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Pacto pelo fim do desmatamento põe Paragominas no mapa

O Globo, O País, p. 16
21 de Ago de 2011

Pacto pelo fim do desmatamento põe Paragominas no mapa
Depois de destruir 43% da floresta, cidade vira, em 33 meses, exemplo para o país

Cleide Carvalho
cleide.carvalho@sp.oglobo.com.br

Paragominas (PA). Novembro de 2008. O escritório e os carros do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente ardem em chamas em Paragominas, no Pará. É a reação local ao trabalho do Ibama, que fechara dezenas de serrarias no município.
Agosto de 2011. Paragominas acaba de aprovar seu Código Ambiental Municipal e criar um conselho formado pela administração pública e representantes da sociedade civil para dar continuidade ao principal projeto dos moradores: viver num município verde, de onde todos os produtos sairão, no futuro, com selo de certificação ambiental.
Quase tudo mudou em Paragominas em 33 meses e a explicação parece ser uma só: a vontade de aprender com a floresta Amazônica, utilizando seus recursos, mas respeitando e preservando. Não é uma equação fácil, mas o resultado, até aqui, não só é positivo como já serve de exemplo a todo o estado. De mau exemplo, Paragominas virou modelo a ser copiado.
- Nosso maior desafio é gerar riqueza sem desmatar, buscar fórmulas criativas de usar os espaços já abertos e garantir desenvolvimento social e de renda sem derrubar mais uma árvore nativa da floresta - diz Adnan Demacki (PSDB), o prefeito.
Paragominas foi fundada na década de 60, com a construção da Rodovia Belém-Brasília, e, até 2008, tinha destruído 43% da área de floresta. Foram abaixo 8.473 km de mata virgem. A avidez pelo desmatamento incluiu a cidade na "lista negra" federal, com os 36 municípios que mais desmataram. No Pará, Paragominas só perdia no ranking da destruição para São Félix do Xingu, na região do Araguaia.
Na época, a cidade tinha 240 serrarias e praticamente metade dos moradores vivia da extração da madeira. As árvores cortadas também viravam carvão para alimentar os fornos das siderúrgicas de ferro-gusa de Marabá, no Pará, e do Maranhão.
Ainda hoje é esse o destino de boa parte da floresta que vai abaixo, mas Paragominas trilha agora outro caminho: o resultado de um pacto pelo fim do desmatamento, que reuniu o poder público, o sindicato dos produtores rurais e pelo menos 50 organizações da sociedade civil. A primeira ação foi mapear e cadastrar todas as propriedades rurais, para identificar onde está a mata a ser preservada e quem é o responsável por ela. O município, apoiado por organizações não-governamentais, criou mecanismos de fiscalização e controle. O código ambiental recém-aprovado proíbe que as carvoarias queimem árvores nativas.
A cidade procurou soluções. Quem quer madeira, seja para carvão ou para virar móvel, deve usar as de árvores de reflorestamento. Na cidade, que tem o tamanho de Sergipe, 50 mil hectares estão em áreas reflorestadas, plantadas com eucalipto e paricá. É isso que garantirá a sustentabilidade da indústria madeireira. O exemplo está pronto desde outubro de 2010, quando entrou em operação a nova fábrica da Floraplac, que fabrica MDF.
Trata-se da primeira fábrica de MDF do Norte e do Nordeste. Saem de sua linha de produção 400 metros de chapas de MDF feitas de eucalipto e paricá. São 25 milhões de árvores plantadas pela empresa em áreas que haviam sido devastadas. Para fazer o MDF, a madeira é triturada e misturada com cola e parafina. Depois, prensada. O pó e os restos não aproveitados fazem operar os fornos da própria fábrica, numa operação que põe fim ao desperdício e gera energia. Do reflorestamento ao produto final, 550 pessoas têm sua renda vinculada à operação da Floraplac, que até 2013 pretende triplicar sua produção e criar mais empregos em Paragominas, ajudando a cidade a se reinventar.
Paragominas tem um pacto pelo trabalho legalizado, pelo fim do desmatamento e pela segurança social, que reduziu praticamente a zero o analfabetismo. Quem comanda o treinamento e as brincadeiras de 250 crianças e adolescentes é a Polícia Militar.
Alunos das escolas públicas usam o meio ambiente para aprender. Na última quinta, um grupo de estudantes aprendia sobre tangente, calculando o tamanho das árvores com base no ponto mais alto da copa.
Vander Gomes, catarinense de 33 anos, chegou a Paragominas para vender máquinas agrícolas, que preparam a terra, mas, antes, derrubam as florestas. Hoje, comanda um viveiro de mudas para reflorestar. O eucalipto e o paricá são o carro-chefe, mas o que tem de inovador em seu pedaço de terra é o esforço para fazer vingar mudas de jatobás, ipês, copaíbas e espécies da Floresta Amazônica.
A prefeitura comanda um esforço, com apoio da Embrapa e outros órgãos, para formar um viveiro público, de onde sairão mudas para repor o que foi arrancado da floresta.
Deusimar dos Santos Gaspar, de 30 anos, é uma jovem sorridente que se movimenta entre semeadeiras, estaquias (método de multiplicação por estacas) e mudas cuidando daquilo que será, no futuro, uma árvore.
- Aprendi aqui o que sei e ensino para os meus filhos -- diz Deusimar, que, ao pensar numa recompensa ao ajudar a contar a história do viveiro, afirma: - Uma muda dessa - diz olhando para ipês.
O processo de destruição da Amazônia costuma seguir um caminho que, até bem pouco tempo, era considerado natural. Primeiro, as árvores de maior valor são cortadas. Depois, corta-se o resto, para produzir carvão. Depois do carvão, vem o boi, que é seguido pela produção agrícola, geralmente grãos.
Em Paragominas, o desafio é reduzir o espaço do boi para abrir espaço à agricultura e impedir novos desmatamentos. Seis fazendas do município, com o apoio de universidades, buscam o pasto para triplicar a produtividade em espaço menor. Hoje, para cada boi é usado um hectare de pasto. Se o estudo der certo, em breve as fazendas terão três a quatro animais nesse mesmo espaço.
- Ter atividades mais lucrativas é a maneira mais rápida para pagar nossos passivos ambientais - diz Mauro Lúcio Costa, do Sindicato dos Produtores Rurais de Paragominas.
Para o pesquisador Paulo Amaral, do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia, o projeto dá certo porque busca soluções de preservação aliadas ao desenvolvimento, sem abrir mão de mecanismos de controle:
- Combater o desmatamento é como combater o tráfico. Tem que ser todo o dia.

