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País importa energia para evitar apagão

OESP, Economia, p. B8
22 de Jan de 2015

País importa energia para evitar apagão

Renée Pereira, André Borges, Anne Warth

Depois do apagão de segunda-feira, que deixou dez Estados e o Distrito Federal sem luz, o Brasil foi obrigado a recorrer à Argentina para conseguir atender a demanda nacional e não correr o risco de um novo blecaute. Entre terça-feira e ontem, foram importados cerca de 2 mil MW de energia para suportar a escalada do consumo no horário de pico. A última vez que o País havia comprado energia do exterior foi em dezembro de 2010 - a energia serviu para cobrir problemas pontuais de geração, sobretudo na Região Sul.
Segundo relatório do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), na terça-feira, foram importados, em média, 165 MW durante todo o dia, sendo 998 MW no pico de consumo, às 14h48. Ontem, o volume de importação foi semelhante ao do dia anterior, afirmou um técnico do governo. Segundo ele, a importação continuará enquanto houver necessidade para garantir o abastecimento sem riscos. A salvação será a frente fria aguardada para hoje, que reduzirá o calor e, consequentemente, o consumo de energia.
Durante coletiva na terça-feira, o ministro de Minas e Energia, Eduardo Braga, negou que o apagão de segunda-feira tenha sido causado pelo aumento da demanda no horário de pico. Mas, nesse mesmo dia, as distribuidoras foram alertadas, logo pela manhã, para ficarem atentas para possíveis problemas. O Broadcast, serviço em tempo real da Agência Estado, apurou que a frequência do sistema elétrico voltou a oscilar na manhã de terça-feira, repetindo a mesma situação que levou ao blecaute do dia anterior, quando a frequência caiu para 59,2 hertz (hz).
Para evitar um novo colapso, o operador fez o pedido de injeção de energia "em tempo real". "O sistema está no talo e não há um controle de carga. Temos de deixar todos prevenidos", disse o técnico, que não pode se identificar. Segundo o relatório do ONS, o Brasil pediu ao país vizinho uma oferta entre 500 MW e 1 mil MW. A importação ocorreu pela estação de Garabi, no município de Garruchos (RS), na fronteira com a Argentina.
O objetivo era atender aos horários de maior consumo: das 10h23 às 12h e das 13h às 17h02. A potência máxima da energia chegou efetivamente a ser utilizada. Ontem, a carga do País esteve um pouco abaixo de terça-feira, mas ainda assim, durante algum tempo, o consumo do Estado de São Paulo - o maior mercado do País - ficou ligeiramente acima do programado.
Em nota, o governo informou que "pode haver intercâmbio de energia, quando necessário, sem interferência do Ministério de Minas e Energia". No governo, avalia-se que não há problemas em contar com a energia de países vizinhos. Mas é uma estratégia arriscada, já que os problemas de abastecimento de energia não são exclusividade do Brasil e, há anos, atingem a Argentina.
Uruguaiana. A necessidade de geração é tamanha que o Brasil já negocia acionar as turbinas da usina térmica de Uruguaiana, instalada no Rio Grande do Sul, na fronteira do Brasil com a Argentina. É uma medida considerada extrema no setor. Por duas razões: primeiro, pelo desgaste político das negociações com a Argentina, que rompeu o contrato de abastecimento de gás da usina em 2009. Depois, em razão do elevado custo de geração da térmica.
Com o acionamento de Uruguaiana, o governo poderia adicionar 639 MW de geração ao sistema nacional. "O MME está avaliando a possibilidade de acionar a UTE Uruguaiana", informou, em nota, o ministério. A AES Brasil, dona da usina, afirmou ao Estado que a planta "está pronta e à disposição para operar".
Em março e abril de 2014, a usina chegou a ser acionada, em caráter emergencial. Na época, a Petrobrás teve que importar gás de Trinidad e Tobago, no Caribe, e enviar o insumo por navio até Bahía Blanca, no sul da Argentina, para só então transportar o combustível por gasoduto até a usina.

Das 22 térmicas controladas pela Petrobrás, 16 têm problemas
O volume de energia equivale a um terço de todo o parque térmico, paralisado por falhas técnicas e manutenção

