ilegal de garimpeiros, mineradores e madeireiros. Serão criadas ouvidorias indígenas regionais, coordenadas pela Funai. A procuradora federal Ana Maria Carvalho, representante da Funai na comissão que elaborou o plano, afirmou que a demarcação das terras indígenas enfrenta disputas judiciais.

- A regularização fundiária das terras indígenas enfrenta batalhas judiciais, principalmente de reintegração de posse. Muitas vezes o cumprimento dessas liminares provoca violação de direitos fundamentais - afirmou Ana Maria.

Plano prevê fiscalização de cartórios imobiliários

O plano do governo pretende ainda fiscalizar os cartórios imobiliários que, muitas vezes, segundo o ouvidor agrário nacional, Gercino da Silva Filho, descumprem a lei e registram áreas públicas como se pertencessem a particulares. Essa atribuição será das corregedorias-gerais dos tribunais de Justiça.

As empresas de segurança contratadas por fazendeiros para formar milícias armadas contra os sem-terra também serão fiscalizadas com mais rigor. A idéia é impedir que esses seguranças extrapolem a função de vigiar a propriedade.

O presidente da Confederação Nacional de Agricultura (CNA), Ernesto de Salvo, afirmou que a entidade apóia medidas para evitar conflitos agrários, mas criticou os pré-requisitos para que o juiz conceda uma liminar de reintegração de posse.

- O plano cria uma série de dificuldades no momento de o proprietário recorrer da invasão. Parece tão impossível isso que talvez o proprietário use outros meios para se defender. Caso contrário não irá conseguir recuperar seu patrimônio - disse o presidente da CNA.

Cuidado para evitar que ânimos sejam acirrados

Ernesto de Salvo afirmou que é preciso tomar cuidado com as medidas a serem adotadas para não acirrar ainda mais os ânimos.

O plano também trata das terras remanescentes de quilombos e, entre as ações previstas, está a agilização da regularização dos quilombolas e a remoção dos ocupantes ilegais dessas terras. Serão criadas também as ouvidorias regionais quilombolas.

Está prevista ainda uma campanha contra o alcoolismo indígena, hoje um dos principais problemas enfrentados por indigenistas e que tem provocado dezenas de casos de suicídio de índios de diversas etnias. (E.E)

O Globo, 28/03/2004, O País, p. 16

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.