VOLTAR

PAC não ameniza falta de saneamento na Amazônia

Agência Amazônia de Notícias
Autor: Montezuma Cruz
01 de Jun de 2008

Brasil coleta apenas 48% do esgoto e trata 32%. Norte dispõe de apenas R$ 3,9 bilhões para obras no setor.

BRASÍLIA - Os R$ 3,9 bilhões destinados pelo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) para obras de saneamento básico em estados da região norte brasileira não chegam a ser a generosidade que governadores e população esperavam. Esse volume é apenas superior aos R$ 3,6 bilhões destinados ao centro-oeste. Segundo os números divulgados pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), o sudeste é a região mais beneficiada, com R$ 15,5 bilhões (38,7% do total), seguido do nordeste, com R$ 9,6 bilhões (24% do total), do sul, com R$ 7,4 bilhões (18,5%). Só depois vem a Amazônia, com 9,8% do total.

O governo federal prevê que até 2010 mais 24,5 milhões de pessoas serão abastecidas com água e mais 25,4 milhões terão coleta adequada de esgoto. Pretende ainda alcançar em quatro anos a meta da sustentabilidade ambiental estabelecida pela Organização das Nações Unidas (ONU): reduzir à metade a proporção da população sem acesso "permanente e sustentável" a água potável e esgotamento sanitário até 2015. Para tanto, espalha pelo País projetos-piloto do denominado Programa de Cidades Saudáveis, que prevê a conexão entre saúde, urbanização e meio ambiente.

Atualmente, 14,2 milhões de pessoas estão sem água canalizada, 34,5 milhões sem esgoto por rede ou fossa séptica e 4,4 milhões sem coleta de lixo, apenas nas áreas urbanas. Os números foram levantados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios. O retrato mais cruel da falta de saneamento está em Manaus, capital do Estado do Amazonas. Ali, habitantes e trabalhadores das ribeiras dos rios, lagos e igarapés que cortam povoados e aldeias são os mais carentes. Muitos trabalham na várzea quando baixam as águas.

Em tempo de cheia eles habitam palafitas ou se mudam para terra firme. Vivem da agricultura familiar, pequenos negócios e do extrativismo. Alimentam-se basicamente de farinha e peixe. "É o povo mais desorganizado e desassistido da Amazônia e busca a sua identidade como classe social", classifica a Comissão Episcopal da Amazônia, em estudo divulgado no seu site: www.amazonianet.org.br

Fossa séptica serve apenas para zona urbana

Pode-se avaliar os investimentos do governo federal na Amazônia, comparando-se o volume de recursos. Em 2007 a Caixa Econômica Federal liberou R$ 3,2 bilhões para a região. Segundo a pesquisadora do IPEA, Maria da Piedade de Morais, a meta de acesso à água potável nas zonas urbanas será possível "brevemente", mas isso não ocorrerá nas áreas rurais. Já o esgoto sanitário reúne problemas desde a insuficiência de indicadores adequados à falta de consenso sobre qual seja o método ideal para tratar os dejetos.

Lembra Maria da Piedade que especialistas não vêem solução por meio da instalação de fossas sépticas, muito adotadas durante o regime militar, pela antiga Fundação SESP (Serviços Especiais de Saúde Pública). "A fossa séptica faz o tratamento primário de esgoto doméstico, mas não o processo completo, feito por uma estação de tratamento. Com o tempo, são atingidos os lençóis freáticos e a poluição chega aos rios e ao solo". É isso o que ocorre a cada cheia do Rio Guaporé em Cerejeiras (Rondônia), a 700 quilômetros de Porto Velho. A água do rio cobre as fossas sépticas e os poços, misurando-se a dejetos e espalha-se numa parte da cidade.