André Borges

O governo da presidente Dilma Rousseff poderia ter sido bem mais ousado no pedido que fez à Petrobrás para a ampliação da geração de suas usinas térmicas não fosse o grande volume de paralisações que afeta as plantas da companhia.
Levantamento feito pelo Estado revela que das 22 usinas térmicas que a Petrobrás tem, seja como controladora ou acionista, 16 sofrem hoje algum tipo de restrição operacional ou está em fase de manutenção.
Essas 16 usinas teriam capacidade de entregar até 5.574 megawatts (MW) ao sistema elétrico do País. Mas, efetivamente, só podem oferecer cerca de 3.700 MW disponíveis - aproximadamente 1.870 MW da capacidade está fora do ar.
Trata-se de um volume considerável de energia, equivalente a um terço de todo o parque térmico do País que está paralisado em razão de falhas técnicas e processos de manutenção.
Na segunda-feira, o ministro de Minas e Energia, Eduardo Braga, informou que, até o dia 18, a Petrobrás vai adicionar 867 megawatts (MW) ao parque nacional de geração, trazendo para o sistema máquinas que estão paralisadas.
Entre os projetos mencionado por Braga está a térmica Sepé Tiaraju (RJ), usina de 170 MW que, até ontem, estava completamente paralisada.
A relação inclui ainda a usina Governador Leonel Brizola (RJ), que pode gerar até 1.058 MW, mas tem entregado apenas 800 MW. Em São Paulo, a usina Fernando Gasparian tem capacidade total de 576 MW, mas está com déficit de 301 MW.
Gás. Duas semanas atrás, conforme revelou o Estado, a térmica Suape II, maior usina a óleo do Brasil, com 381 MW, teve de ser paralisada por conta de panes graves ocorridas em algumas de suas máquinas.
A usina, que tem a Petrobrás como acionista, vem retomando gradativamente suas operações, mas só deve estar em pleno funcionamento a partir de abril.
Dona de boa parte da geração térmica do País, a Petrobrás tem registrado resultados bilionários com a oferta de energia dessas usinas, em razão do preço alto que o setor elétrico tem de pagar por sua geração.
Em 2011, a estatal faturou US$ 2,4 bilhões com suas térmicas, resultado que saltou para US$ 3,7 bilhões em 2012 e chegou a US$ 5,2 bilhões em 2013. A Petrobrás ainda não informou quais foram os resultados financeiros obtidos com as térmicas no ano passado.
A capacidade total de geração térmica do Brasil chega a 22 mil MW. No entanto, diariamente, o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) tem de se virar com cerca de 16 mil MW, pois os demais 6 mil MW sempre estão indisponíveis.
Reclamações. Empresários do setor de energia têm reclamado de utilização excessiva das máquinas, o que pode estar por trás do grande volume de paralisações. Planejadas para funcionar com menor carga horária, essas usinas passaram todo o ano de 2014 ligadas e também devem seguir da mesma forma neste ano, para tentar garantir o abastecimento do País e reduzir a crise sobre os reservatórios das hidrelétricas.

Sem chuva, água das usinas só daria para um mês de consumo

A seca que atinge as Regiões Sudeste, Centro-Oeste e Nordeste reduziu tanto o nível dos reservatórios que, se não chovesse nada nas próximas semanas, a quantidade de água armazenada daria apenas para um mês de consumo de energia no Brasil.
Os dados foram compilados pelo Instituto de Desenvolvimento Estratégico do Setor Energético (Ilumina), com base em dados do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS). "Não vimos essa situação nem em 2001 (ano do racionamento)", diz o presidente do Ilumina, Roberto Pereira D'Araújo.
Na terça-feira, os reservatórios do subsistema Sudeste/Centro-Oeste estavam com 17,63% de armazenamento (no ano passado, nessa mesma época, o nível dos lagos da região estava em quase 40%); do Nordeste, 17,32%; do Norte, 35,26%; e do Sul, 67,84%. Como o sistema nacional tem outras fontes de energia, como eólicas e térmicas, e a expectativa é que chova, mesmo que pouco, o sistema consegue suportar o consumo durante mais tempo. "Mas esse é um dado que mostra como o Brasil, que depende quase 70% da hidreletricidade, está descuidando da fonte de energia", afirma D'Araújo.
Na avaliação dele, a situação atual é resultado de uma expansão da oferta baseada em térmicas caras, que só entram em operação em casos extremos. Apesar de a capacidade instalada do País aumentar, as hidrelétricas são sobrecarregadas, pois têm de gerar pelas térmicas que não entram em operação, afirma o executivo, especialista na área de energia elétrica.
"Em 2012, por exemplo, a energia hídrica representava algo em torno de 68% da matriz elétrica brasileira, mas produzia 90% do consumo. Hoje temos menos água nos reservatórios porque não usamos as térmicas." Pelas regras do ONS, as usinas obedecem a uma fila para entrar em operação. Primeiro entram as unidades mais baratas. Se o valor da térmica superar o valor do mercado à vista (PLD), que ficou boa parte do ano passado em R$ 822 o MWh, a diferença entre o preço da energia e o PLD é transferido para a tarifa do consumidor.

Cuidado. Como um dos lemas do governo da presidente Dilma Rousseff sempre foi a redução dos preços da energia, as térmicas ficaram em stand by enquanto a água dos reservatórios foi consumida. "Não houve cuidado para preservar o nível de armazenamento. A única preocupação foi a modicidade tarifária." Para Cristopher Vlavianos, da comercializadora Comerc, a saída para o Brasil será apostar nas térmica na base - isso significa operar initerruptamente. "Caso contrário, vamos depender cada vez mais das chuvas."

OESP, 22/01/2015, Economia, p. B8

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