CB, Brasil, p. 13
19 de Fev de 2005
Pacote anticrise é antecipado
Tragédia estimula governo a anunciar ações para regularização de terras na Amazônia, que fariam parte de um plano nacional. Uma das principais é o bloqueio do desmatamento em 8,2 milhões de hectares
Érika Klingl
Da equipe do Correio
O agravamento da crise social no Pará, com a morte de quatro pessoas, fez com que o governo federal antecipasse as medidas relacionadas à regularização de terras na região. Elas integravam um plano de preservação ambiental da Amazônia que seria anunciado na próxima segunda-feira. De acordo com a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva decidiu antecipar a divulgação após o assassinato da missionária norte-americana Dorothy Stang e de outros três líderes rurais. "Ninguém consegue criar um programa como esse em uma semana", acrescentou, ao recusar a análise de que o bloqueio das terras havia sido feito a toque de caixa. "O governo tem ações fortes em fase de implementação e que estão sendo reforçadas em memória da Irmã Dorothy", afirmou a ministra. A análise do governo, em especial do presidente Lula, é que as mortes foram causadas porque o início da definição das reservas e regularização fundiária estariam provocando descontentamento entre madeireiros clandestinos e grileiros.
Uma das principais medidas anunciadas pelo governo no pacote para conter a crise é o bloqueio de qualquer tipo de exploração ou desmatamento em 8,2 milhões de hectares de terras nos próximos seis meses. A região escolhida para sofrer a intervenção fica à esquerda da BR -163, no Pará.
Lá, existe forte tensão causada principalmente pela extração de mogno. Nesse período de seis meses, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) irá realizar estudos para criação de reservas. A ministra garantiu que o governo tem condições de fiscalizar a região. O Ibama abrirá concurso público para a contratação de 900 fiscais, que vão se somar aos 800 contratados no governo Fernando Henrique Cardoso.
Privatização
Junto com o bloqueio, o governo enviou ao Congresso o projeto de lei da concessão de exploração de florestas, que regulamenta o uso de matas para produção sustentável em terras públicas, cria o Serviço Florestal Brasileiro e o Fundo Nacional de Desenvolvimento Florestal, voltado para desenvolvimento tecnológico, promoção da assistência técnica e incentivo ao desenvolvimento florestal sustentável.
Antes de anunciar a proposta, o governo buscou consenso com os parlamentares que representam empresários ruralistas da região e com a indústria do papel. A idéia assusta algumas organizações não-governamentais ONG) que temem a exploração exagerada da Amazônia.
Marina Silva negou que a proposta do governo prevendo a concessão de exploração de áreas na Amazônia, por particulares, signifique a privatização da região. "Pelo contrário. Hoje, as pessoas vão grilando terras; outras, até de boa fé, foram ocupando determinadas áreas, na expectativa de se tornarem proprietárias", afirmou. "Pelo regime de concessão, haverá concessão pública para a exploração dos recursos, da mesma forma que existe para as atividades de mineração, petróleo, gás, ouro, diamante, e assim por diante."
Reservas
Com cinco decretos, a Presidência criou a Estação Ecológica da Terra do Meio, com 3.373.111 hectares, e o Parque Nacional da Serra do Pardo, com 445.392 hectares. Os dois no Pará. A Reserva Extrativista do Riozinho da Liberdade fica entre o Acre e o Amazonas, com 325.602 hectares, e as florestas nacionais de Balata-Tufari, com 802.023 hectares, e de Anauá, com 259.550 hectares, serão no Amazonas e em Roraima, respectivamente. Juntas, essas cinco áreas de conservação somam mais de cinco milhões de hectares, área semelhante à do estado do Rio Grande do Norte.
A Estação Ecológica da Terra do Meio será a segunda maior unidade de conservação do país, logo atrás do Parque Nacional Montanhas do Tumucumaque, no Amapá, com 3,8 milhões de hectares, área equivalente ao território da Bélgica. "Era para ter anunciado isso muito tempo antes, mas o governo esperou uma tragédia acontecer", afirmou a presidente da ONG Grupo de Trabalho Amazônico, Maria Araújo de Aquino.
"Ano após ano, os governadores do Pará atrapalham a regularização fundiária na região."
Medidas são Criticadas
As medidas anunciadas pelo governo estão longe de ser consenso entre os que vivem de exploração na região do Amazonas. O Sindicato Paraense de Pecuária de Corte (Sindicorte) e o Sindicato da Indústria Madeireira do Baixo e Médio Xingu (Simbax) declararam, por meio de nota, que o sustento de mais de um milhão de paraenses estará comprometido com o pacote federal. "A extração legal de madeira e a pecuária serão totalmente inviabilizadas com a implantação das reservas da maneira como vem sendo feita", acusa a nota.
De acordo com Francisco Alberto de Castro e José Roberval de Souza, os presidentes dos sindicatos, o governo federal age de maneira rude e autoritária ao tratar o setor empresarial da região, "interditando as oportunidades de trabalho e desenvolvimento para milhares de pessoas em nome de uma política de preservação antieconômica, anti-social e antidemocrática."
CB, 19/02/2005, Brasil, p. 13
As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.