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O impacto da ação do homem

CB, Brasil, p. 22
24 de Ago de 2006

O impacto da ação do homem
Estudo aponta a desertificação no Nordeste e a seca como conseqüências do aquecimento global. Fenômenos são provocados pelo desmatamento

Hércules Barros
Da equipe do Correio

O clima esquentou no planeta e a situação pode piorar se não diminuírem as agressões contra a natureza. Nos últimos 100 anos, a temperatura mundial já subiu 0,7 graus Celsius. E o Brasil já convive com as conseqüências do aquecimento global. Secas, enchentes e ciclones provocam destruição de Norte a Sul do país. Mas, além de vítima, o país ocupa o quarto lugar no ranking dos países que mais emitem gases de efeito estufa no mundo. O desmatamento na Amazônia é apontado como o grande vilão. As queimadas no Norte são responsáveis por cerca de 2% da mudança do clima no planeta e representam em torno de 75% da contribuição para a alteração do tempo no Brasil.

As conseqüências do aquecimento estão na desertificação crescente no semi-árido nordestino, na elevação do nível do mar e na estiagem no Sul e no Norte. As previsões nada agradáveis são da organização não-governamental (ONG) Greenpeace. Em relatório apresentado ontem, em Brasília, a ONG ambientalista afirma que o país deveria ter seguido a "trilha da descabornização", mas optou pelo incentivo ao agronegócio. Para a ONG, o país investe pouco em energia renovável, apesar de 90% da produção energética no país ser a partir de usinas hidrelétricas. Para traçar o impacto do aquecimento global e as principais vulnerabilidades regionais, o Greenpeace percorreu o Brasil de Norte a Sul e documentou os principais fenômenos.

O levantamento enumera o que pode acontecer se o país não mudar o rumo e traz dicas do que deve ser feito por cada cidadão. "Temos que consumir menos, usar mais o transporte coletivo e economizar energia e água", adverte o coordenador da campanha de clima do Greenpeace, Carlos Rittl. O ambientalista reconhece que existem iniciativas do governo para preservar o meio ambiente, mas o fomento ao agronegócio avança sobre a floresta. "Devido a esta contradição, ainda temos taxas altíssimas de desmatamento", afirma.

Para o diretor do Programa de Qualidade Ambiental do Ministério do Meio Ambiente, Ruy de Góes, o avanço do agronegócio ocorre em todas as nações. Não só no Brasil. Ele ressalta que o papel do Estado é regular. "O governo tem feito sua parte. Não se faz combate ao desmatamento de um dia para o outro. Registramos queda em 2005 e a tendência para 2006 é a mesma", rebate.

Fenômeno

De acordo com o Greenpeace, a queda no desmatamento não é significativa. Entre 2002 e 2004, os índices registraram aumento - de 24 mil quilômetros quadrados destruídos para 27 mil - para depois terem uma redução. Segundo Rittl, os fenômenos recorrentes da destruição da floresta também não ficam para trás. "A seca na Amazônia, no ano passado, foi a segunda maior da história do estado", lembra.

No Sul, o gaúcho Cleu Ferreira, 42 anos, diz que depois de sentirem na pele as conseqüências da estiagem, os agricultores da região estão se mobilizando. "Nos últimos seis anos, a estiagem só tem aumentado", afirma. Segundo o agricultor, no ano passado, os pequenos produtores rurais perderam 75% da safra de milho e 95% do que foi plantado de feijão por causa da seca.

Ferreira é representante da União das Associações Comunitárias de Interior de Canguçu (Unaic). A instituição tenta identificar alternativas sustentáveis para a produção rural. São mais de 4,5 mil famílias de 28 municípios organizados em 37 associações. "Os agricultores começam a se mobilizar porque perderam as plantações e a mata nativa não tem resistido à seca", afirma.

Para o geógrafo Francisco Eliseu Aquino, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), o fenômeno não é novo, mas a detecção é recente e, agora, mais fácil de ser percebida. "O reflexo do problema na agricultura é apenas um dos fatores negativos do quadro de interferência do aquecimento global no Brasil." Especialista em neve e gelo, Aquino afirma que as geleiras da Antártica estão diminuindo com o aquecimento de 3 graus Celsius na região e tem provocado uma mudança na rota dos ventos extratropicais. Esta seria uma das explicações da força do furacão Catarina, em 2004, que matou 11 pessoas no Sul do país. Apenas em Santa Catarina, mais de 32 mil casas foram danificadas, com prejuízo de mais de R$ 1 bilhão.

Rastros da destruição pelo país

O aumento da temperatura no Brasil já deixa rastros por todas as regiões do país e revela um quadro preocupante. Na Amazônia, o desmatamento e as queimadas lançam anualmente mais de 200 milhões de toneladas de carbono na atmosfera. A conseqüência é que as estiagens são cada vez mais intensas. Este processo pode levar à savanização da floresta. O alerta é do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).

De janeiro a abril de 2005, as chuvas ficaram entre 30% a 50% abaixo do normal no Acre, em Rondônia e no sul do Pará e do Amazonas. Em julho, a redução chegou a 65%.

Se chuva farta é fenômeno raro no Nordeste, com o aumento da temperatura no planeta as precipitações pluviais no semi-árido diminuem ainda mais. É o que prevê o estudo do Greenpeace. Pelas previsões da ONG, o sertão pode virar deserto até o final do século 21. A maior parte dos estados do Nordeste, norte de Minas Gerais e do Espírito Santo seria afetada.

As previsões são ainda mais catastróficas para o litoral, que se tornará propício à formação de ciclones. Segundo o relatório, 42 milhões de moradores serão atingidos pelo aumento do nível do mar nas próximas décadas. Furacões podem aparecer em Santa Catarina e no Rio Grande do Sul. (HB)

CB, 24/08/2006, Brasil, p. 22

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