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O martírio de irmã Dorothy Stang

FSP, Opinião, p. A2
Autor: ALMEIDA, Luciano Mendes de
19 de Fev de 2005

O martírio de irmã Dorothy Stang

LUCIANO MENDES DE ALMEIDA

Não acreditávamos que um ato covarde como esse pudesse acontecer. No entanto o Brasil, a 12 de fevereiro, recebeu com tristeza e indignação a notícia do brutal assassinato de irmã Dorothy Stang, de 73 anos, missionária religiosa da Congregação de Nossa Senhora de Namur. A irmã foi vítima de emboscada de pistoleiros no projeto Esperança, a 47 km de Anapu, no oeste do Pará.
Irmã Dorothy, norte-americana naturalizada brasileira, é bem conhecida pelo seu zelo missionário e pelo incansável empenho na promoção dos direitos humanos. Defendia a causa dos trabalhadores rurais, procurando assegurar a implantação de projetos de desenvolvimento sustentável na região. A área do Xingu continua sendo marcada pela violência. Madeireiros, grileiros e grandes fazendeiros expulsam os pequenos agricultores de suas terras, agredindo dirigentes sindicais, membros da Comissão Pastoral da Terra -CPT- e promotores da reforma agrária. Em 2003, foram assassinadas 73 pessoas, sendo 33 no Pará. Os crimes continuam até hoje. Reina um ambiente de medo e de ameaça de morte.
Testemunhas da emboscada contra irmã Dorothy narram que ela foi cercada pelos pistoleiros. Sem perder a paz, mostrou-lhes que a sua defesa era a Bíblia e chegou a citar-lhes trechos da Palavra de Deus. Dispararam vários tiros, sem piedade, contra a religiosa benemérita, cuja vida era totalmente dedicada aos mais pobres.
Temos de louvar a Deus, nos admirarmos diante da virtude e da coragem da irmã Dorothy e reconhecer neste ato heróico o fruto de sua fé em Cristo, que lhe deu força para consagrar-se à missão em bem do povo sofrido. Seu martírio há de sustentar o ideal de todos os que se empenham pela superação da violência na luta pela justiça no campo e na defesa da Amazônia.
Esse crime tão doloroso, infelizmente precedido e seguido por outros assassinatos, faz-nos voltar a atenção para as constantes agressões aos trabalhadores, cujas casas e roças são queimadas, que são expulsos da terra, vítimas indefesas diante da prepotência e da impunidade dos que se apoderam das terras com ganância e violência -até com a conivência de autoridades.
A morte de irmã Dorothy e a de tantos agricultores e defensores da distribuição eqüitativa da terra e do desenvolvimento sustentável erguem-se como clamores que precisam ser ouvidos e precisam despertar a consciência nacional para pôr fim à onda de injustiça e de arbitrariedades impunes.
Espera-se, sem dúvida, que os crimes sejam apurados e que os mandantes e executores sejam punidos. Mas é necessário também que a longa e penosa história de tantas agressões e assassinatos por causa da cobiça da terra encontre solução definitiva nas leis e numa nova ordem social que, por meio de uma reforma, assegure o direito de viver e de trabalhar na terra, o respeito ao meio ambiente e, em especial, a preservação da Amazônia.
A Campanha da Fraternidade 2005 convoca e reúne as Igrejas cristãs e o povo para construir a "solidariedade e a paz". O martírio sublime da irmã Dorothy e o exemplo de seus companheiros nos ensina a rezar: "Senhor, que a nossa força seja não a violência, mas o amor. Que a nossa vitória seja não a vingança, mas o perdão. Deus recompense e conserve sempre na paz aqueles que dão a vida pela justiça".

FSP, 19/02/2005, Opinião, p. A2

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