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Onça-pintada é ameaçada na Caatinga

OESP, Vida, p. A26
24 de Jan de 2010

Onça-pintada é ameaçada na Caatinga
Há 356 animais no bioma, mas só metade em idade reprodutiva; Mata Atlântica também tem situação crítica

Afra Balazina

A região da Chapada Diamantina, Bahia, pode ficar sem onças-pintadas em um prazo de nove anos e meio. Já para a área de Bom Jesus da Lapa, no mesmo Estado, o prognóstico é ainda pior: a extinção da espécie pode ocorrer em aproximadamente três anos. Para evitar um destino trágico, é preciso proteger mais áreas e tentar conectar, por meio de corredores ecológicos (ligação entre áreas de uso menos intensivo para garantir a sobrevivência da espécie), os grupos que hoje estão isolados.

Os dados são do Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Mamíferos Carnívoros (Cenap), órgão ligado ao Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade do Ministério do Meio Ambiente. O Cenap avalia que a onça-pintada (Panthera onca) está criticamente ameaçada na Caatinga.

A estimativa, segundo o analista ambiental do Cenap Rogerio Cunha de Paula, é que existam no bioma 356 animais, divididos em cinco áreas. Desse total, apenas cerca da metade está em idade reprodutiva (descontam-se os animais mais jovens e os muito velhos). Dessa forma, o número restante, 178, deixa a espécie em situação crítica - um dos critérios da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN, sigla em inglês) para a classificação é haver menos de 250 animais.

Outra analista ambiental do Cenap, Beatriz Beisiegel afirma que a situação na Mata Atlântica também é extremamente grave. De acordo com ela, uma estimativa preliminar, baseada em informações de diversos pesquisadores, indica a existência de "170 indivíduos maduros" no bioma.

Ela conta que é muito difícil encontrar vestígios do animal e mais raro ainda vê-lo.

Os estudos confirmam que a população de onças-pintadas vem caindo a cada ano. Entre as ameaças tanto na Caatinga quanto na Mata Atlântica estão a alteração e a perda de hábitat, provocadas pelo desmatamento, e a falta de alimento (as chamadas presas). Na Caatinga, diz de Paula, parte da população se alimenta de tatus e porcos-do-mato e acaba ocorrendo uma competição pelas presas. Também faltam matas contínuas para garantir a sobrevivência da onça-pintada. Outro conflito é que, ao matar rebanhos, elas podem incomodar fazendeiros e serem perseguidas.

Na lista vermelha da IUCN, a onça-pintada aparece como "quase ameaçada". Pelo Ibama, ela é considerada "vulnerável". Isso porque sua situação é melhor em outros biomas e regiões. Dentro do Brasil, o quadro está mais tranquilo no Pantanal e na Amazônia. É por isso que Leandro Silveira, presidente do Instituto Onça-Pintada, defende ações regionalizadas. "Cada bioma tem um problema diferente."

A onça, explica, é uma espécie guarda-chuva. Ao fazer um esforço para sua preservação, várias outras espécies que estão no mesmo ecossistema se beneficiam. Ele acredita que o melhor é investir na Amazônia, que tem grandes áreas intocadas, para garantir a sobrevivência do animal.

De acordo com ele, o custo de tentar reestruturar a população na Mata Atlântica é proibitivo. "É caro e há o risco de não funcionar. O melhor é investir em ações onde é mais viável manter os animais", afirma. Já a Caatinga, segundo ele, precisa de investimento imediato. "Ou se faz algo agora ou é melhor esquecer", diz.

Ele cita a Serra Vermelha, no Piauí, área onde uma empresa pretende produzir carvão a partir da floresta. Uma onça já foi fotografada na área. "É o último grande pedaço de Caatinga intacto e deve mantido."

METAS E AÇÕES

No fim do ano passado, o Cenap organizou um workshop em Atibaia, interior de São Paulo, sobre a conservação da onça-pintada, em parceria com o Instituto Pró-Carnívoros e a ONG americana Panthera.

Durante o encontro foram definidas metas e modo de atuação para o Plano de Ação Nacional da Onça-Pintada. Também foi produzido um mapa das áreas prioritárias para a conservação. O material deverá ser editado até o meio deste ano.

"Uma solução para proteger a onça-pintada é trabalhar na criação de novas unidades de conservação (como parques) e de corredores de conexão entre as já existentes para permitir a comunicação entre as populações isoladas", afirma de Paula.

O Cenap luta pela criação do Parque Nacional Boqueirão da Onça, na Bahia. A área é a segunda em maior número de animais na Caatinga. E os corredores entre os parques da região são importantes para facilitar o fluxo genético entre populações, aumentando assim a chance de sobrevivência da espécie no longo prazo.

Já o presidente do Instituto Onça-Pintada tem uma ideia alternativa: pagar uma compensação para fazendeiros que perdem gado para as onças. Assim, eles deixariam de matá-las. Silveira estima que pelo menos 200 onças sejam mortas ao ano por conta desse conflito. Já foi feito um projeto-piloto de compensação por dois anos, entre 2004 e 2006, e o resultado foi positivo. "Temos de ser realistas. É uma questão prática."

Amazônia: papel crucial na sobrevivência
Grandes áreas de florestas intocadas mantiveram animais na região

A Amazônia é a "apólice de seguro" da onça-pintada no mundo. É assim que define o professor do Departamento de Biologia da Universidade Estadual do Maranhão Tadeu Gomes de Oliveira, ligado também à ONG Pró-Carnívoros. "Do Estado da Amazônia vai depender a sobrevivência ou a extinção da espécie", diz.

Por ter grandes áreas de florestas intocadas, as populações de onças-pintadas conseguiram se manter no bioma. Levando em conta os critérios da IUCN, os pesquisadores que participaram do workshop promovido pelo Cenap em 2009 classificaram a espécie como "quase ameaçada" na Amazônia. A IUCN classifica as espécies da seguinte forma: situação "pouco preocupante", "quase ameaçada", "vulnerável", "ameaçada", "criticamente ameaçada", "extinta na natureza" e "extinta".

"Hoje, a situação da onça-pintada é relativamente confortável na Amazônia. Por isso, é importante evitar a degradação e o desmatamento", diz Oliveira. Ele conta que os bichos são vistos com mais frequência em regiões de várzeas, como em Mamirauá (no Amazonas).

Porém, apesar de a Amazônia ser extremamente importante para a manutenção da espécie, ainda faltam estudos sobre a onça na região e informações detalhadas de seu comportamento dentro do bioma. "A logística é muito complicada", argumenta o professor.

ESPERANÇA

Howard Quigley, da ONG Panthera, mantém o otimismo sobre a possibilidade de evitar a extinção da espécie. De acordo com ele, "a onça-pintada é fonte de esperança hoje". "Onças-pintadas são mortas a cada dia por causa de seus comportamentos, ou comportamentos suspeitos. Houve uma redução de mais de 40% em relação à distribuição original da onça-pintada no mundo. Mesmo assim, ela persiste", diz. Em sua opinião, este é um excelente ponto de partida para este grande gato".

Ele destaca que garantir a preservação da espécie "não significa que temos de parar o desenvolvimento econômico". "Em todo o mundo, as pessoas estão aprendendo a conviver com os grandes carnívoros, como a onça-pintada", diz. Quigley elogia o fato de o País ter traçado estratégias para a conservação da espécie. "É um passo importante e estabelece um padrão para as outras nações que abrigam a espécie", diz. O próximo desafio será implementar as ações de preservação.

OESP, 24/01/2010, Vida, p. A26

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