Assim, as fossas sépticas serviriam apenas às áreas urbanas, somando-se às redes coletoras. Segundo estudos, o País alcançaria os objetivos da ONU no prazo previsto. A professora Clarice Melamed, da Fundação Oswaldo Cruz, não crê nessa possibilidade. Em depoimento à revista Desafios do Desenvolvimento, do IPEA, ela afirmou: "Temos problemas com o modelo de política pública e problemas de influência partidária. Muitas teorias não funcionam". Mencionou como exemplo, a Favela de Manguinhos, no Rio de Janeiro, onde trabalha. E alertou aos que quiserem ir até lá discutir a relidade: "Os mais pobres têm menos saneamento".

Esgoto brasileiro é péssimo

BRASÍLIA - Em seminário promovido na Câmara dos Deputados pela Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável revelou-se que a decantada "universalização" do saneamento exigiria o montante de R$ 180 bilhões. "Apenas 48% do esgoto produzido no Brasil são coletados e somente 32% são tratados", estimou o secretário nacional de Saneamento Ambiental do Ministério das Cidades, Leodegar Tiscoski.

Segundo o secretário, parte desse dinheiro "está garantido pelo PAC". Até o final do atual governo o setor receberia R$ 40 bilhões, insuficientes para uma grande arrancada nas obras necessárias. Desse total, R$ 12 bilhões são recursos a fundo perdido no Orçamento Geral da União. É desse dinheiro que sairão as obras destinadas ao saneamento integrado em favelas e palafitas: cobertura de água, esgoto, destinação final de lixo e drenagem urbana em cidades de grande e médio porte. Cidades até 50 mil habitantes serão contempladas com R$ 4 bilhões.

Mau gerenciamento

O problema está nos estados e municípios, ele reconhece: "Há dificuldades de gerenciamento, com empreiteiras desmobilizadas e defasagem no corpo técnico e no conhecimento do setor". Desse volume, até maio haviam sido contratados R$ 16 bilhões em projetos de saneamento. "Os números do Brasil na água são razoáveis, mas no esgoto são realmente ruins", comentou Tiscoski. No mundo há 2,5 bilhões de pessoas sem saneamento e 1 bilhão são crianças. Índices da Organização Mundial de Saúde revelam que 1,5 milhão de crianças morrem a cada ano por falta de investimentos em saneamento. (M.C.)

Desordenada, Manaus tem 1,5 milhão de habitantes

BRASÍLIA - Em Manaus, capital do Amazonas, vivem mais de 1,5 milhões de pessoas, que correspondem a mais de 60% da população amazonense. É a capital brasileira onde 95% da renda estadual se concentram na Zona Franca, que produz eletroeletrônicos. É grande o número marginalizados urbanos. A cidade tem um crescimento desordenado, em média de 12%. Invasões ou ocupações continuam, paralelamente ao déficit de emprego e moradia.

Segundo a Comissão Episcopal para Amazônia, a fome faz parte do cotidiano de milhares de famílias das comunidades ribeirinhas, indígenas e migrantes. Por ocasião do chamado ciclo da borracha surgiram na capital amazonense famílias resultantes do casamento entre brancos e indígenas, o que originou a cultura cabocla. Em toda Amazônia, os indígenas totalizam 270,2 mil pessoas, das quais, 77,2% nas aldeias e o 22,8% nas cidades (IBGE 2000).

Ainda que a realidade seja bem conhecida pelos formuladores do relançado Programa da Amazônia Sustentável (PAS), o IPEA atesta uma "suave queda" nas desigualdades regionais. Segundo o instituto, 59,5% da população do norte em 2006 moravam em domicílios particulares permanentes urbanos sem saneamento básico adequado, registrando-se uma variação de -7,3% entre 2001 e 2006. (M.C.)

-R$ 20 bilhões oriundos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) serão também destinados ao setor.

-R$ 12 bilhões se destinam ao setor público (estados, municípios e companhias de saneamento) R$ 8 bilhões serão oriundos de contrapartida de estados, municípios e prestadores de serviços.
Comentários

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.