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Patrimônio imaterial

A Gazeta Digital - www.gazetadigital.com.br
Autor: Elias Januário
08 de Jul de 2008

Falar de cultura imaterial em nosso país é um desafio. Seja pela sua complexidade ou pelo próprio desconhecimento de grande parcela da população sobre o tema, nesse caso, as línguas faladas em nosso país.

As línguas indígenas brasileira fazem parte do patrimônio da cultura imaterial de nosso país, ou melhor, fazem parte de um rico e raro patrimônio da humanidade, que se encontra ameaçado pela ausência de estudos e políticas públicas sistemáticas.

Estudiosos estimam que no ano de 1500, eram faladas na América cerca de 1.270 diferentes línguas. Após a chegada dos colonizadores europeus cerca de 85% dessas línguas indígenas foram extintas.

Atualmente no Brasil existem aproximadamente 180 línguas indígenas, em uma população estimada em 400 mil indígenas pertencentes a 206 etnias.

Pesquisas recentes realizadas no Estado de Mato Grosso, que possui aproximadamente 40 mil indígenas pertencentes a 38 etnias e falantes de 33 línguas, revelou uma realidade preocupante.

Os estudos realizados sinalizam para uma ruptura de geração, ou seja, os pais têm falado a língua indígena com os avós e a língua portuguesa com os filhos.

Com o tempo a língua portuguesa passará a ser a primeira língua em muitas etnias, particularmente entre as crianças, como já vem acontecendo em algumas comunidades. Isso pode levar daqui alguns anos, há um processo avassalador de extinção das línguas indígenas.

Aliado a isso, temos outros fatores que agravam a situação, como a presença em número cada vez maior da televisão, do rádio, DVD e internet, obviamente tudo em língua portuguesa, o que tem proporcionado uma "overdose" de língua portuguesa, levando a uma "assimilação forçada" do português.

Diante desse contexto, e da existência de poucos projetos consistentes de monitoramento e revitalização da línguas indígenas, se faz necessário pensar encaminhamentos para essa questão.

Uma das primeiras e de vital importância seria que as tradições orais fossem tombadas como patrimônio da humanidade. Que órgãos como a Unesco reconhecessem oficialmente as línguas indígenas como patrimônio da humanidade, a exemplo do que foi feito com os grafismos dos povos Waiãpi do estado do Amapá.

A escola indígena deve ser também, além de um espaço de estudo e aprendizagem da língua português, um local por excelência para estudo, pesquisa e produção de materiais didáticos nas línguas maternas das comunidades indígenas.

O Estado, por meio de suas agências de fomento, deve apoiar trabalhos de documentação, estudo e produção de conhecimento sobre as línguas indígenas, em particular aquelas em processo de extinção.

Também é importante a criação de centros de pesquisas e estudo das línguas indígenas, com a participação efetiva de representantes indígenas, com o propósito de preparar e qualificar lingüistas indígenas para documentar e produzir materiais didáticos e pedagógicos de suas próprias línguas.

Para que essa fabulosa diversidade lingüística presente em nosso país e em nosso estado não vire "acervo de museu" é preciso fortalecer o estabelecimento de políticas públicas por parte do Estado para o estudo, manutenção e revitalização das línguas indígenas, considerando-as como um patrimônio da humanidade.

Elias Januário é doutor em educação, vice-reitor da Unemat e coordenador do Programa de Educação Superior Indígena Intercultural

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