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Para quer se livrar de ma fama: no dia da apresentacao da peca publicitaria da campanha nacional contra a exploracao de trabalhadores, governador do estado, Simao Jatene, diz que Uniao esta fazendo pirotecnia com dados da escravidao

CB, Brasil, p.17
26 de Nov de 2003

No dia da apresentação da peça publicitária da campanha nacional contra a exploração de trabalhadores, governador do estado, Simão Jatene, diz que União esta fazendo pirotecnia com dados da escravidão
Pará quer se livrar de má fama
Ullisses Campbell
A campanha nacional de erradicação do trabalho escravo não pára de incomodar os governantes dos estados administrados por tucanos. Ontem, o governador do Pará, Simão Jatene (PSDB), disse que o governo federal está fazendo "pirotecnia" com dados de escravidão no estado. "Essa questão precisa ser tratada com seriedade e serenidade", ressaltou Jatene. O governador ficou irritado depois de saber que o Ministério do Trabalho e Emprego exibirá em rede estadual de televisão uma propaganda oficial dizendo que há 40 mil trabalhadores escravos no Brasil - 20 mil deles no Pará.
A peça publicitária, lançada ontem junto com a campanha estadual, é controversa. Tem a bandeira paraense ao fundo e mostra imagens de trabalhadores escravos no sul do Pará. Em seguida, uma voz grave diz: "Vamos apagar essa mancha da nossa bandeira".
O secretário especial de Direitos Humanos, Nilmário Miranda, o ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST), Lélio Bentes, e representantes da Organização internacional do Trabalho (OIT) tiveram um encontro com Jatene ontem pela manhã. O governador deixou Nilmário e a comitiva esperando por quase uma hora.
Nesse tempo, Jatene participava de uma cerimônia que comemorava os 25 anos do hemocentro do Pará, e entregava viaturas novas ao órgão. "Quando se fala em trabalho escravo na região, esbarra-se no denuncismo. Isso dificulta o combate", reclamou o governador, que também criticou o fato de o governo federal ter divulgado uma lista com o nome de 37 empresas paraenses que usam trabalho escravo.
A titular da Delegacia Regional do Trabalho, (DRT-PA), Socorro Gomes, filiada ao PCdoB, reagiu às críticas de Jatene. "Antes de o Lula se eleger presidente, o Pará já era conhecido como berço nacional do trabalho escravo. O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso lançou duas campanhas para erradicar esse tipo de crime. 0 governo do Pará, nessa época, era tucano e nunca ninguém reclamou", rebateu.
Estava previsto que o governo do Pará iria reagir contra a campanha nacional de erradicação do trabalho escravo. Tanto que a comitiva do governo federal mudou o discurso de última hora. Nilmário Miranda, ao falar em público, ressaltou que há escravos em todo país, inclusive em São Paulo.
Entre os argumentos das autoridades paraenses de que o Estado não merece a pecha de "escravocrata", constam dados da equipe técnica do próprio Ministério do Trabalho. Segundo os defensores do estado, 85% de todos os trabalhadores libertados no Pará foram recrutados no Nordeste e no Centro-Oeste.
Tradição secular
0 interior do Pará tem tradição secular de manter trabalhadores em regime de escravidão. Principalmente o sul e sudeste, onde o poder do estado é rarefeito. Em 2000, segundos dados da Comissão Pastoral da Terra, entidade da Igreja Católica, 2.416 trabalhadores foram libertados em todo Brasil, sendo que 80% estavam no Pará.
Em 2003, já foram libertados 4.549 trabalhadores - 62% trabalhavam em fazendas do Pará. Na lista com 52 nomes de empresas divulgada pelo governo federal na semana passada, 37 são do Pará.

Definições são controversas
Outro debate levantado no Pará é a questão da definição técnica de trabalho escravo. "O cerceamento do direito de ir e vir, o endividamenro com o patrão e a ausência da carteira de trabalho caracteriza trabalho escravo", explicou a delegada da DRT-PA, Socorro Gomes. Segundo o secretário geral do Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil, Luzair Antônio Alves, entre 30% e 40% da mão-de-obra da categoria hoje empregada, num universo de 40 mil profissionais, estão sem carteira assinada.
0 piauiense José Ribeiro Costa, 38 anos, é um exemplo de regime de trabalho escravo. Em janeiro deste ano, em Imperatriz (MA), ele foi convidado para trabalhar na fazenda Rio Branco, sul do Pará. Ao descer de ônibus na fazenda, já tinha uma dívida de R$ 80 pelo transporte. Ao receber a motosserra com qual iria trabalhar, foi avisado de que teria de pagar R$ 30 por semana. José tentou desistir do emprego, mas o empregador disse que ele teria de quitar a dívida para ir embora.

CB, 26/11/2003, p. 17

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