Censo das árvores preserva floresta
Mapeamento pode criar manejo sustentável na Amazônia

Paragominas (PA). Em Paragominas, um grupo de homens está empenhado num projeto que busca definir o que pode vir a ser, de fato, o manejo sustentável da Amazônia. São engenheiros agrônomos, técnicos ambientais, identificadores de árvores, especialistas em corte ou, simplesmente, homens que já trabalharam no corte ilegal de árvores e, por isso mesmo, conhecem a floresta como ninguém.
Esse grupo faz parte do Instituto Floresta Tropical, financiado por organizações não-governamentais estrangeiras e brasileiras, e atua numa área de 3 mil hectares de floresta no Pará. A pesquisa é feita dentro da segunda maior floresta nativa certificada do país pelo Conselho Brasileiro de Manejo Florestal, que pertence ao grupo Cikel, da família Pereira Dias, dono de cinco fazendas no Pará.
Na prática, o que se faz no complexo é cortar árvores, mas de forma que o impacto sobre a natureza seja o mais reduzido possível e com o tempo necessário para que ela se recomponha. Observa-se a reação da natureza para estudar como fazer o corte para que a vida continue seu curso como se o homem não estivesse ali. No complexo Rio Capim, são 199 mil hectares de floresta nativa de onde, a cada ano, apenas 6 mil hectares são manejados para corte.
Para cada período de corte, que ocorre entre julho e novembro, época de seca na região, o trabalho começa um ano antes.
- Cada pedaço de floresta é mapeado e os indivíduos são classificados e numerados. Só podem ser cortados os que têm mais de 50 centímetros de diâmetro, desde que preservados em seu entorno outros indivíduos da mesma espécie, de forma a garantir a continuidade do mesmo tipo de árvore no local - explica Marlei Monteiro Nogueira, técnico ambiental que atua como instrutor no IFT.
O trabalho começa com a realização de um inventário, uma espécie de Censo das árvores, que são identificadas, medidas, mapeadas e numeradas. Fauna e flora da área são catalogadas. A cada 100 hectares, para cada árvore retirada devem ficar três da mesma espécie e porte.

O Globo, 21/08/2011, O País, p. 16

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